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    OPINIÃO

    Wilson das Neves forjou um estilo brasileiro para o instrumento

    EDU RIBEIRO
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    01/10/2017 02h00

    Daryan Dorneles-13.set.2012/Divulgação
    O baterista Wilson das Neves, morto em agosto aos 81 anos
    O baterista Wilson das Neves, morto em agosto aos 81 anos

    Não são todos que, ao ligarem o rádio, reconhecem que haja músicos acompanhando a letra cantada; é ainda menor o número dos que distinguem, dentro desse grupo de músicos, uma bateria.

    Hoje podemos ter produções enxutas, em que um músico grave a maioria dos instrumentos só no seu estúdio, onde muito da tecnologia sirva a reproduzir a sonoridade dos instrumentos acústicos.

    O legado da música brasileira, contudo, vem de uma época em que, para gravar um disco, muitas pessoas estavam envolvidas. Dentro desse legado, o ritmo que mais representa o nosso país mundo afora é o samba.

    E se você um dia teve a sorte de ouvir no rádio sucessos como "Samba do Grande Amor", na gravação original de Chico Buarque no disco "Morena de Angola" (1984), ou "Vou Deitar e Rolar (Quaquaraquaquá)", de Baden Powell e Paulo César Pinheiro, na gravação de Elis Regina do disco "Em Pleno Verão" (1970), com certeza você ja ouviu e batucou, sem saber, com um dos maiores músicos transmissores desse ritmo.

    A bateria não é um instrumento brasileiro; foi criada nos Estados Unidos com a intenção de fazer com que um único músico pudesse tocar as partes do bombo, caixa e pratos simultaneamente.

    Seguindo esse princípio, o papel do baterista na música brasileira é, muitas vezes, o de imitar várias vozes de instrumentos de percussão.

    É assim com o baião, com o maracatu, com o ijexá e também com o samba; ninguém melhor para fazer essa transição do que um garoto que praticamente nasceu dentro de uma escola de samba, como Wilson Das Neves.

    Seja num grupo onde o instrumento se soma à percussão ou num em que a bateria é a única responsável pela parte rítmica, podemos reconhecer as caixas, surdos, tamborins, chocalhos e demais instrumentos de uma escola de samba quando é ele quem toca.

    Sua maneira de tocar e de pensar a bateria será imitada e reproduzida ao longo das próximas gerações, e todo baterista do mundo que se interessar por música brasileira deverá conhecer seu trabalho.

    Seu senso de humor incrível e sua generosidade infinita faziam das turnês e gravações de que participava momentos de amizade e terreno fértil para divertidas histórias.

    Há cerca de 20 anos, revelou-se grande compositor e cantor e agregou à sua história artística muitos sucessos que o levaram ao grande público e a prêmios importantes.

    Muitos o conheceram assim, mas sua contribuição para desenvolver um estilo brasileiro de tocar bateria o coloca ao lado de grandes criadores e inventores no instrumento mundialmente conhecidos, como Buddy Rich, Art Blakey, Edison Machado e Elvin Jones.

    EDU RIBEIRO é baterista do Trio Corrente, vencedor em 2014 do Latin Grammy de melhor álbum de jazz latino.

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