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    Diário de Paris: mostra explora apetite insaciável do inglês David Hockney

    ISABEL JUNQUEIRA

    02/07/2017 02h00

    Martin Bureau - 16.jun.2017/AFP
    British artist David Hockney poses in front of his painting "Fred and Marcia Weisman" during a photo session at the Pompidou Centre in Paris, on June 16, 2017. / AFP PHOTO / Martin BUREAU / RESTRICTED TO EDITORIAL USE - MANDATORY MENTION OF THE ARTIST UPON PUBLICATION - TO ILLUSTRATE THE EVENT AS SPECIFIED IN THE CAPTION
    O artista britânico David Hockney em frente a uma de suas pinturas em cartaz no Pompidou, em Paris

    Depois de uma primeira parada na Tate, em Londres, a retrospectiva de David Hockney desembarcou no Centre Pompidou (até 23/10) quase sem tirar nem pôr. Algumas baixas —entre elas, "Modelo com Autorretrato Inacabado" (1977)— foram compensadas por telas saídas do forno, enviadas diretamente do ateliê em Los Angeles, onde o artista vem passando a maior parte dos seus 80 anos.

    O artista inglês se consagrou ao imortalizar nas suas pinturas das décadas de 1960 e 70 cenas hedonistas em torno das piscinas e casas modernistas da cidade californiana. "Não é um segundo Éden, e sim um espaço utópico, como o Taiti foi para Gauguin e o Marrocos para Matisse, explicaram os especialistas Paul Melia e Ulrich Luckhardt.

    A mostra evidencia a destreza artística e o apetite insaciável do britânico, além de "A Bigger Splash" (1966). Depois de descobrir a obra de Picasso em 1960, o jovem logo se deu conta de que não precisava ser fiel a nenhum tema, estilo, técnica ou gênero, lição que segue à risca até hoje.

    Hockney também herdou do mestre catalão o gosto pelo experimentalismo, usando e abusando de tecnologias (de fotocopiadoras e faxes até iPads), e um interesse particular na representação do espaço na pintura. Didier Ottinger, curador da retrospectiva parisiense, deu ênfase a este aspecto.

    O homenageado adorou a valorização desse período nada unânime entre os críticos. Quando visitou a montagem da mostra com jornalistas, tinha em punho e mostrava para todos "A Perspectiva Invertida", ensaio escrito em 1919 pelo teólogo russo Pavel Florensky que questionou a perspectiva renascentista monofocal.

    Passou batido pelas primeiras salas até chegar à produção mais recente, recheada de pontos de fuga que convergem para fora da pintura. A perspectiva invertida das obras faz o espectador se sentir no centro da ação —a emoção varia de acordo com o conteúdo. O quadro no meio do tríptico inédito "Anunciação" (2017), que recria a famosa cena bíblica pintada por Fra Angelico, em 1437, é um dos mais bem-sucedidos.

    TEATRO DE REVISTA

    Desde que "Grande -" estreou no fim de 2016, os ingressos para o mais recente espetáculo circense de Tsirihaka Harrivel e Vimala Pons têm-se esgotado na velocidade da luz —em setembro, os artistas voltam ao Le Cent-Quatre, em Paris, antes de turnê pela Europa.

    "Inclassificável" é o adjetivo mais lido na imprensa para descrever a dupla que se conheceu em 2005 no Cnac (Centro Nacional de Artes do Circo) e se destacou no coletivo Ivan Mosjoukine com criações como o "De Nos Jours".

    Em "Grande -", eles brincam com o formato do teatro de revista do final do século 19, pondo em prática a fisicalidade do vocabulário circense (malabarismo, jogos de facas, ventriloquismo, acrobacia...) a serviço da fragilidade das emoções humanas, mais especificamente o fim de uma relação amorosa. Cada número compõe um mosaico de sentimentos à flor da pele, sem preocupação narrativa em explicar comos e porquês.

    Além de atuarem com diversos objetos cotidianos dispostos em cima de mesas, eles agem no palco como diretores, sonoplastas e contrarregras, exercendo um controle quase absoluto sobre números hilários, como uma briga de casal em que um arremessa facas no outro.

    Mas nem tudo pesa nas costas dos dois protagonistas. O hífen do título não é por acaso: "O espetáculo deve ser completado pela experiência de vida de cada espectador ao sair da sala", dizem.

    DIORAMANIA

    Numa carta à sua irmã, Balzac descreveu o diorama como "a maravilha do século". O escritor francês não foi o primeiro nem o último fã dessa revolução ótica, espécie de teatro sem atores onde imagens parecem se movimentar graças a um jogo de luzes e espelhos.

    Inventado em 1822 por dois pintores —entre eles Daguerre, um dos pais da fotografia—, o dispositivo do século 19 caiu aos poucos em desuso, mas continuou fascinando o imaginário de muitas gerações, como mostra uma exposição no Palais de Tokyo (até 10/9).

    DIORAMANIA 2

    Parte de "Dioramas" examina as diferentes formas nas quais artistas contemporâneos —Ryan Gander, Hiroshi Sugimoto, Anselm Kiefer— se apropriaram desse antepassado do cinema e da realidade virtual. O mais interessante é quando a mostra evidencia as motivações etnográficas, pedagógicas ou religiosas por trás do ilusionismo.

    ISABEL JUNQUEIRA, 33, é jornalista.

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