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    'Seria bobagem' dizer que reação não fez IBGE voltar atrás em Pnad, diz instituto

    PEDRO SOARES
    DO RIO

    05/05/2014 18h55

    Para a presidente do IBGE, Wasmália Bivar, a reação contrária à interrupção da Pnad Contínua pesou na decisão de retomar as divulgações da pesquisa, suspensas em abril.

    "Eu não vou dizer para você que não teve nenhuma influência. Seria bobagem", disse ela à Folha.

    Após a crise institucional que abalou o órgão, a direção do IBGE voltou atrás e decidiu manter o calendário original da Pnad Contínua, nova pesquisa sobre mercado de trabalho em âmbito nacional.

    Os dados referentes ao emprego no primeiro trimestre de 2014 devem ser divulgados no dia 3 de junho.

    O pedido de informações de senadores e a contestação deles sobre as margens de erro discrepantes entre os Estados -o que poderia gerar contestações na Justiça- foram o estopim da crise. É que, após o pedido, Bivar e a maioria do conselho decidiram interromper as divulgações.

    A alegação era que não havia pessoal suficiente para rever o indicador de renda e preparar os dados coletados para a divulgação.

    O corpo técnico reagiu à decisão. Duas diretoras contrárias à decisão pediram exoneração e 18 coordenadores colocaram seus cargos à disposição.

    O grupo da área de emprego e rendimento se comprometeu a formular uma cronograma de trabalho para fazer os estudos sobre a renda e uma proposta para manter o calendário de divulgações, que estava suspenso até janeiro de 2015.

    Bivar considera ainda que a discussão se intensificou em torno da paralisação das divulgações e ganhou força –com repercussão na mídia e nos meios sindicais e políticos– pelo fato "de ter sido um ano eleitoral", o que "contou para essa avaliação [negativa]" da decisão.

    Ela faz referência a suposta ingerência política no instituto, já que a nova pesquisa, nacional, mostrou um patamar de desemprego mais elevado do que o levantamento antigo, restrito as seis maiores regiões metropolitanas do país.

    Veja, abaixo, os principais trechos da entrevista.

    *

    Folha - O que fez a senhora e o Conselho Diretor revisarem a decisão de suspender as divulgações?
    Bivar - Os trabalhos já vinham apontando que os dados do primeiro trimestre [da pesquisa] iriam ficar prontos dentro do que estava previsto. Hoje [nesta segunda], a Zélia Bianchini [diretora interina de Pesquisa] reafirmou e tirou todas as dúvidas de que eles estarão prontos [no prazo para a divulgação, no próximo dia 6].

    O IBGE é para divulgar informação. Uma informação que está pronta é para ser divulgada. Hoje [segunda], ela fez uma reunião preparatória para a reunião que haverá comigo e com o grupo de rendimento da Pnad Contínua amanhã [terça]. Esse grupo apresentou para a Zélia os estudos que estão sendo elaborados e o cronograma de trabalho para viabilizar o cumprimento da Lei do FPE [Fundo de Participação dos Estados, que determina o rendimento domiciliar per capita como um dos novos indicadores para repartição dos recursos]. A Zélia trouxe informações suficientes para que o conselho pudesse tomar uma decisão com segurança. E o conselho, diante desse nível de segurança à respeito do encaminhamento dos trabalhos, tomou logo hoje [segunda] a decisão [de voltar a trás e retomar as divulgações].

    Resolvemos tomar a decisão hoje no âmbito do conselho diretor, que tomou a decisão anterior de suspender a pesquisa.

    A reação de sindicatos, políticos e a repercussão na imprensa interferiram na decisão de retomar as divulgações?
    Eu não vou dizer para você que não teve nenhuma influência seria bobagem, mas o que conta realmente para a decisão do Conselho Diretor são fatos objetivos. Eles [conselheiros] sabem que respondem, inclusive legalmente, pela instituição. Se o IBGE deixa de cumprir uma lei, o conselho pode ser acionamento legalmente. Ele baseia suas decisões em questões muito objetivas, como a que o dado ficará pronto para divulgação no dia 3 de junho. Por que segurar? Seria absoluta tolice.

    Foi, então, uma decisão precipitada suspender a divulgação?
    O IBGE vem num processo de aceleração de aposentadorias e isso vem nos colocando em várias dificuldades. Tivemos de adiar a POF [Pesquisa de Orçamentos Domiciliares, de 2014 para 2015] e não consultamos a equipe técnica [assim como no caso da Pnad Contínua].

    Numa primeira avaliação, achamos que não teríamos recursos humanos em número suficiente [para tocar a pesquisa]. Desse modo, não foi precipitado, já que os estudos estão avançando e os dados estarão prontos. Precipitado no que diz respeito a quê? Esse grupo de rendimento [responsável por rever as margens de erro da pesquisa, uma contestação de senador que foi o estopim da crise] está sendo reforçado. Estão vindo pessoas de outras coordenações.

    Algum trabalho vai deixar de ser feito, mas não conseguimos visualizar ainda qual. A Coordenação das Contas Nacionais [PIB] está revendo a sua base [de dados] e colocou gente lá para colaborar nesse esforço. Algum impacto provavelmente existirá, mas não com a mesma visibilidade da suspensão da Pnad Contínua

    As margens de erro serão revistas? Os técnicos dizem que não há necessidade.
    Esse é um dos estudos que a equipe [de rendimento] está fazendo. Eles vão dizer se vai ser necessário um ajuste [a fim de equalizar as margens de erro entre os Estados para evitar contestações na Justiça] ou se o que já existe hoje é o melhor que uma pesquisa domiciliar por amostragem fornece. Não gostaria de prever nada. Gostaria de falar em cima do estudo realizado.

    O IBGE sai dessa crise com a imagem arranhada?
    É uma pena. Vou fazer sinceramente um desabafo. O IBGE é o mesmo que divulgou a maior inflação [em março] em 11 anos e que teve de retomar decisões muito difíceis sobre o seu cronograma de trabalho. O fato de ter sido um ano eleitoral contou para essa avaliação [negativa]. Teria sido uma avaliação geral muito mais ponderada e ouvindo um pouco melhor os argumentos da direção do IBGE do que se não fosse um ano de eleição. Acontece. Agora, temos de lembrar sempre que o nosso cronograma de trabalho tem de ocorrer independente da agenda política do país para o bem ou para o mal.

    Não podemos parar tudo porque é um ano eleitoral. Não acontece assim em países que têm maior maturidade. Sempre procurei ser transparente nas nossas fortalezas e nas nossas dificuldades. Eu obviamente assinalo que a principal [dificuldade] é a questão dos recursos humanos.

    O IBGE tem autonomia técnica?
    O IBGE tem autonomia técnica. Acabamos de ver uma enorme demonstração disso [a revisão da decisão de suspender a divulgação da Pnad Contínua].

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