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    Diário do Rio: A ala de Bangu no Carnaval

    ALVARO COSTA E SILVA

    26/02/2017 02h00

    Eduardo Knapp/Folhapress
    Multidão acompanha participa do desfile Cordão do Bola Preta, no centro do Rio de Janeiro
    Multidão acompanha participa do desfile Cordão do Bola Preta, no centro do Rio de Janeiro

    Ainda restam três dias para brincar o Carnaval até cansar ou, se você é tímido, conferir as modas e os costumes que o carioca levou para as ruas.

    Há uma inflação de camisetas verdes. São cópias, vendidas em camelôs, dos uniformes usados pelos presos no Complexo de Bangu. Trazem os nomes de Adriana Ancelmo, Sérgio Cabral ou Eike Batista, e ao lado a sigla SEAP-RJ (Secretaria de Estado de Administração Penitenciária). A de Cabral é a campeã de vendas, batendo a máscara de Trump.

    O enfeite de seio é –como se diz mesmo?– tendência. Para usá-lo, é preciso colocar uma fita adesiva dupla. Mas não incomoda, garantem moças e rapazes. Uma dose de glitter –no rosto, no corpo, no cabelo, nos olhos– também vale como último grito.

    Já rotineira, a chuva de calcinhas, promovida por uma marca de roupa íntima num bloco no Leblon, terá neste ano a concorrência da chuva de cuecas. Patrocinada também é a distribuição de sachês de gel lubrificante íntimo. Essa cápsula do amor, iniciativa de uma marca de camisinhas que deu confusão no ano passado, já é coisa de antigos Carnavais.

    Para matar a sede, as preferidas são as "periguetes", a latinha miúda de cerveja (269 ml). O latão (473 ml) é mais caro e esquenta rápido. O "chandonlé" (sacolé de espumante) ficou cafona. Na pochete –sim, elas voltaram–, Engoves e Epocleres.

    Em alguns blocos da zona sul, sambar é considerado retrógrado. Para frente é dançar maracatu, jongo, coco e boi. Valem até movimentos do funk e hip-hop. Ou inspirados em exercícios aeróbicos.

    A turma tradicional reage voltando aos anos 1970. Desfiles do Cacique de Ramos e Bafo da Onça –maiores blocos de embalo do Rio– prometem lotar a avenida Chile, no centro. A região continua em alta, com o VLT fazendo a função dos bondes do passado como condutor da alegria.

    Muita gente, insatisfeita com os rumos da rua, voltou a frequentar o cortejo das escolas de samba, que recuperaram, em parte, seu fascínio primitivo. Em tempos de crise, o Sambódromo não mostra mais aquele luxo que fez a fama de Joãosinho Trinta.

    CHINA PAU

    São mais de 600 blocos e bandas, entre aqueles que receberam da prefeitura licença para desfilar e os que nascem na hora. Uma espontaneidade que tende a aumentar neste Carnaval. É o efeito da polêmica da marchinha. Vamos supor a seguinte situação: contra a proibição de "Maria Sapatão", "Cabeleira do Zezé", "Índio Quer Apito", "O Teu Cabelo Não Nega", uma turma se revolta e segue pulando e cantando as músicas da discórdia. Resultado do racha: em vez de um bloco, agora temos dois.

    Vai uma sugestão: "China Pau", de Braguinha e Alberto Ribeiro, cuja letra diz assim: "Li num almanaque/ Que mandaram de Pequim/ Japonês de fraque/ Parece com pinguim/ E uma japonesa/ Que tomou nanquim/ Teve sete filhos/ Com cabelo pixaim/ Eu já li no leque/ Da mulher de um mandarim/ Que pé de moleque / Já não leva amendoim".

    CUCUMBIS E DIABOS

    Como o afro-brasileiro brincou o Carnaval no período das lutas pela abolição da escravatura? É o que responde o historiador Eric Brasil em livro excelente que acaba de sair: "A Corte em Festa: Experiências Negras em Carnavais do Rio de Janeiro, 1879-1888" [Prismas, 230 págs., R$ 54].

    Muitos, ao tentarem se divertir, iam parar nas casas de detenção. Mas criaram os cucumbis carnavalescos, que estão na origem dos cordões, e a figura do diabinho encarnado, cuja imagem ficou associada à violência, ao crime e ao medo.

    BIÓLOGO DO SAMBA

    É um dos melhores discos do ano. De produção independente, "Álbum de Retratos" marca a estreia de Vidal Assis, biólogo de profissão, e violonista e compositor de mão cheia. O CD reúne 12 parcerias com o letrista Hermínio Bello de Carvalho –uma delas também leva a assinatura de Elton Medeiros.

    Grande inspiração do novato, Elton virou parceiro constante, e um trabalho reunindo composições da dupla já está a caminho. Quem ganha é a música brasileira. Ligado às tradições musicais do país, Vidal Assis (guardem este nome) já assina maravilhas como "Nem Sempre, Nem Jamais" ("Se perguntarem o quanto aprendi/ Não sei contar/ Só sei que o amor guarda/ Dentro de si/ Um velho altar").

    ALVARO COSTA E SILVA, o Marechal, 54, é autor de "Dicionário Amoroso do Rio de Janeiro" (Casarão do Verbo).

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