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    Aos 50 anos de carreira, Gal Costa lança DVD e lamenta 'mundo doido'

    RAFAEL GREGORIO
    DE SÃO PAULO

    08/11/2017 02h00

    Adriano Vizoni/Folhapress
    A cantora Gal Costa em São Paulo; ela lança o DVD "Estratosférica - Ao Vivo", e prepara novo disco
    A cantora Gal Costa em São Paulo; ela lança o DVD "Estratosférica - Ao Vivo", e prepara novo disco

    Gal Costa, 72, mantém a conhecida tranquilidade ao tecer comentários sobre "Estratosférica - Ao Vivo", seu novo DVD, que sai na sexta (10).

    Mas a serenidade na fala contrasta com a inquietude na profissão: gravado em junho, na Casa Natura, o lançamento é seu oitavo em vídeo.

    Os registros em DVD, somados aos 36 discos de estúdio e aos nove ao vivo, resultam numa média de mais de um trabalho ao ano —até o Réveillon, ela quer iniciar mais um.

    Antes, a cantora se apresenta em Portugal e faz shows no Brasil com o Trinca de Ases, grupo que integra com Nando Reis e Gilberto Gil e com quem gravará um DVD em 25/11.

    À parte a música, sobressai na fala da artista seu temor diante do mundo atual, "doido e intolerante". Censurada pelo regime militar, Gal está assustada com "a raiva da gente comum" exposta em ações contra obras de arte.

    Falando à Folha, ela também opina sobre as eleições de 2018 —quer votar em Ciro Gomes (PDT)— e dá pistas da rotina de "mãe meio paulistana" da maior cantora do Brasil.

    *

    Folha - Esse DVD parece ser seu trabalho mais pesado; concorda?
    Gal Costa - Eu queria uma atmosfera mais rock n' roll. Foi proposital e é algo totalmente coerente com minha trajetória.

    Mas não te parece arriscada a escolha pelo rock quando o gênero está tão em baixa?
    Pois é, o que está em voga é o rap, né? Mas eu nunca fui de gravar o que está na moda. Faço as coisas de que eu gosto.

    Por que cantar uma canção da Rita Lee ("Cartão Postal", de "Fruto Proibido", de 1975)? É sua fase preferida dela?
    Eu gosto de tudo da Rita, mas essa canção tinha tudo a ver. Também é a única parceria dela com o Paulo Coelho.

    E como foi cantar Luiz Melodia (1951-2017)?
    Muito tocante. Foi com essa canção ("Pérola Negra") que lancei o Luiz, no "Fa-tal" (1971). Fui madrinha dele. Saudade imensa. [Se emociona.] Tínhamos uma afinidade...

    Você celebra 50 anos de carreira neste ano com 36 discos de estúdio lançados. Além disso, são nove discos ao vivo e oito DVDs. Dá mais de um trabalho por ano. Você fica inquieta? Por que tanto trabalho?
    É porque no começo a gente fazia um por ano, mas depois, nos anos 1980, foi ficando um a cada dois anos, por causa das turnês.

    Mesmo assim, é um ritmo maior que o de seus colegas. Você sente falta de trabalhar?
    De gravar, não sinto falta. Mas já vou gravar agora, né... Estou preparando um repertório junto com o Marcus [Preto, diretor artístico]. Uma evolução de "Recanto" e "Estratosférica". Já tenho a estética musical, pedi canções. Inclusive, pedi uma música a Gil.

    Faz tempo que não grava o Gil, não? (A última canção do colega que Gal gravou foi "Mãe da Manhã", no disco "O Sorriso do Gato de Alice", 1993)
    Eu gravei bastante Gil, mas bem menos do que Caetano. Gil não se incomoda muito em fazer música. Acho até que ele tem preguiça de fazer pros outros, curte fazer pra ele.

    Como você vê essas campanhas de grupos contra exposições de arte, museus?
    É uma coisa muito perigosa. A censura não é boa, e o mais incrível é que hoje ela venha das pessoas, não de cima. Há uma raiva e uma intolerância no mundo e na gente comum.

    E isso a assusta?
    É claro. O mundo me preocupa muito. Estou vendo um caos. E as pessoas com uma tendência pra direita. Por que a Catalunha vai se separar da Espanha? Não entendo.

    Estamos andando para trás?
    Sim. O mundo está bem doido e preocupante. Tenho a impressão de viver um tempo que está chegando ao fim.

    Qual o papel do artista nisso?
    Acho que deve se posicionar. Tem bastante gente fazendo isso. E trabalhando. Trabalhando e falando.

    Recentemente o Caetano e a Paula Lavigne entraram com ações na Justiça por difamação. O que você achou disso?
    Acho que é um caminho. Tem que mostrar às pessoas que elas estão erradas.

    Não é irônico para vocês, que sofreram censura do Estado, ter de recorrer a ele graças à opressão de indivíduos?
    Exato. O perigo hoje é que você pode sem saber estar lutando ao lado de pessoas preconceituosas, homofóbicas. Isso é o mais perigoso.

    Pensa nas eleições de 2018?
    Sim. Vou votar no Ciro Gomes se ele se candidatar.

    Por quê?
    Porque é uma pessoa nova. Quer dizer, não é tão nova. Mas é uma pessoa inteligente. E tem um olhar para o Nordeste, a parte mais pobre desse país. Vamos apostar nele pra ver se acontece alguma coisa.

    Se tivesse de decidir entre duas prioridades utópicas, acabar com a corrupção ou a miséria, qual escolheria?
    Acabando com a corrupção, acabaria com a miséria. O dinheiro daria pra construir tantas escolas, hospitais, casas, gerar empregos.

    O que você tem ouvido?
    Quer saber? Nada. Tenho trabalhado muito, ficado pouco em casa. Mas achei o novo do Chico [Buarque] lindo.

    E você ouve música como? Computador, CD, celular?
    Eu uso celular, ouço da internet nos fones de ouvido.

    E como está sua rotina? Já se acostumou a São Paulo?
    Estou bem paulistana. Gosto quando meu filho não tem aula e a gente vai ao cinema, a restaurantes. Hoje preciso fazer malas, e me dá certa agonia viajar sem o Gabriel [seu filho, 12 anos]. Quando dá, ele vai comigo, mas agora ele tem provas finais na escola.

    Você ajuda ele na lição?
    Não, não... É tudo tão diferente... Não entendo nada.

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