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    Weinstein espionou jornalistas e atriz para impedir acusações, diz revista

    JIM RUTENBERG
    DO "NEW YORK TIMES"

    07/11/2017 20h38

    Chris Pizzello/Associated Press
    Weinstein teria contratado detetives, advogados e agentes disfarçados para impedir publicação de reportagens
    Weinstein teria contratado detetives, advogados e agentes disfarçados para impedir publicações

    Harvey Weinstein, magnata do cinema caído em desgraça por acusações de assédio sexual, usou uma rede de investigadores particulares, advogados e até mesmo antigos agentes clandestinos do serviço de espionagem israelense Mossad a fim de impedir o jornal "New York Times" e a revista "New Yorker" de publicar os resultados de suas investigações quanto a acusações de agressão e assédio sexual contra ele, em outubro.

    A operação sigilosa, detalhada na segunda-feira (6) em uma reportagem postada no site da "New Yorker", incluía o uso de uma agente que se fez passar por defensora dos direitos da mulher e tentou ganhar a amizade de uma das acusadoras, a atriz Rose McGowan.

    A mesma agente tentou se fazer passar por uma mulher com motivos de queixa contra Weinstein, em um esforço para convencer jornalistas a revelar informações sobre outras potenciais acusadoras, de acordo com uma reportagem da revista que se baseou principalmente em documentos e e-mails de Weinstein e pessoas ligadas a ele.

    Um contrato com uma das pelo menos três agências de investigação que Weinstein empregou, a Black Cube, mencionava como "objetivos primários" do esforço o fornecimento de "informações que ajudem os esforços do cliente para impedir completamente a publicação de um novo artigo negativo por um importante jornal de Nova York", e a obtenção de conteúdo de um livro que supostamente incluiria "informação negativa e prejudicial sobre o cliente".

    A revista identificou o jornal como o "New York Times", e a autora do livro como Rose McGowan, que acusou Weinstein de tê-la estuprado. (Ele nega ter forçado mulheres a fazer sexo não consensual).

    O contrato, que a revista publicou em seu site, foi assinado por David Boies, advogado de Weinstein e figurão do Partido Democrata que defendeu a causa do casamento gay na Suprema Corte e representou Al Gore nos processos judiciais relativos à contestada eleição presidencial de 2000.

    O escritório de Boies, Boies Schuller Flexner, atendeu o "New York Times" em três processos judiciais nos 10 últimos anos, entre os quais um processo por difamação. O jornal divulgou um comunicado severo na noite de segunda-feira (6) sobre o envolvimento de Boies em um esforço para solapar sua apuração de notícias e o trabalho de seus repórteres.

    "Descobrimos hoje que o escritório de advocacia Boies Schiller and Flexner trabalhou em segredo para deter nossas reportagens sobre Harvey Weinstein, ao mesmo tempo em que seus advogados nos representavam em outras questões", o comunicado afirma.

    "Consideramos essa conduta como intolerável, grave violação da confiança, e violação dos padrões profissionais básicos que todos os advogados têm a obrigação de observar. É uma atitude imperdoável, e buscaremos soluções apropriadas".

    Na noite de segunda-feira (6), David McCraw, diretor jurídico assistente do "New York Times", se recusou a dizer que soluções seriam buscadas. Mas ele declarou que "acredito que o escritório nos deva explicações sobre o que de fato aconteceu", acrescentando que "precisamos saber muito mais".

    Boies não respondeu a um pedido de informações encaminhado via e-mail na segunda-feira. Mas disse à "New Yorker" que, embora tivesse supervisionado o contrato, não foi ele que escolheu a agência de investigação, e que não dirigia o trabalho de seus agentes.

    E embora ele tenha afirmado não acreditar que seu trabalho para Weinstein e o trabalho de seu escritório para o "New York Times" representassem conflito, "não deveríamos ter contratado e pagado pelos serviços de investigadores que não selecionamos e cujo trabalho não dirigíamos".

    A Black Cube se promove como "um grupo seleto de veteranos de unidades seletas dos serviços de inteligência israelenses".

    Uma de suas agentes se fez passar por uma potencial acusadora de Weinstein para obter duas reuniões com Ben Wallace, um repórter nova-iorquino que estava trabalhando em um artigo sobre Weinstein que não foi publicado.

    Ela também procurou a jornalista Jodi Kantor, uma dos dois repórteres do "New York Times" que comandavam o trabalho sobre Weinstein, reportou a "New Yorker", acrescentando que a tentativa de aproximação fracassou.

    Kantor e a repórter da "New Yorker" que estava cobrindo o assunto, Ronan Farrow, também foram investigadas por outra empresa contratada por Weinstein, chamada PSOPS. A empresa também foi usada para obter informações negativas sobre acusadoras como McGowan, e produziu sobre ela um longo relatório cujos itens incluíam, por exemplo, "antigos amantes".

    O hábito de Weinstein de usar investigadores com o objetivo de solapar acusadoras e jornalistas surgiu há mais de uma década, segundo o artigo que a "New Yorker" postou segunda-feira (6), também de autoria de Farrow.

    A revista informou que Weinstein havia usado a agência de investigação Kroll para "cavar informações negativas" sobre David Carr, antigo colunista de mídia do "New York Times", que morreu em 2015.

    Carr foi investigado a mando de Weinstein no começo dos anos 2000, quando estava trabalhando em um artigo sobre ele para a revista "New York". O artigo cita um relatório sobre Carr produzido pelos investigadores de Weinstein. O texto revela que Carr estava informado das acusações de McGowan.

    Sallie Hofmeister, porta-voz de Weinstein, negou que Weinstein tivesse contratado um investigador particular para obter informações sobre Carr, quando o "New York Times" perguntou sobre isso no mês passado. Hofmeister não respondeu a e-mails enviados na noite de segunda-feira (6).

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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