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    41ª Mostra de SP

    Felipe Hirsch dirige filme sobre perdão e peça com registros da escravidão

    MARIA LUÍSA BARSANELLI
    ENVIADA ESPECIAL AO RIO

    20/10/2017 02h00

    Ao retomar o cinema, Felipe Hirsch quis deixar de lado o viés político que marcou seus últimos trabalhos no teatro. "Severina", seu segundo longa, que chega oito anos após o primeiro ("Insolação", codirigido por Daniela Thomas), é desenhado em metáforas sobre o amor e o perdão.

    Adaptado do livro homônimo do guatemalteco Rodrigo Rey Rosa, o filme, que será exibido a partir desta sexta (20) na Mostra de São Paulo, depois de passar pelo Festival do Rio, trata da relação entre um livreiro (Javier Drolas) e uma moça misteriosa (Carla Quevedo) que rouba livros.

    "A mim agradou fazer um filme que não fosse reativo, uma questão sócio política, porque já tenho feito tanto isso no teatro", afirma o diretor. "Tem uma frase no início do filme que é justamente isso: 'Coisas muito piores acontecem aqui, mas não é disso que eu quero falar.'"

    Com atores argentinos e filmada em Montevidéu, numa coprodução entre Brasil e Uruguai, a história adentra o campo da fábula. O livreiro se apaixona pela ladra, mas não fica claro se ela é uma musa ou fruto da imaginação dele.

    Trailer

    Rey Rosa escreveu o livro logo após uma separação. Numa metáfora sobre traição e perdão, fala de uma mulher que rouba na livraria do protagonista-narrador, mas também nas livrarias dos outros.

    "Mas ele percebe que essa é uma visão de ordem pessoal, machista, e faz com que o homem embarque na aventura feminina. O perdão é o que leva o personagem a entender o quanto ele era mesquinho", comenta Hirsch, que busca, assim como os atores, um registro realista, para nublar as fronteiras entre realidade e imaginário.

    LITERÁRIO

    Ainda que tenha deixado de lado o viés político das últimas peças, Hirsch gestou o filme a partir do mesmo processo que levou a aos trabalhos no teatro: uma pesquisa sobre a literatura latino-americana cujos primeiros frutos (a série de espetáculos "Puzzle") foram encenados na Feira do Livro de Frankfurt em 2013. Foi à época que leu e adaptou o livro de Rey Rosa.

    O mergulho na literatura irá render ainda novos espetáculos, como "Democracia", com textos inéditos de autores latinos e elenco chileno, que estreia em janeiro no festival Santiago a Mil e deve ser apresentado na sequência na MITsp - Mostra Internacional de Teatro de São Paulo.

    Lenise Pinheiro/Folhapress
    Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Data 08-10-2017. Diretor Felipe Hirsch. Filme Severina. Lagoon. Foto Lenise Pinheiro/Folhapress
    Felipe Hirsch no Cine Lagoon, onde "Severina" foi exibido no Festival do Rio

    Antes, porém, Hirsch retoma o conteúdo político em uma montagem nacional. Ele estreia no próximo dia 31, com o grupo Ultralíricos, "Selvageria", sequência de "Puzzle" e "A Tragédia e a Comédia Latino-Americana".

    "Fizemos espetáculos de ficção e agora faremos um documentário", diz o diretor, que se baseou numa dezena de documentos sobre o Brasil que integram coleções do bibliógrafo José Mindlin e a "Bibliografia Brasileira do Período Colonial", de Rubens Borba de Moraes. Datados dos séculos 16 ao 19, tratam de escravidão.

    Um deles, escrito pelos franceses Claude d'Abbeville e do Yves d'Évreux, retrata a missão de padres capuchinhos no Maranhão. "Como os índios falam pela voz dos europeus, respondem com muita devoção, dizem: 'Sim, queremos ser batizados.'"

    Outro, editado em 1551 por um livreiro, narra uma festa para a rainha consorte da França Catarina de Médici em que 50 índios tupinambás e tabajaras foram levados ao país europeu. Num ambiente em que se reconstituiu a "selva brasileira", os indígenas foram incitados a guerrear.

    Para o diretor "é uma ironia" ter documentos assim. "São visões europeias sobre os 'selvagens' da terra. Mas nesses textos você percebe as raízes de tudo o que está nas ruas hoje: do conservadorismo, dessa incompreensão, da desigualdade social."

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    SEVERINA
    DIREÇÃO Felipe Hirsch
    ELENCO Javier Drolas, Carla Quevedo
    PRODUÇÃO Brasil/ Uruguai, 2017, 14 anos
    MOSTRA sex. (20), às 21h40, e sáb. (21), às 17h15, no Espaço Itaú - Frei Caneca; dom. (29), às 15h45, no Reserva Cultural

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    SELVAGERIA
    QUANDO dias 31/10 (ter.) e 1º/11 (qua.) e qui. a sáb., às 21h; dom. e feriados, às 18h; até 17/12
    ONDE Sesc Vila Mariana - teatro, r. Pelotas, 141, tel. (11) 5080-3000
    QUANTO R$ 12 a R$ 40
    CLASSIFICAÇÃO 16 anos

    Edição impressa

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