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    Moda

    Mostra em Paris se volta para os métodos de criação de Christian Dior

    PEDRO DINIZ
    DE ENVIADO ESPECIAL A PARIS

    10/12/2017 02h00

    "Você não terá dinheiro, mas as mulheres serão boas com você e, graças a elas, terá sucesso."

    Christian Dior (1905-1957) tinha 14 anos quando visitou a leitora de mãos que profetizou seu futuro. A previsão ainda dura após 70 anos da abertura da grife que leva seu nome e é validada nas filas gigantescas do público, majoritariamente feminino, aglomerado em frente ao Museu de Artes Decorativas, em Paris.

    Histórias como essa estão na maior mostra sobre o legado do estilista que, finda a Segunda Guerra, devolveu feminilidade à moda com o "new look" —ombros delicados, busto proeminente e curvas acentuadas por saia mídi.

    "Christian Dior, Designer de Sonhos", em cartaz até 7 de janeiro, é, antes de um compilado extenso de peças, uma exposição comprometida com as nuances do processo criativo da moda e a explicar de que forma as experiências de vida influenciam essa criação.

    O fascínio do jovem Dior pela arquitetura e pela arte está expressa no cuidado com a confecção, nos cálculos precisos de uma simples camisa branca e na harmonia de proporções dos seus vestidos, tudo contado nas vitrines construídas do chão ao teto.

    ARTES VISUAIS

    Na mostra, que ocupa dois andares do edifício, estão também raridades dos arquivos da marca, além de obras de artistas plásticos amigos do estilista, como Salvador Dalí (1904-1989) e Alberto Giacometti (1901-1966). São nomes que Dior ajudou a divulgar até sua galeria de arte ter de ser fechada, no pós-crise de 1929.

    As artes visuais, o espectador logo entende, são indissociáveis em sua análise sobre o corpo. Não é por acaso que todos os estilistas que passaram pela marca após a morte repentina do "couturier", acometido por um ataque cardíaco, em 1957, explorem quadros e esculturas como ponto de partida para coleções.

    É nesse ponto que o espectador descobre os porquês da perenidade de suas ideias.

    Entre os mais de 300 vestidos de alta-costura que reluzem nas estruturas das salas espelhadas, nos espaços onde as culturas africana e oriental se mesclam às criações e nas alas destinadas aos sucessores de Dior, há várias referências a artistas, tanto contemporâneos quanto do século passado.

    John Galliano e Yves Saint Laurent (1936-2008), por exemplo, interpretaram a intimidade de Dior com a arte a partir da pintura clássica.

    Enquanto o espanhol Francisco de Goya (1746-1828) era um dos pintores reverenciados por eles, o belga Raf Simons, designer da marca até 2015, tomou emprestada a estética do alemão Sterling Ruby para compor parte de suas coleções na marca.

    Imagens históricas da "era de ouro" da fotografia de moda também são destaque.

    A foto de Richard Avedon (1923-2004) "Dovima com Elefantes" (1955), considerada pontapé do conceito da imagem "fashion" contemporânea, ganhou espaço nobre. A iluminação se alterna, com um foco de luz indo da imagem para o vestido original que a modelo veste na foto.

    A cenografia de Nathalie Crinière e a curadoria da dupla Florence Muller e Olivier Gabet também traduzem a face comercial da grife.

    Campanhas e frascos dos primeiros perfumes, material imagético da linha de beleza e uma série de acessórios completam a imersão proposta.

    O material lembra que, além de exímio costureiro, Dior virou empresário de sucesso —único detalhe que escapou das previsões da quiromante do início deste texto.

    Ele sabia que vestuário era negócio em expansão, fundamental para injetar o ânimo que tanto a indústria têxtil, arrasada pela escassez de tecidos, quanto a sociedade assombrada pelos efeitos da guerra, iriam querer comprar.

    O mesmo tipo de escapismo que, aliás, está em voga nas passarelas, fazendo da mostra retrato fidedigno da costura de nosso tempo.

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