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    Casar ou ficar solteiro? Vida no campo ou na cidade? A ciência responde

    LINDA GEDDES
    DO "OBSERVER"

    16/07/2015 13h00

    Você deveria ter um gato, abandonar a carne, viver sem filhos e cancelar sua conta de Facebook; ou ter um cachorro, viver comendo filés, ter uma família imensa e postar sobre ela todos os dias? Abaixo, eis o que novas pesquisas podem nos dizer sobre as escolhas mais importantes da vida.

    GATOS VS. CACHORROS

    Você gosta de gatos ou prefere cachorros? O Reino Unido é conhecido como país de pessoas que adoram animais de estimação e -abaixo dos peixes- cachorros e gatos são de longe a escolha mais popular; 24% dos domicílios britânicos incluem um cachorro, e 18% um gato.

    Que criatura é melhor como companheiro de casa? Parte da resposta depende, claro, de o quanto você quer ter de trabalho cuidando do seu bicho -você quer levá-lo para passear a cada manhã, e recolher cocô constantemente? Por outro lado, alergia a gatos é duas vezes mais frequente que alergia a cachorros.

    Diego Azubel/Efe
    Golden Retriever deita ao lado de gato na Feira Internacional de Cães da Tailândia.
    Golden Retriever deita ao lado de gato na Feira Internacional de Cães da Tailândia

    "O clichê permanente é de que os cachorros gostam do dono, e os gatos da casa do dono -o que na verdade quer dizer que gatos não gostam de gente", diz Péter Pongrácz, do Family Dog Project, em Budapeste, Hungria. Mas a questão não é necessariamente tão simples.

    Os cães foram domesticados antes que o ser humano inventasse a agricultura e a pecuária. A sobrevivência deles dependia de sua capacidade de se manterem próximos dos seres humanos e de serem aceitos por eles. Ainda que os cachorros sejam territoriais, seu conceito de territorialidade é altamente flexível -onde quer que seu dono vá, lá será o território do cachorro.

    Os gatos, por outro lado, foram domesticados quando os seres humanos começaram a construir assentamentos permanentes, no Oriente Médio, em geral para proteger a casa contra pestes como os roedores. A existência deles dependia da casa física, e é por isso que eles a encaram -e a defendem- como seu território.

    Tanto os donos de cachorros quanto os de gatos atribuem capacidades cognitivas e sociais sofisticadas aos seus animais, mas é muito difícil dizer qual dos dois é verdadeiramente superior. O comportamento canino atraiu mais pesquisas -possivelmente porque os gatos precisam ser testados em suas casas. "A verdadeira lição é que cachorros e gatos oferecem experiência semelhante aos seus donos como companheiros pensantes, empáticos e capazes de sentimentos", diz Pongrácz.

    E eles também podem beneficiar a saúde dos donos. Crianças que vivem com um cachorro em seu primeiro ano de vida parecem ter menos infecções do aparelho respiratório e do sistema auditivo, e diversos estudos sugerem que a propriedade de qualquer dos dois bichos reduz os níveis de estresse e pode reduzir a pressão sanguínea.

    Entre os adultos mais velhos, ter um gato pode até reduzir a probabilidade de morrer de doenças cardiovasculares. Nesse contexto, a mobília arranhada e os carpetes mal cheirosos parecem uma pechincha.

    FILHOS OU NÃO FILHOS

    Uma em cada cinco mulheres não teve filhos até os 45 anos de idade, proporção que parece destinada a subir no futuro. Admitidamente, procriar nem sempre é escolha; gravidez acidental e infertilidade podem torpedear mesmo os melhores planos.

    Mas quer você queira filhos, quer não, as crianças sem dúvida têm impacto profundo em sua vida, oferecendo um senso de propósito, amor e companheirismo duradouro, por um lado, e por outro causando estrago considerável em suas finanças, tempo livre e ambiente. Assim, que grupo pode ser considerado mais feliz - as pessoas com filhos ou sem?

