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    69ª edição do Emmy coloca atrizes e papéis femininos em primeiro plano

    GUSTAVO FIORATTI
    DE SÃO PAULO

    17/09/2017 02h00

    Publicado nos EUA em 2013 e no Brasil em 2014, "Homens Difíceis" (editora Aleph, 368 págs.), de Brett Martin, retratou um período da TV norte-americana encharcado de testosterona.

    O livro traz bastidores de "Família Soprano" (1999), "Mad Men" (2007), "Breaking Bad" (2008) e outras séries criadas por homens de meia-idade, com reflexo de seus perfis na elaboração de protagonistas.

    O diagnóstico de Martin não vale mais no ano de 2017. O mesmo cenário que nos colocou diante de uma masculinidade em crise com impulsos da virilidade e os protocolos da vida familiar agora foca no perfil de mulheres que chegam ao poder ou que reagem à opressão histórica a que foram submetidas.

    Esse é o universo espelhado nas indicações do 69º Emmy, que entregou prêmios técnicos no último fim de semana e revela os vencedores das principais categorias neste domingo (17). No Brasil, o canal pago TNT faz a transmissão do tapete vermelho e da cerimônia a partir das 20h.

    Em suas primeiras temporadas, "The Handmaid's Tale" (do portal de vídeo sob demanda Hulu), "The Crown" e "Stranger Things" (ambos da Netflix) concorrem na categoria melhor série dramática e sustentam diagnóstico compartilhado pela imprensa americana: o "Los Angeles Times", por exemplo, disse em título: "Depois de prestigiar tantos anti-heróis masculinos, Emmy enfim joga luz na experiência feminina".

    O site da CNN, em artigo de julho também diz que a novidade, neste ano, é a multiplicação de papéis para mulheres, destacando "Feud: Bette and Joan", do canal por assinatura FX (que tem Susan Sarandon e Jessica Lange concorrendo por melhor atriz de minissérie ou filme para TV) e, com numeroso elenco feminino e muito humor negro, "Big Little lies" (HBO).

    Não são apenas as personagens que ganharam destaque, suas intérpretes também vieram a primeiro plano. Em "The Crown", Claire Foy, concorrendo como melhor atriz de série dramática, destaca-se pela docilidade com que interpreta Elizabeth 2ª.

    Com a morte do rei George 6º, a princesa se torna rainha. A transição de uma vida divertida, com experiências que incluem expedições pela África, para uma vida de responsabilidade e medos se configura no primeiro episódio. Os capítulos se desdobram em conflitos psicológicos da protagonista e as novas funções.

    VIRADA

    Elisabeth Moss, que teve papel coadjuvante em "Mad Men" (como Peggy, secretária do publicitário vivido por Jon Hamm), agora retorna para protagonizar "The Handmaid's Tale". Em um futuro distópico dominado por fascistas, a personagem de Moss é submetida a situações de muita violência. Ela e Foy são apostas fortes.

    A virada de protagonismo em "House of Cards", com Claire Underwood olhando para o marido agora de cima para baixo (considere essa metáfora um esforço anti-spoiler), também colocou Robin Wright novamente na corrida, em sua quinta indicação ao Emmy pelo mesmo papel.

    Neste ano, "Grace & Frankie" emplacou dois nomes na categoria melhor atriz de série cômica: Lily Tomlin e Jane Fonda, sendo que a última está indicada a um Emmy pela quinta vez.

    Essa virada entre gêneros daria um prato cheio para que o autor de "Homens Difíceis" lançasse agora o contraponto "Mulheres Nada Fáceis", com todo a cafajestice pejorativa que esse título pudesse carregar. Os perfis dessas personagens, muitas vezes, mas nem sempre, flertam com bandeiras feministas.

    Mas o reconhecimento de interesse pelos papéis femininos nem sempre encontra viés politicamente correto. Uma das frases mais marcantes de "Westworld" (HBO) vem de uma mulher e fala sobre mulheres. "Não quero ofendê-la, mas prefiro ganhar a pagar pelo carinho de uma mulher", diz um personagem a uma prostituta. Outra profissional o ouve e retruca: "Você sempre paga, querido. A diferença aqui é o valor fixo, anunciado na porta".

    "Big Little Lies", por sua vez, introduz à sua narrativa macabra dificuldades da maternidade, o que colocou Nicole Kidman e Reese Witherspoon entre as concorrentes de melhor atriz em minissérie. Também "The Handmaid's" estende seu conteúdo para uma leitura política incisiva. Seu figurino inclusive foi referido por manifestantes feministas nos EUA.

    A contradição é que a maior parte das indicações a melhor roteirista, um cargo nobre no mundo televisivo, permanece contemplando os homens, já descontado que algumas séries favoritas no prêmio sejam baseadas em romances de mulheres.

    Esse é o caso de "The Handmaid's Tale", que foi criada por Bruce Miller com base no livro homônimo de 1985 da escritora canadense Margaret Atwood, e também de "Big Little Lies", de David E. Kelley, que tem origem no romance de mesmo nome, assinado por Liane Moriarty.

    Neste contexto, desponta Lisa Joy. Junto com Jonathan Nolan, ela concorre na categoria de melhor roteiro em série dramática por "Westworld", o favorito da noite ao lado do programa cômico Saturday Night Live, ambos com 22 indicações cada.

    'WESTWORLD'

    "Westworld" entra em cena para ter o perfil de popularidade de "Game of Thrones". Também da HBO, 'GoT' ficou de fora da premiação neste ano por ter estreado após a data limite, 31 de maio.

    O ponto similar é o amplo leque de referências fantásticas: enquanto "Game of Thrones" juntava situações políticas a um universo medieval, "Westworld" mistura fórmulas de ficções científicas, com uma história que inclui referências a filmes sobre realidades virtuais e androides.

    A série é sobre um parque que simula a vida no velho oeste e pode ser visitado por turistas. Anthony Hopkins e Evan Rachel Wood concorrem por suas atuações, e a série também colocou entre indicados Thandie Newton (melhor atriz coadjuvante em série dramática), Jeffrey Wright (coadjuvante) e Jonathan Nolan (melhor direção).

    Também vale prestar atenção ao trabalho de Naaman Marshall. Indicado como melhor diretor de arte, ele tem no currículo filmes díspares como "O Abutre" e "Planeta dos Macacos: o Confronto".

    O número de indicações de "Westworld" neste ano fez com que a HBO assumisse liderança entre indicados mais uma vez, com 110 nomes. A Netflix vem em seguida, com 91; depois a NBC, com 60.

    Boa parte das premiações para categorias técnicas, já anunciadas no último domingo. foram para "Westworld", com cinco vitórias (entre elas maquiagem, efeitos e som),
    "Stranger Things" empatou (tendo abocanhado melhor edição de som, tema original de abertura e elenco).

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