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    Argentina precisa fazer mais, dizem autoridades em Davos

    CLÓVIS ROSSI
    ENVIADO ESPECIAL A DAVOS

    25/01/2014 14h38

    Dois dos mais altos funcionários internacionais com responsabilidades sobre América Latina coincidem em dizer que a desvalorização do peso argentino foi "inevitável", conforme o boliviano Enrique García, presidente da CAF (Corporação Andina de Fomento), uma espécie de BNDES dos países andinos, mas que também atua em outros países latino-americanos.

    Reforçou Alícia Bárcenas, a mexicana que comanda a Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe): "O que aconteceu agora é apenas mais uma fase, definitivamente a mais forte, das desvalorizações que já haviam se iniciado antes".

    Os dois coincidem também em dizer que o "inevitável" terá que ser seguido por outras medidas, um ajuste fiscal, por exemplo, para evitar que haja uma disparada de preços como consequência da desvalorização, que sempre encarece os produtos importados.

    Nem García nem Bárcenas vêem risco de um contágio da crise argentina no Brasil. "A crise está sendo sobredimensionada", acha o presidente da CAF.

    Que o Brasil está fora do radar ficou claro no debate de encerramento do encontro anual-2014 do Fórum Econômico Mundial. O tema era "Panorama Econômico Global", mas a palavra Brasil nem sequer foi pronunciada por nenhum dois oito debatedores.

    Conclusão do debate: deve haver "um cauteloso otimismo" sobre a situação econômica do planeta, na avaliação de Harukiro Kuroda, o presidente do Banco do Japão, o banco central japonês.

    A propósito de Kuroda: Martin Wolf, principal colunista do Financial Times e moderador da mesa redonda, disse que se tratava, no momento, "do mais excitante banqueiro central do mundo".

    Tudo porque o banco de Kuroda é um dos principais executores da chamada "Abenomics", a política econômica do primeiro-ministro Shinzo Abe, que tenta - e está conseguindo - tirar o Japão do marasmo e da deflação, queda generalizada de preços que deprecia todos os ativos do país.

    Ou seja, é uma função exatamente oposta à do Banco Central do Brasil, muitas vezes acusado de não fazer o necessário para manter a inflação no centro da meta de 4,5% (está em 5,91%).

    No Japão, a meta é puxar a inflação para cima, até que se estabeleça em 2% dentro de dois anos. Há nove meses, quando a nova política foi lançada, era negativa. Hoje, está em 1,2%.

    Também ao contrário do que ocorre no Brasil, na Europa o risco é de deflação, definida como queda disseminada de preços.

    DEFLAÇÃO EUROPEIA

    Christine Lagarde, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional apontou a possibilidade de deflação, que calculou em 20%, como um dos principais riscos que cercam a tímida recuperação da economia europeia.

    A deflação acontecerá, disse Lagarde, se houver um choque qualquer na economia de países que já estão com baixa inflação. É o caso do conjunto da zona do euro, formada por 18 países, na qual "a inflação está baixa e assim continuará por algum tempo, talvez dois anos", como disse Mario Draghi, o presidente do Banco Central Europeu.

    A inflação está em 1% apenas, quando a meta do BCE é o dobro.

    "Quanto mais tempo permanecer baixa, mais sério o risco de deflação", diz Draghi.

    Um segundo ponto relevante do debate foi reafirmar a impressão generalizada, antes mesmo de que começasse o encontro de Davos, de que o crescimento, ao contrário do que vinha acontecendo nos últimos muitos anos, voltou a ser comandado pelos países desenvolvidos.

    Reconheceu, por exemplo, Montek Singh Ahluwali, vice-presidente da Comissão de Planejamento da Índia:
    "A maior parte do crescimento adicional da economia mundial virá dos países desenvolvidos".

    A China, a grande locomotiva global, lembrou Ahluwali, estabilizou seu crescimento em 7,7%, o que é ainda um nível elevadíssimo mas muito inferior aos 9,7% que foi a sua impressionante média anual durante 35 anos, fenômeno sem precedentes na historia humana.

    A Índia recuou de um crescimento de 8% em média para quase a metade (exatamente 5%).

    O Brasil não foi mencionado mas é sabido que seu crescimento está sendo medíocre nos anos Dilma.

    Falou-se também do risco de turbulência a partir da retirada pelos Estados Unidos do seu espetacular programa de incentivos à economia.

    Nesse ponto, Lawrence Fink, presidente da firma BlackRock, único do setor privado presente ao debate, fez uma crítica aos países em desenvolvimento, sem no entanto citar nomes.

    Disse que os efeitos negativos nos países emergentes não devem ser atribuídos apenas nem principalmente ao levantamento dos estímulos, mas "às más políticas internas".

    Lagarde, do FMI, concordou ao dizer que países com os seus fundamentos em ordem sofrem menos ou não sofrem nada quando a retirada dos estímulos faz com que haja menos dólares na praça e os que sobram voltam para os Estados Unidos, por ser um investimento mais seguro.

    Por fundamentos, entenda-se controle do gasto público e da inflação, principalmente, e uma política cambial adequada, exatamente o que a Argentina não tinha e a obrigou a desvalorizar o peso. "Que outra coisa poderia fazer?", pergunta Alícia Bárcenas.

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