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    Leia o poema "O Cinturão", de Edward Lear, o pai do nonsense

    EDWARD LEAR
    tradução DIRCE WALTRICK DO AMARANTE
    ilustração RODRIGO VISCA

    05/06/2016 02h00

    SOBRE O TEXTO Este poema, que fala de um monstro que devora donzelas, foi escrito em 1874 durante uma temporada do autor inglês na Índia. Um dos pais do nonsense, Lear muda o sentido das palavras que utiliza. O título original, "Cummerbund", se refere à faixa usada pelos indianos na cintura, e "dobie", por exemplo, "lavadeiro", aqui aparece como almofada ou cadeira. Em nota introdutória a "Conversando com Varejeiras Azuis", que reúne outros poemas e textos em prosa de Lear e sai neste mês pela Iluminuras, a tradutora esclarece que manteve as palavras indianas para reproduzir o "estranhamento buscado por Lear".

    Rodrigo Visca

    I

    Sentada na sua Dobie,

    Via a estrela vespertina,

    E todos os Punkahs que passavam

    Gritavam: "Oh! Que linda menina!".

    Ao redor de sua tenda as folhas se agitavam,

    O grande Kamsamah crescia,

    E Kitmutgar, qual cortina selvagem

    Dos Tchokis azuis, descia.

    II

    Sob sua casa o rio passava,

    Com somrosa e suave melodia,

    E o Chuprassie dourado nadava,

    Em incontáveis círculos se ia.

    Em cima, nas árvores mais altas e distantes,

    Pousavam verdes aias solitárias,

    E o Mussak gemia como antes

    Suas mais melancólicas árias.

    III

    E onde os Nullahs púrpuras lançavam

    Seus ramos vastos e grandiosos,

    E Goreewallahs prateados voavam,

    Lado a lado, silenciosos,

    Os pequenos Bheesties gritavam

    Elevando-se no ar ardente,

    E o Jampan raivoso bradava

    No seu covil profundamente.

    IV

    Sentada na sua Dobie,

    Ouvia o Nimmak ecoar,

    Quando um grito soou longe:

    "O Cinturão vai chegar!".

    Em vão fugiu: com a boca aberta

    O furioso Monstro a seguiu,

    E assim (antes que a ajuda viesse)

    Ele a bela dama engoliu.

    V

    Procuraram pelo menos um osso

    Para o enterrar respeitosamente;

    Disseram: "Mas que triste destino!".

    (E o Eco respondeu: "Certamente".)

    Pregaram sua Dobie na parede,

    Onde sua última forma fora vista,

    E sob ela algumas palavras escreveram,

    Em amarelo, azul e vermelho:

    "Cuidado, menina! Menina, cuidado!

    Não se deve tarde da noite lá fora sentar,

    Pois os Cinturões por aí têm andado,

    E de uma vez só vão te destroçar."

    EDWARD LEAR (1812-88), poeta e pintor inglês.

    DIRCE WALTRICK DO AMARANTE, 47, é tradutora, professora de artes cênicas na UFSC e autora de "Para Ler Finnegans Wake de James Joyce" (Iluminuras).

    RODRIGO VISCA, 35, é artista plástico.

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