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    crítica

    'Invisível' aponta para as múltiplas camadas da gravidez indesejada

    CÁSSIO STARLING CARLOS
    CRÍTICO DA FOLHA

    09/11/2017 02h00

    INVISÍVEL (bom)
    DIREÇÃO Pablo Giorgelli
    ELENCO Mora Arenillas, Diego Cremonesi, Paula Fernandez Mbarak
    PRODUÇÃO Argentina/França, 2017; 16 anos
    QUANDO estreia nesta quinta (9)
    Veja salas e horários de exibição

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    A expressão "histórias mínimas" foi usada como título de filme e serviu de emblema a outras obras que, no início dos anos 2000, passaram a ser agregadas sob o rótulo "novo cinema argentino", marcado por narrativas e estéticas rarefeitas.

    "Invisível", segundo filme de Pablo Giorgelli, prolonga essa tradição de abordar crises dispensando o aparato. O modo simples chama a atenção para o próprio drama, evitando a mania contemporânea dos "discursos".

    O diretor argentino já havia se imposto com seu primeiro longa, "Las Acacias", uma aguda observação sobre diferenças sociais e sexuais construída com base em dois personagens reunidos à revelia numa viagem de caminhão.

    Na estreia, ele demonstrava domínio da dramaturgia diante das limitações do lugar e do número de personagens. Ali também ficava evidente o desejo de não coagir o espectador com emoções, de nos deixar reagir mantendo distância, equilíbrio que reaparece em "Invisível".

    Aqui, temas como gravidez precoce e aborto clandestino poderiam dar margem ao cinema porta-bandeira, no qual o didatismo sufoca a expressão.

    Giorgelli escapa da armadilha escolhendo filmar Ely, a protagonista, como um corpo que sente, deseja, repele, se sexualiza e sofre com a indesejada gravidez.

    Observamos a personagem na escola, no trabalho e em casa, mas sem maiores interferências psicológicas. A apatia de Ely a tudo pode até provocar antipatia. A frieza dos ambientes e da luz também servem para apagar a vitalidade dessa adolescente sorumbática, quase zumbi. Giorgelli, contudo, não faz um filme limitado a exibir o vazio.

    A gravidez impõe um drama ao corpo, que precisa decidir as condições do aborto numa sociedade que considera o ato ilegal. Existem os remédios abortivos, existem clínicas clandestinas, e Ely percorre essas situações como quem sem querer é forçada à delinquência, mas não tem direitos, não pode fazer escolhas.

    Em vez de mais uma denúncia da hipocrisia, Giorgelli desvia a questão para outros aspectos da experiência feminina, quando Ely se torna adulta e só encontra papeis subordinados.

    Ao mostrar que não ter uma gravidez indesejada é considerado um crime, "Invisível" aponta, de fato, para as múltiplas camadas desse iceberg.

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    Assista ao trailer de 'Invisível'

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