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O então major Percy Harrison Fawcett no Peru, em foto de 1911 |
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Ilustrada
Friday, 19-Apr-2024 11:18:50 -03CRÍTICA
Obras são incapazes de transpor verniz heroico de Percy Fawcett
REINALDO JOSÉ LOPES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA24/08/2017 02h00
Nem adianta tentar dourar a pílula. O tenente-coronel Percival "Percy" Harrison Fawcett (1867-1925), oficial do Exército de Sua Majestade Britânica, membro da Real Sociedade Geográfica e explorador da Amazônia, era um sujeito meio pancada.
Ninguém acredita impunemente numa conexão pré-histórica Atlântida-Brasil ou na suposta "memória psíquica" de artefatos de pedra.
É possível narrar a vida e as desventuras de Fawcett de muitas maneiras, mas nenhuma abordagem será totalmente bem-sucedida sem mostrar a importância das ideias de jerico para o destino desse personagem singular.
O engraçado é que, por enquanto, os que tentaram traçar um retrato do explorador e de sua busca por cidades perdidas pré-cabralinas nas florestas brasileiras não conseguiram demonstrar em sua inteireza o núcleo de maluquice por trás do verniz de herói vitoriano, talvez ofuscados pela aura de heroísmo que esse verniz projeta.
Dos livros em português sobre a figura, o que mais se aproxima disso é "Esqueleto na Lagoa Verde", de 1953, do escritor e jornalista fluminense Antonio Callado (1917-1997).
A obra de Callado nasce de seu trabalho como repórter – ele tomou contato com a lenda de Fawcett ao viajar para o Xingu, região onde o britânico desapareceu, acompanhando o filho sobrevivente do explorador, Brian, numa visita à região em janeiro de 1952.
Brian é o "sobrevivente" porque Fawcett levara Jack, seu filho mais velho, na derradeira jornada Amazônia adentro, e nenhum retornou.
Callado está muito longe de se contentar com a meta de reconstruir as expedições e o (provável) assassinato de Fawcett pelos indígenas xinguanos.
Irônico, meditativo, com uma fleuma que não estaria fora de lugar na pena de um britânico, o escritor brasileiro usa os desencontros em torno do suposto cadáver do oficial (o tal "esqueleto na lagoa" que motivou a vinda de Brian, cujos dados antropométricos não batiam com os de Fawcett) para meditações sobre o abismo entre "civilizados" e "selvagens" (que hoje soam racistas, embora ainda tenham força literária considerável)
Trata também da própria incerteza inerente ao ato de contar uma história. Como o Xingu (antes de Belo Monte, ao menos), o texto meandra.
Outros dois jornalistas, no Brasil e nos EUA, respectivamente, tentaram transformar a confusa trajetória de "P.H.F." (como era conhecido) em algo mais linear e saboroso de ler, com cara de "thriller".
Hermes Leal deu o título "O Verdadeiro Indiana Jones" (2007) a sua obra, enquanto David Grann, repórter da revista "New Yorker", preferiu destacar a quimera arqueológica perseguida pelo explorador com seu "Z, A Cidade Perdida", de 2010, (que se tornou filme de James Gray neste ano).
Grann é um arquiteto narrativo mais hábil do que Leal, mas ambos acabam sucumbindo a certa breguice quando falam das crenças budistas do oficial (que se converteu a essa fé durante seu período de serviço no atual Sri Lanka), de suas disciplinas espirituais ou de sua capacidade supostamente mágica de sobreviver na selva com quase nada e de travar amizade com os nativos
Exploradores mais sóbrios que Fawcett, como o canadense John Hemming, hoje avaliam sua competência nos trabalhos de campo como mediana, no máximo.
Esqueleto na Lagoa Verde Antonio Callado Comprar Para quem sabe inglês, uma dica interessante pode ser pular os intermediários e ir direto à fonte. "Exploration Fawcett" (2001), coletânea de escritos do próprio explorador organizada por Brian, tem um charme biruta ao qual é difícil resistir.
Fawcett narra os principais episódios de sua trajetória como geógrafo de campo de um jeito direto e divertido –e, na sequência, tome páginas sobre os supostos habitantes pré-históricos ruivos de olhos azuis da América do Sul, ou sobre a civilização tolteca do antigo México ser uma colônia da Atlântida. Só não é para levar a sério, gente.
ESQUELETO NA LAGOA VERDE
AUTOR Antonio Callado
EDITORA Companhia das Letras
QUANTO R$ 29,80 (160 págs.)
AVALIAÇÃO bomEXPLORATION FAWCETT
AUTOR Percy Fawcett
EDITORA Weidenfeld & Nicolson
QUANTO R$ 60,57 (336 págs.)
AVALIAÇÃO regularO VERDADEIRO INDIANA JONES: O ENIGMA DO CORONEL FAWCETT
AUTOR Hermes Leal
EDITORA Geração Editorial
QUANTO R$ 30,92 (288 págs.)
AVALIAÇÃO regularZ, A CIDADE PERDIDA
AUTOR David Grann
EDITORA Companhia das Letras
QUANTO R$ 40,90 (410 págs.)
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