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    Sem regulação, país é coadjuvante em cosméticos orgânicos

    TATIANA FREITAS
    ENVIADA ESPECIAL A NUREMBERG

    23/03/2014 03h20

    Nem só de alimentos vive o setor de orgânicos. Embora ainda represente apenas 2% do mercado total, o segmento de cosméticos orgânicos já movimenta cerca de US$ 9 bilhões em todo o mundo.

    Os dados, referentes a 2012 da Organic Monitor, consultoria especializada no setor, abrangem as vendas de xampus, cremes, esfoliantes, óleos, espumas para banho e um amplo portfólio de produtos para maquiagem.

    Tudo o que as mulheres adoram, mas orgânico -produzidos sem testes em animais, ingredientes petroquímicos, de origem animal, e livres do uso de pesticidas e fertilizantes artificiais.

    Em alguns casos, é autorizado um percentual de componente químico, mas a matéria-prima é a mais natural possível.

    A biodiversidade favorece o Brasil nesse mercado. O país, contudo, não passa de coadjuvante nessa área, protagonizada por empresas da Europa e da América do Norte, que respondem por 90% do mercado total.

    MADE IN BRAZIL?

    Nos corredores da Biofach, a maior feira de orgânicos do mundo realizada no mês passado em Nuremberg (Alemanha), nomes bem familiares chamam a atenção de brasileiros que circulam por ali: açaí, cupuaçu, buriti, castanha do Brasil.

    Frutos da biodiversidade brasileira, são ingredientes altamente demandados pela indústria mundial, pois ajudam na difícil tarefa de produzir cosméticos orgânicos que proporcionem resultados semelhantes aos dos produtos convencionais.

    "O Brasil tem uma grande oportunidade nesse mercado, por causa da biodiversidade dos ingredientes que tem", diz Amarjit Sahota, presidente da Organic Monitor. "O desafio é fabricar o produto final", acrescenta.

    Sahota aponta o alto nível de competitividade dos fabricantes europeus e americanos como barreira à entrada dos cosméticos brasileiros.

    Especialistas e empresas do país, no entanto, dizem que o principal gargalo está na regulação.

    LEGISLAÇÃO

    Não há regulamentação sobre o tema no país. Nos EUA e na Europa também não há uma legislação específica para esse segmento, mas há critérios claros e certificação para atestar que determinado cosmético é orgânico.

    "A falta de regulamentação acaba não atraindo investimentos das empresas brasileiras. Mesmo se elas quisessem vender cosméticos orgânicos no mercado interno, não conseguiriam o certificado", diz Daniel Sabará, diretor da área de beleza e higiene pessoal da Beraca.

    Fornecedora de insumos como óleos, extratos e essências vegetais, a Beraca tem como clientes gigantes da indústria de cosméticos como L'Oreal e Procter & Gamble. Não tem planos, pelo menos por enquanto, de fabricar o produto final.

    Embora já tenha sido debatida entre representantes do setor de cosméticos, do Ministério da Agricultura -que regulamenta a legislação de orgânicos no Brasil- e da Anvisa -responsável pela autorização para a venda de cosméticos no país-, a regulamentação não avançou.

    O debate travou na Anvisa, que entende que um cosmético não pode ser orgânico. A análise da agência é a seguinte: como é preciso que ocorra uma reação química no processo de fabricação do cosmético, o produto final não pode ser orgânico, mesmo que os insumos sejam produzidos dessa forma.

    "Como a Anvisa não tem interesse em aprovar, pois não concorda com o conceito de cosmético orgânico, o Ministério da Agricultura fica impedido de regulamentar o tema e não pode permitir que alguém escreva 'produto orgânico' na embalagem de cosmético", diz Ming Liu, coordenador do Projeto Organics Brasil, que reúne os exportadores de orgânicos.

    "O potencial do Brasil nesse mercado é gigantesco, mas existem limitações importantes. Enquanto elas não forem liberadas, estaremos amarrados", diz Alexandre Harkaly, presidente da certificadora brasileira IBD.

    Procurada, a Anvisa informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que o debate para a regulamentação de produtos orgânicos está suspenso.

    ALTERNATIVAS

    Apesar da falta de regulação, algumas empresas brasileiras se arriscam na fabricação de produtos finais. É o caso da Surya, que vende no país e exporta cosméticos naturais, veganos e orgânicos com formulação própria.

    A presidente da Surya, Clélia Angelon, minimiza o impacto da falta de regulamentação nos negócios. "Trabalhamos o conceito da produção orgânica em nossa marca", diz a empresária.

    Ela admite, no entanto, que o ritmo de crescimento dos negócios é maior no exterior do que no mercado interno -a empresa exporta seus cosméticos para cerca de 30 países.

    "A participação dos EUA no nosso faturamento está se aproximando da do Brasil", disse a empresária, que também possui, em São Paulo, um spa vegano.

    A jornalista viajou a Nuremberg (Alemanha) a convite do Projeto Organics Brasil

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