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    Nova grande extinção vai eliminar 41% dos anfíbios

    ROBIN McKIE
    DO "GUARDIAN"

    21/12/2014 03h40

    O prestigioso periódico científico "Nature" publicou uma descrição contundente da ameaça que paira sobre os mamíferos, répteis, anfíbios e outras formas de vida do mundo. Uma análise especial realizada pela revista indica que nada menos que 41% os anfíbios existentes hoje no planeta correm o risco de extinção, enquanto 26% das espécies de mamíferos e 13% das aves estão igualmente ameaçadas.

    Muitos espécies já correm perigo crítico e estão perto da extinção; é o caso do elefante de Sumatra, do leopardo siberiano e do gorila-das-montanhas. Mas o que veio à tona agora é que também correm o perigo de desaparecer de seus ambientes naturais animais que hoje são classificados como apenas ameaçados: o bonobo (chimpanzé-pigmeu), algumas espécies de atum e a tartaruga-comum.

    Em cada um dos casos, a responsabilidade recai diretamente sobre atividades humanas. A expansão da agricultura destrói milhões de hectares de habitats selvagens todos os anos, deixando animais sem ter onde viver, e a introdução de espécies invasivas, muitas vezes com a ajuda de humanos, devasta populações nativas. Ao mesmo tempo, a poluição e a pesca intensiva destroem os ecossistemas marinhos.

    "A destruição de habitats, a poluição ou a pesca intensiva matam ou enfraquecem animais e plantas selvagens", disse Derek Tittensor, ecologista marinho no Centro Mundial de Monitoramento da Conservação, em Cambridge. "O problema é que nas próximas décadas a ameaça adicional do agravamento das mudanças climáticas vai crescer e pode eliminar as espécies sobreviventes."

    De acordo com a "Nature", o problema é exacerbado pelas enormes lacunas no conhecimento científico a respeito da biodiversidade do planeta. As estimativas quanto ao número total de espécies de animais, plantas e fungos vivos variam entre 2 milhões e 50 milhões. E as estimativas sobre o ritmo atual de desaparecimento de espécies variam entre 500 e 36 mil por ano. "Esse é um problema real que enfrentamos", Tittensor disse. "A incerteza é enorme."

    No final, porém, os dados indicam que o mundo se dirige inexoravelmente para uma extinção em massa -algo que é definido como a perda de 75% das espécies, ou mais. Dependendo dos índices de extinção, isso pode acontecer em cem anos ou em mil.

    A Terra já passou por apenas cinco grandes extinções anteriores, todas causadas por eventos geológicos ou astronômicos. (Por exemplo, a extinção do Cretáceo-Jurássico, que acabou com os dinossauros 65 milhões de anos atrás, foi desencadeada pelo choque de um asteroide com a Terra.) Mas a grande extinção que está chegando será obra do Homo sapiens.

    "No caso das extinções terrestres, a causa principal é a expansão agrícola", disse Tittensor. "Mas é a superexploração dos recursos -a pesca intensiva-que afeta a vida marinha." Somando-se a esses impactos, a elevação das temperaturas globais ameaça destruir habitats e exterminar mais espécies.

    Essa mudança no clima foi desencadeada por emissões crescentes -produzidas por fábricas e usinas elétricas-de dióxido de carbono, um gás que também está sendo dissolvido nos oceanos. Por essa razão, o mar está ficando ácido e hostil a habitats sensíveis. Nas últimas décadas já se perdeu um terço de todos os recifes de corais, que sustentam mais formas de vida que qualquer outro ecossistema da Terra, e muitos especialistas marinhos acreditam que todos os recifes de corais podem desaparecer até o final deste século.

    Um quarto dos mamíferos, um quinto de todos os répteis e um sétimo de todas as aves se dirige à extinção. E essas perdas ocorrem em todo o planeta, desde o Pacífico sul até o Ártico, dos desertos da África aos picos e vales do Himalaia.

    Uma enxurrada de extinções varre a Terra e está se convertendo em uma realidade da vida moderna. Mas a ideia de que espécies inteiras possam ser exterminadas é relativamente nova. Quando primeiro foram escavados fósseis de animais estranhos, como o mastodonte, pensava-se que pertencessem a animais que ainda viviam em outras paragens. Argumentava-se que versões existentes desses animais viviam em outros lugares. "Assim funciona a economia da natureza", afirmou Thomas Jefferson, que financiou expedições que procuraram mastodontes no interior inexplorado da América.

    Então o anatomista francês Georges Cuvier mostrou que os restos do mastodonte, semelhante ao elefante, eram na realidade os de uma "espèce perdue", ou espécie perdida. "Partindo de alguns poucos ossos espalhados, Cuvier concebeu toda uma maneira nova de enxergar a vida", observa Elizabeth Kolbert em seu livro "The Sixth Extincton: An Unnatural History". "Espécies foram extintas. Não foi um fato isolado, e sim um fenômeno amplo."

    Desde então o problema vem se agravando a cada década que passa, como deixa clara a análise da "Nature". Ainda na pré-história, os humanos exterminaram os mastodontes e mamutes. Já nos tempos históricos, erradicaram o arau-gigante, o pombo-passageiro -que chegou a ser a ave mais abundante na América do Norte - e o dodó. Mais recentemente, fomos responsáveis pelo desaparecimento do sapo-dourado, do tilacino, ou tigre-da-Tasmânia, e do golfinho-lacustre-chinês. Agora milhares de outras espécies correm perigo.

    Em editorial, a "Nature" argumenta que é imperativo que governos e grupos como a União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais façam um censo urgente e preciso do número de espécies no planeta e de seus índices de extinção. A revista admite que não é o trabalho científico mais instigante, mas é de importância vital se quisermos começar a proteger a vida na Terra contra os piores impactos de nossas ações. A perda é incalculável para o planeta e também para nossa espécie, que pode em breve se descobrir vivendo em um mundo sem variedade natural. Como disse o ecologista Paul Ehrlich: "Ao empurrar outras espécies à extinção, a humanidade serra o galho sobre o qual está pousada".

    Tradução de CLARA ALLAIN

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