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    Minha História

    Pramod Bhasi

    'Papa' da terceirização que elevou Índia a centro de serviços começou sem telefones

    DEPOIMENTO A
    TONI SCIARRETTA
    DE SÃO PAULO

    23/06/2013 02h00

    O indiano Pramod Bhasin foi fundador da Genpact, empresa de "outsourcing" (terceirização) que iniciou como um braço da General Electric, enfrentando dificuldades como falta de linha telefônica e funcionários despreparados. Hoje, a Genpact é uma das gigantes do setor. Leia depoimento de Bhasin à Folha.

    *

    Voltei dos EUA em 1994 para abrir a filial da General Electric Capital [braço financeiro da GE] na Índia.

    A ideia era criar uma estrutura para financiar consumo, comércio e empresas. Começamos a estruturar o escritório de apoio dessa operação.

    Índia ainda está despreparada para mundo que não é mais plano

    Ao mesmo tempo, a GE era pioneira em software para "outsourcing" [terceirização de processos]. Começamos a trazer para a Índia alguns processos gerenciais da GE.

    Eu pensei: por que não podemos fazer isso para o resto do mundo? Nosso pessoal é muito bom, bem educado, fala inglês. Seguramente poderíamos prestar o serviço por uma fração do custo.

    Foi só uma ideia; não foi um projeto fruto de um grande estudos de viabilidade.

    O único grande problema é que não tínhamos nem sequer linhas de telefone! Nem escritórios nem pessoas para serem treinadas.

    Fui falar com meu chefe [Jack Welch, ex-presidente da GE], mas, a cada ligação, a linha caía... Imagino ele rindo de mim: "Você não tem nem linha telefônica e quer fazer meu trabalho da Índia?".

    Mas ele me deu uns poucos milhões de dólares e disse: ok, você pode tentar.

    A GE fez um experimento com a gente por seis meses. Fizemos o escritório nos arredores de Chennai [no sul da Índia]. Tivemos de resolver tudo. Como vamos conseguir as linhas telefônicas?

    Depois tivemos que achar pessoas que pudessem trabalhar à noite e ir para um lugar que não tinha ônibus, comida, nada. Tivemos que fazer treinamento, dar comida, ônibus, fazer o telefone e os computadores funcionarem. Tudo isso era muito novo.

    Os pais ligavam e perguntavam: o que vocês estão fazendo com minha filha de madrugada? Era muito complicado dizer que colocávamos homens e mulheres numa mesma sala. Na sexta, as pessoas vinham muito bem arrumadas para o trabalho; era o dia de sair após o expediente. Fomos responsáveis por muitos casamentos!

    PROCESSOS

    A maioria não sabia nada de processos. Então, escrevemos as tarefas que deveriam ser feitas, passo a passo.

    Começamos com os processos mais fáceis, como atualização de dados e de endereços dos clientes.

    Eles reuniam esses processos nos EUA, mandavam para a gente fazer durante a madrugada, e no outro dia enviávamos de volta. Como era tudo novo e muito estranho para todos, checávamos três vezes antes de enviar.

    Tínhamos que contratar gente para atender clientes do outro lado do mundo com problemas no cartão de crédito ou na hipoteca. Mas na Índia não havia hipotecas e quase não havia cartões.

    Nossos funcionários eram inteligentes, mas não tinham vivência daqueles produtos. Fomos procurar pessoas nos EUA e no Reino Unido para mostrar como funcionavam as lojas de departamentos. Fizemos vídeos sobre hipotecas, empréstimos e seguros para nossas equipes.

    A cada dia recebíamos o telefonema de um cliente novo perguntando se poderíamos atendê-lo. E a cada dia havia um evento novo: o telefone quebrava, o ônibus não chegava, faltava comida. Toda manhã perguntava: "E hoje?".

    Mas alguém percebeu que nosso serviço era bem razoável, nosso custo era uma fração e que podíamos fazer processos realmente sofisticados à distância da Índia.

    Quando iniciamos os call centers, não tínhamos cabines apropriadas para o serviço. As mulheres começaram a trazer saris e cortinas de casa. Treinamos alguns funcionários para ter sotaque americano e outros, britânico.

    Cada vez que abríamos vagas, apareciam 5.000, 8.000 pessoas. Percebemos que tínhamos na mão uma mina de ouro de pessoas talentosas.

    Mas, se uma máquina quebrava, tínhamos que ligar para alguém na Europa e pedir para pegar um avião e vir consertá-la. O que aconteceria se pegasse fogo no prédio? Não tínhamos backup nenhum.

    Logo espalhou-se que podíamos cortar em 50% o custo das empresas nos processos administrativos e com serviço de qualidade.

    Foi quando pensamos em separar as operações da GE Capital para atender a outras empresas. Depois fizemos seguros, acidentes, empréstimos, lojas de departamentos.

    Também cometemos uma série de erros nos processos porque não sabíamos o que estávamos fazendo. Mas tivemos clientes muito bons, que checavam o que era feito e não nos deixavam sozinhos.

    Nunca imaginaria, mas consertamos à distância máquinas complexas de hospitais. Contratamos médicos para fazer diagnósticos.

    A maior complicação sempre foi o uso de tecnologia.

    Hoje, quando olhamos para trás, percebemos que pegamos um tigre pelo rabo.

    Divulgação
    O presidente da Genpact Pramod Bhasin, indiano pioneiro do outsourcing
    O presidente da Genpact Pramod Bhasin, indiano pioneiro do outsourcing

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