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    'Boyhood brasileiro', 'Alguma Coisa Assim' mostra uma SP que acabou

    GUILHERME GENESTRETI
    ENVIADO ESPECIAL AO RIO

    13/10/2017 15h40

    Divulgação
    Carolina Abras e André Antunes em cena do filme de Esmir Filho e Mariana Bastos
    Carolina Abras e André Antunes em cena do filme de Esmir Filho e Mariana Bastos

    "Alguma Coisa Assim", de Esmir Filho e Mariana Bastos, tem um quê de "Boyhood" brasileiro.

    O filme, que compete no Festival do Rio, amarra cenas filmadas em 2006, 2013 e 2016 para contar o desenvolvimento da relação entre um casal de amigos vividos por Caroline Abras e André Antunes.

    Melhores amigos na adolescência, os dois se distanciam, acompanham a trajetória —e os fracassos afetivos— um do outro com alguma distância, se reencontram e põem por terra qualquer tentativa de rotular a relação que ambos mantêm.

    O longa acompanha seus encontros e desencontros entre São Paulo e Berlim e serve discussões sobre casamento, homossexualidade, aborto, relacionamentos abertos, e como todas essas questões evoluem com o tempo e a maturidade dos personagens.

    O longa é uma derivação do curta homônimo que ambos os diretores lançaram em 2006 e que mostrava uma noite especial na vida dos dois, aquela em que Caio (André Antunes) dá seu primeiro beijo em um outro homem (Daniel Tavares).

    Parte dessas cenas são reaproveitadas no longa e, vistas em 2017, mostram uma parte boêmia e pulsante de São Paulo que não existe mais.

    Quem teve 20 e poucos anos na década passada e também circulou pela rua Augusta na época pode ficar com um peito apertado com as cenas mostrando a rua ainda repleta do neon das baladas e casas de prostituição da boemia pré-especulação imobiliária.

    O diretor paulistano Esmir Filho tenta o prêmio máximo da mostra carioca pela segunda vez -ele ganhou o Redentor em 2009 por seu longa anterior, "Os Famosos e os Duendes da Morte".

    'FORA, CRIVELLA'

    Se a delimitação de tempo e de espaço são essenciais à narrativa do filme "Alguma Coisa Assim", ambos os elementos são implodidos em "Unicórnio", filme que também está na competição do Festival do Rio.

    A obra, dirigida por Eduardo Nunes ("Sudoeste") busca estofo em duas novelas da escritora paulista Hilda Hilst, morta em 2004, para construir sua trama fabular sobre o despertar sexual de uma garota.

    "Matamoros" e "O Unicórnio" são as duas obras literárias que servem de base ao filme. Do universo da autora, o filme absorve temas constantes como a feminilidade, a sexualidade, a relação com o pai e a indagação sobre a natureza de Deus.

    Sentada num banco, contemplando um imenso muro branco, Maria (Barbara Luz) conversa com o pai (Zécarlos Machado). A ambientação dá conta de que aquilo pode se tratar de um manicômio em que ele está internado.

    A menina narra a ele o que sucede na isolada casa de campo em que ela mora com a mãe, vivida por Patricia Pillar. Nada ali consegue situar a trama no tempo ou no espaço: elas usam vestidos compridos, buscam água no poço. A harmonia das duas é desestabilizada pela chegada de um homem (Lee Taylor), que pastoreia com suas cabras.

    Embora a trama não abrigue ressonância política, a equipe do filme foi à sessão com cartazes que enunciavam "cinema contra a censura" -protesto contra as recentes guinadas conservadoras que se voltaram contra exposições como a "Queermuseu", impedida de ir ao Rio por determinação do prefeito, o pastor Marcelo Crivella (PRB).

    Patricia Pillar foi enfática ao criticar o prefeito: "Estão querendo acabar com a nossa alegria".

    O jornalista GUILHERME GENESTRETI viajou a convite do Festival do Rio

    Divulgação
    Os atores em cena de 2006, quando o projeto ainda era um curta-metragem
    Os atores em cena de 2006, quando o projeto ainda era um curta-metragem
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