    Quando o tema é o relacionamento romântico, a resposta parece clara. "Realmente parece confirmado que casais sem filhos são mais felizes quanto aos seus relacionamentos e mais felizes com seus parceiros do que casais com filhos", diz Jacqui Gabb, do Projeto Amor Duradouro (http://www.open.ac.uk/researchprojects/enduringlove/), da Open University, que examina os fatores que fazem com que relacionamentos funcionem em longo prazo. "E casais homossexuais que não têm filhos são o grupo mais feliz". E não é só que os casais sem filhos têm mais tempo disponível -podem manter relacionamento mais intenso com o seu deus, ou se dedicar a hobbies que consomem muito tempo, por exemplo. Uma diferença crucial parece ser a que eles demonstram mais propensão a encontrar tempo um para o outro, para dizer "eu te amo" e para conversar abertamente, constatou Gabb. Quanto a isso, os com filhos poderiam aprender com eles, seja por meio de noites de namoro regulares, ou levando o cachorro para um passeio juntos, ou simplesmente saindo juntos para um café sossegado, regularmente.

    Divulgação
    Autora de "Comer, Rezar, Amar", Elizabeth Gilbert decidiu não ter filhos
    Autora de "Comer, Rezar, Amar", Elizabeth Gilbert decidiu não ter filhos

    Mas também há lados positivo em ter filhos. Ainda que as mães possam se mostrar menos felizes com seus relacionamentos românticos, elas são o grupo mais feliz em termos gerais, constatou Gabb. E um grande estudo norueguês publicado na revista "Social Indicators Research" sugere que mulheres sem filhos reportam satisfação com a vida e autoestima significativamente mais baixas que as mães -ainda que isso possa mudar à medida que as expectativas da sociedade para com as mulheres mudem. O mesmo pode se aplicar ao impacto de ter filhos sobre a vida dos homens; por enquanto, ao menos, a diferença média entre os pais e os não pais em termos de bem-estar emocional é menos significativa do que no caso das mães.

    CASADO VS. SOLTEIRO

    Bridget Jones os define como "casados presunçosos" as pessoas envolvidas em relacionamentos de longo prazo, que encaram os solteiros com piedade. Mas, por mais irritante que isso seja, ao que parece os casais casados têm ao menos um motivo para se sentirem superiores: a saúde. Numerosos estudos constataram correlação entre ser casado e um risco menor de doenças como o diabetes, problemas cardiovasculares e problemas respiratórios. O efeito é mais pronunciado entre os homens, mas as mulheres casadas ou que vivam com um parceiro também parecem ter saúde melhor.

    Existem várias teorias sobre o motivo para isso, diz George Ploubidis, do University College de Londres, que acompanha a saúde de pessoas nascidas em 1958 em longo prazo, e a correlacionou à sua situação amorosa. "Em média, as pessoas envolvidas em relacionamentos duradouros tendem a ter estilo de vida mais saudável que os solteiros", ele diz. "A renda conjunta pode ser mais alta, e o relacionamento pode criar um efeito de rede social e oferecer proteção contra o estresse da vida cotidiana e de acontecimentos graves".

    Mas muita gente solteira pode ser tão saudável quanto os casados, ou mesmo mais saudável. Se você se cuidar, tiver renda relativamente boa e muitos amigos, pode ter saúde tão boa quanto a dos casados presunçosos. Para começar, as pessoas não casadas parecem dedicar mais tempo ao exercício físico, o que pode gerar muitos benefícios.

    E você tampouco deveria se manter em um mau relacionamento só para evitar ser solteiro. Um estudo com 9.011 funcionários públicos britânicos vincula relacionamentos estressantes a risco ampliado de doença cardíaca, e outra pesquisa sugere que o divórcio temporariamente eleva o risco de morte por todas as causas.

    Em longo prazo, porém, o estudo de Ploubidis sugere que ainda é melhor amar, ainda que o amor não dê certo, do que jamais ter corrido esse risco: "Constatamos que as pessoas que passaram por um divórcio ou separação -desde que venham a começar um relacionamento novo mais tarde- têm saúde semelhante à dos envolvidos em relacionamentos estáveis, no ponto médio da vida".

    MÍDIA SOCIAL VS. CONTATO PESSOAL

    Você está conectado? De acordo com estatísticas recentes, 59% da população britânica agora tem contas ativas de mídia social, com o Facebook na liderança (43% dos britânicos o usam). A mídia social sem dúvida tem benefícios, seja manter contato com os amigos, receber notícias e informações ou formar conexões com desconhecidos interessantes -ou úteis. Por outro lado, ela pode ser um pacto com o diabo, de alguma maneira; porque se você não tomar cuidado, pode comprometer sua privacidade e entregar seus dados pessoais a sabe Deus quem. Desconsiderada a questão da privacidade, podem haver outros aspectos negativos no uso do Facebook. Estudos recentes sugeriram que ele pode encorajar o narcisismo, e que está associado à solidão -ainda que isso aconteça provavelmente porque pessoas solitárias são mais propensas a usar o Facebook.
    Também é possível que ler constantemente sobre as vidas dos amigos faça com que você se sinta menos satisfeito com a sua.

