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    Diário de Berlim - Para alemães, é natural alimentar micos alheios

    SILVIA BITTENCOURT

    13/07/2014 03h12

    O maior jogo de futebol da Alemanha desde "o milagre de Berna". Foram vários os comentaristas que aqui lembraram, por ocasião da recente vitória massacrante sobre o Brasil, da conquista da Copa pela Alemanha na Suíça, em 1954. Um pouco como o Maracanazo (e agora o Mineiraço) no Brasil, o jogo em Berna marcou a história do futebol na Alemanha. Mas em um aspecto positivo.

    Na final daquela Copa, a favorita Hungria fez dois gols nos primeiros oito minutos de jogo. Em vez de amarelar de vez, porém, o time alemão empatou dez minutos depois, para virar no segundo
    tempo e vencer por 3 a 2, tornando-se campeão do mundo pela primeira vez.

    Muitas curiosidades envolveram a partida naquele 4 de julho chuvoso -um dos heróis da Alemanha, por exemplo, foi o capitão Fritz Walter (1920-2002), que, por causa de uma malária contraída no cativeiro, depois da Segunda Guerra, só conseguia jogar bem no molhado- tanto que ela virou filme em 2003, "O Milagre de Berna", de Sönke Wortmann.

    Este, aliás, é o mesmo diretor de "Alemanha - Uma Lenda de Verão", documentário sobre a Copa do Mundo de 2006 no país, quando a equipe do então técnico Jürgen Klinsmann levou a nação ao delírio com um mero terceiro lugar.

    Agora a Alemanha vive no Brasil o seu "milagre de Belo Horizonte" e a sua "lenda de verão", simultaneamente.

    Há 60 anos, quando partiram desacreditados para a Copa na Suíça, os jogadores alemães deixavam para trás um país ainda destroçado pela Segunda Guerra Mundial. E voltaram como heróis.

    Já os meninos do técnico Joachim Löw foram para o Brasil deixando para trás uma opinião pública notadamente cética e desconfiada. Mas é certo que também serão recebidos de volta como heróis, independentemente do resultado de hoje.

    SIMPATIA

    Não faltaram nestas últimas semanas fotos, "selfies" e vídeos mostrando a equipe alemã como um grupo alegre e aberto aos brasileiros. Divulgar este material pode até ter sido uma boa jogada de marketing, mas o fato é que ele tem um lado autêntico.

    Ali, estão imagens dos jogadores dançando com os índios pataxó de Santa Cruz Cabrália, vilarejo baiano que serviu como concentração do time alemão, arriscando uma capoeira ou vestindo o uniforme de times locais. Em outras, alimentam micos-estrela e fotografam insetos. Nada mais alemão do que ir atrás da natureza, das origens e dos costumes de um país exótico.

    CANTAR VITÓRIA

    Apesar da frente fria e da chuva que assolou a Alemanha na última semana da Copa, prejudicando as festas do "7 a 1" e os happy-hours a céu aberto nos bares e cervejarias, o país é uma alegria só, nos jornais, rádios e TV.

    Ninguém parece ouvir o pedido de prudência vindo do técnico Löw, que odeia cantar vitória.

    Os comentários nas redes sociais mudaram de tom, passando da descrença típica alemã para a euforia. Sobre o massacre de terça-feira, muitos leitores citaram em comentários na internet uma das manchetes da semana do jornal sensacionalista "Bild": "Uma vitória para a eternidade".

    PREJUíZO

    Aparentemente, os únicos alemães que não gostaram da lavada sobre o Brasil foram os comerciantes que vinham oferecendo desconto de 10% para cada gol feito pelo time de Löw. Desde quarta-feira, muitos estabelecimentos comerciais do país, do ramo da moda ao da jardinagem, vêm registrando enxurradas de fregueses, atrás de descontos de até 70%.

    Espertinhos até tentaram remarcar preços na madrugada do dia 9, horas após o Mineiraço. Mas foram descobertos e voltaram atrás.

    SILVIA BITTENCOURT, 49, é jornalista, autora de "A Cozinha Venenosa" (Três Estrelas).

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