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    Revolução russa, 100

    Ausência de celebração oficial frustra estrangeiros que viajaram à Rússia

    SANDRO FERNANDES
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM SÃO PETERSBURGO

    05/11/2017 02h00

    Um ex-guerrilheiro que participou do sequestro de um embaixador americano no Brasil, um político brasileiro com três décadas de mandatos em partidos de esquerda e o dono de um bar comunista do Rio de Janeiro.

    Esses são alguns dos integrantes de uma das muitas comitivas de estrangeiros que viajaram à Rússia para celebrar os cem anos da Revolução de Outubro.

    "Somos 17 amigos que frequentam o bar mais de esquerda do Rio. Nós nos juntamos e resolvemos vir", afirma o músico Tiago Prata.

    A viagem, claro, não é apenas política. A ideia de conhecer um país com alto valor simbólico e cultural também atrai. Mas, ainda assim, é difícil esconder a frustração com a pouca importância que os russos dão ao centenário.

    "No museu Hermitage, a guia russa era super-reacionária e anticomunismo. Ela ficava falando sobre o olhar triste dos filhos da família imperial russa e sobre a tristeza por eles terem sido assassinados", diz Prata. E continua: "A própria exposição está mais focada na família Romanov, derrubada pela revolução, do que nos revolucionários".

    Revolução Russa, 100

    O grupo fez uma faixa, em russo e em português: "Brasileiros saúdam a Revolução Bolchevique". Com a falta de comemorações no país, contudo, não sabem onde estender a homenagem bilíngue.

    Eles também se surpreenderam com o fato de jovens russos ignorarem o hino da Internacional Comunista.

    Integrante da comitiva, o deputado estadual Eliomar Coelho (PSOL-RJ) desconversa quando as reformas liberais do governo de Vladimir Putin são mencionadas. Prefere lembrar os pontos positivos do regime soviético.

    "As reformas urbanísticas que aconteceram com a União Soviética são um legado muito importante para todo o mundo, assim como o legado na educação, na saúde, nos transportes."

    Para o jornalista Cid Benjamin, também parte do grupo, o mundo tem uma dívida com o povo russo pela vitória na 2ª Guerra Mundial. Ele afirma que já esperava encontrar na Rússia um ambiente hostil às ideias da revolução de 1917. "O atual governo tem controle absoluto do país."

    Tentando trazer esperança comunista para a conversa, o advogado Carlos Pereira Neto Siuffo lembra uma frase que, segundo ele, é dita por Alfredinho, dono de um bar popular do Rio: "O que está profundo e enraizado aqui na Rússia vai renascer, em algum momento".

    Comunistas e anarquistas de outros países também estão na Rússia pelo centenário.

    "Nossa comitiva encheu um ônibus. Somos 32 pessoas, de várias partes da Argentina. Muitos estão economizando há anos para vir celebrar a Revolução", diz o produtor musical Javier Marín.

    "Acho que o marxismo ainda é a única solução para resolver questões como a desigualdade. Dizem que o socialismo não deu certo, mas o capitalismo deu certo onde?"

    Marín continua: "O capitalismo deu certo para algumas pessoas. De maneira geral, somos todos assalariados, proletariados. Por isso temos que nos unir. Temos que tentar outras experiências socialistas no mundo".

    Mariela Hernández, profissional liberal, viajou à Rússia no mesmo grupo de Marín.

    Revolução Russa, 100: análises

    "Viemos na expectativa de encontrar camaradas de vários países, camaradas que ainda sonham com um mundo justo. A gente pode aproveitar muitas coisas da União Soviética, mas devemos avançar em outras questões, como direitos individuais, o respeito às diferentes identidades de gênero, por exemplo".

    O estudante francês Michel Colt diz que os europeus estão em menor quantidade. "As pessoas na Europa atingiram um alto nível de desenvolvimento, à custa de povos mais pobres, e não pensam em solidariedade. Na América Latina, vocês convivem com a pobreza o tempo todo, por isso existe mais sensibilidade aos ideias comunistas no Brasil do que na França".

    Entre o povo russo, a sensação de ver estrangeiros mobilizados pelo centenário da revolução causa estranheza.

    "Não entendo por que tantos estrangeiros gastam tanto dinheiro vindo até a Rússia para uma comemoração que não existe", diz a professora Svetlana Solodovnikova.

    Os russos veem com desconfiança e cautela qualquer mudança. A palavra "revolução" é um tabu ainda não superado. "É como se eles viessem para uma festa na minha casa, mas eu mesma não estou fazendo nenhuma festa."

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