    Ethan Kross, da Universidade do Michigan, vem estudando o efeito do Facebook sobre o bem-estar subjetivo de universitários. Ele diz que existem duas maneiras diferentes de usar a tecnologia: você pode se comunicar ativamente com as pessoas e postar informações ou pode ser um usuário passivo -simplesmente verificar seu newsfeed e olhar as fotos alheias.

    "Nossa pesquisa demonstra que quando você se envolve nesse tipo de uso voyeurístico da tecnologia, o resultado consistente é uma queda na satisfação da pessoa, de um momento ao seguinte", afirma Kross. "Possivelmente isso acontece porque você se compara constantemente aos outros, e quando as pessoas postam informações, em geral é sobre coisas boas". Ser um usuário ativo não faz com que uma pessoa se sinta melhor sobre si mesma necessariamente, "mas ao menos não faz mal", diz Kross.

    Assim, adote um controle mais severo de sua privacidade; seja um usuário ativo, em lugar de apenas espectador; e com isso você maximizará a probabilidade de que a mídia social funcione em seu favor.

    URBANO VS. RURAL

    No Reino Unido, 80% da população vive em grandes e pequenas cidades, mas a paisagem urbana responde por apenas 6,8% da área do país. Com isso, os moradores urbanos estão, em termos relativos, apertados como sardinhas em lata. Cidades querem dizer relativamente mais barulho, crime, agressão, e qualidade do ar inferior; mas também oferecem mais conveniências -não só cinemas, galerias e casas noturnas, mas hospitais, médicos especializados e serviços de emergência mais facilmente acessíveis. Assim, como é que viver na cidade se compara a um idílio rural, em termos de saúde e felicidade?

    Depende. Se você comparar idosos vivendo na área urbana de Nottingham e na área rural de Cambridgeshire, a dieta dos rurais é melhor mas os urbanos andam mais. E há os níveis de estresse: pesquisas recentes sugerem que os cérebros dos moradores em cidades podem estar mais preparados para reagir a estímulos estressantes, enquanto a vida urbana eleva o risco de ansiedade e de distúrbios de comportamento por 21% e 39%, respectivamente.

    Se você considerar os índices de fatalidades, as maiores diferenças entre cidade e campo estão nas doenças respiratórias e câncer de pulmão, com mais moradores urbanos sucumbindo a elas. Mas ao menos parte disso se relaciona ao nível mais alto de privação social e fumo nas áreas urbanas.

    Mortes acidentais, por outro lado, são mais comuns no campo, possivelmente porque mais acidentes rodoviários fatais acontecem em áreas rurais.

    E há a questão da felicidade. De acordo com dados do Serviço Nacional de Estatísticas britânico para o período 2011-2014, as pessoas que vivem na City de Londres, em Corby e Wolverhampton provavelmente apresentarão os piores resultados, enquanto os moradores de Eilean Siar, nas ilhas escocesas, ou Armagh, na Irlanda do Norte, terão os melhores. Os moradores da City de Londres também são os mais ansiosos dos britânicos, enquanto os de Fermanagh, uma área rural na Irlanda do Norte, reportam os índices de ansiedade mais baixos. No entanto, as diferenças entre as áreas são muito pequenas e é provável que sejam insignificantes perante fatores como a saúde, situação afetiva ou situação profissional. Mas "em geral as pessoas que vivem em áreas urbanas têm menos satisfação com a vida, e sentem menos que aquilo que fazem tem valor; sua ansiedade é mais alta que a dos moradores rurais, independentemente da idade", diz Lucy Tinkler, que comanda a equipe de pesquisa de bem-estar pessoal do serviço estatístico.

    CARNÍVERO VS. VEGANO

    A depender do que você leia, abocanhar um suculento filé é ou sentença de morte ou uma maneira deliciosa de reforçar o teor de ferro em seu organismo. O veganismo, enquanto isso, é obrigatório para alguns, e celebridades como Beyoncé são conhecidas por abandonar a carne -ao menos por algum tempo. Deveríamos seguir seu exemplo?

