Divulgação | ||
Boguslaw Linda em 'Afterimage', no papel do artista vanguardista Wladyslaw Strzeminski |
-
-
Ilustrada
Monday, 06-May-2024 00:07:57 -03CRÍTICA
Wajda se despede em grande estilo com 'Afterimage', sobre pintor
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA17/08/2017 01h00
AFTERIMAGE (ótimo)
(Powidoki)
DIREÇÃO Andrzej Wajda
ELENCO Boguslaw Linda, Aleksandra Justa, Bronislawa Zamachowska
PRODUÇÃO Polônia, 2016, 12 anos
Veja salas e horários de exibição*
Na Escola de Belas Artes de Lodz, na Polônia, tudo corre tranquilamente, com o ministro da Cultura informando aos estudantes e professores como deve ser a arte, a quem deve servir etc.
Eis que um professor levanta-se e pergunta: "Mas o que é arte?". Quem levanta a questão é Wladyslaw Strzeminski, ex-companheiro de Kazimir Malevich e outros na invenção da pintura moderna, tido como o maior artista polonês do século passado.
É da vida e das ideias sobre arte de Strzeminski (1893-1952) que trata "Afterimage", último e formidável filme de Andrzej Wajda (1926-2016).
Essas ideias ligam-se diretamente às ideias políticas. Strzeminski não abre mão da liberdade. Formalista, recusa-se a seguir os cânones desse trambolho chamado realismo socialista. Estamos num regime stalinista e na Guerra Fria: a perseguição implacável ao pintor atingirá obras, família, alunos ou quem por acaso passar perto dele.
Em "Afterimage" estamos, primeiro, diante de uma reflexão sobre a imagem: o que significa, como se forma, aonde nos leva, que lugar ocupa na vida social. Andrzej Wajda serve-se do pensamento do pintor para discorrer, ele próprio, sobre o papel da arte.
Ao mesmo tempo, trata-se de dar sequência ao acerto de contas com os comunistas que Wajda desenvolve desde a queda do regime em seu país (1989). Não se trata de rancor, mas de um gesto de conhecimento. O caso Strzeminski é um perfeito exemplo do apodrecimento precoce do regime.
Não por acaso, o primeiro embate do pintor se dá sob a obra suprema (e a rigor única) dessa corrente estética: um gigantesco retrato de Josef Stálin pendurado bem diante de seu apartamento.
É uma cena em que a maestria de Wajda surge por inteiro. Ele mostra Strzeminski abrindo um rasgo na moldura vermelha do retrato. Daí por diante não terá mais sossego. Eis, em resumo, a questão estético-política do filme.
Desde que nos deparamos com o título do filme existe um incômodo. Por que "Afterimage"? Por causa da covardia dos distribuidores, que se envergonham quando os jornalistas se queixam de títulos inconvenientes? Provável.
Adota-se o título original, seja quando ridículo ("Dunkirk"), seja quando apenas incompreensível. É o caso aqui (não, é ridículo também: "Afterimage" é o título inglês de um filme polonês...).
De todo modo, a ideia contida na expressão significa imagem residual, ou restante. No dizer do pintor, a imagem gravada no olho do artista depois que ele fixou um objeto. Essa será a sua verdade, diz Strzeminski na luminosa introdução do filme.
Tudo o que vem depois será, ao contrário, dominado pelos interiores tristes que são a imagem restante em Wajda da vida polonesa sob o poder soviético desde pelo menos "Cinzas e Diamantes" (1958).
"Afterimage" é a reiteração desse doloroso pesadelo. Reiteração inteligente. Por exemplo, Wajda não precisa fantasiar os comunistas de monstros para nos fazer crer na perversidade do sistema (sob a égide de Stálin, no caso).
Para resumir, uma despedida em grande estilo depois do fracassado "Walesa" (2013).
Assista ao trailer de 'Afterimage'
Assista ao trailer de 'Afterimage'
Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br
Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.brPublicidade -