    Do ponto de vista ambiental, o consumo ávido de carne é má notícia. Até 32% das emissões de gases causadores do efeito estufa vêm da criação de animais para consumo alimentício, especialmente o gado, e são necessários 15,5 mil litros de água (o equivalente a uma piscina pequena) para produzir um quilo de carne bovina. Mas eliminar o gado, ou substituir os bovinos por galinhas ou porcos, não é solução perfeita; muitas pradarias não poderiam ser usadas para cultivar comida, mas podem ser usadas como pastagens para sempre. E os animais podem ser alimentados com as porções das safras -folhas e hastes, por exemplo- que seres humanos não devem consumir, reduzindo o desperdício. Até mesmo a Friends of the Earth acredita que o consumo de carne pode ser sustentável, mas precisamos comer menos e eliminar as opções de produção em massa.

    O quadro é semelhante no que tange à nossa saúde. Numerosos estudos vincularam o consumo de carne vermelha ao câncer intestinal e doenças cardíacas, ainda que o grau preciso de risco esteja aberto a debate. O teste europeu EPIC, por exemplo, não encontrou ligação entre o consumo de carne vermelha fresca e o câncer, mas concluiu que cada 50 gramas de carne processada (mais ou menos o equivalente a uma salsicha) que as pessoas comam ao dia causa elevação de 18% no risco de morte prematura por todas as causas. "Comer carne é bom porque envolve consumir certos micronutrientes, mas o consumo não deveria ser alto demais; é o único conselho razoável que podemos oferecer no momento", diz Sabine Rohrmann, epidemiologista da Universidade de Zurique e hoje pesquisadora chefe do teste EPIC. "E a carne processada definitivamente não deveria constar do cardápio todos os dias". Mas seria mais saudável optar pelo vegetarianismo? Os resultados do EPIC sugerem que não. "O que vemos em estudos como o EPIC é uma indicação de que as pessoas que comem pequenas quantidades de carne são tão saudáveis quanto os vegetarianos, ou talvez mais saudáveis", diz Rohrmann. Possivelmente isso acontece porque nem sempre vegetarianismo quer dizer uma dieta saudável.

    Também não existe prova de que comer carne de frango ou peixe, repletas de proteínas e nutrientes, eleve o risco de câncer.

    "Ser vegetariano é perfeitamente bom, mas a pessoa precisa de cuidado com o que come para não sofrer de deficiência de nutrientes como o ferro, o zinco e as vitaminas B", diz Rohrmann.

    POUPAR VS. GASTAR

    O debate sobre optar por uma política de austeridade ou sair da dívida gastando é constante, no plano nacional, mas e quanto às nossas finanças pessoais? Melhor economizar para os dias chuvosos ou pagar sem chiar pelo mais recente aparelho que promete aumentar a produtividade ou simplesmente propiciar prazer?

    As pessoas costumam dizer que o dinheiro não compra felicidade, mas Elizabeth Dunn, professora de psicologia na Universidade da Colúmbia Britânica (Canadá) e coautora de "Happy Money" (dinheiro feliz), diz que "a renda faz diferença para a felicidade. É melhor ganhar mais dinheiro do que ganhar pouco. Mas a relação é menos firme do que a maioria das pessoas presume".

    De fato, um estudo recente demonstrou que, assim que as pessoas atingem uma renda anual de US$ 75 mil, o dinheiro adicional que venham a ganhar não influencia muito o número de risadas ou sorrisos de que elas desfrutam em um dado dia.

    O que talvez seja igualmente importante, porém, é a maneira pela qual a pessoa gasta seu dinheiro. Quando Dunn e seus colegas deram US$ 5 ou US$ 20 a universitários selecionados aleatoriamente, e os instruíram a gastar a quantia em benefício delas mesmas ou de outra pessoa, os que gastaram o dinheiro em benefício dos outros reportaram mais alegria pelo resto do dia, independentemente da quantia recebida.

    Com base nessa e outras pesquisas, Dunn desenvolveu cinco regras para extrair a maior felicidade possível de seu dinheiro. Além de gastar dinheiro com os outros, é provável que você fique mais feliz se adquirir experiências como férias ou idas ao teatro do que objetos materiais. Você também deveria tentar fazer da experiência de gastar dinheiro um prazer racionado: comprar nossas coisas favoritas com menos frequência reforça nossa capacidade de desfrutar delas. Semelhantemente, retardar a gratificação ao economizar para comprar alguma coisa, em lugar de comprá-la a crédito, pode produzir mais prazer, porque quando enfim adquiridas elas parecem ter vindo de graça. Por fim, compre tempo: "Gastar dinheiro com um faxineiro pode liberá-lo para curtir a tarde de sábado com a família, em lugar de arrumar a casa", diz Dunn.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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