• Mercado

    Friday, 03-May-2024 20:43:18 -03

    'A realidade aqui é outra', diz trabalhador haitiano resgatado em SP

    CLAUDIA ROLLI
    DE SÃO PAULO

    23/08/2014 02h00

    Há dois anos no Brasil, o haitiano Saintil Denold, 25, diz que deixou a oportunidade de ir trabalhar no Rio para ficar em São Paulo e ganhar cerca de R$ 1.500 como ajudante na oficina que foi alvo da fiscalização do Ministério do Trabalho no dia 5.

    "Ela [a dona da oficina] foi nos buscar no centro de migrantes, que funciona na pastoral. Prometeu moradia e comida, além do salário. Mas depois a realidade aqui foi outra", diz Denold, que, como não sabia costurar, era ajudante-geral e atuava como tradutor do grupo.

    Dez dos 12 trabalhadores estrangeiros haviam chegado havia pouco mais de dois meses ao Brasil e estavam abrigados na pastoral Missão da Paz, no centro de SP.

    "Quando ficamos sem salário, só com um vale que era muito pouco, paramos de trabalhar. A comida era fraca, depois ficou em um local fechado", diz o trabalhador.

    Apu Gomes/Folhapress
    O haitiano Saintil Denold, que trabalhava numa oficina de costura em São Paulo, em condições degradantes
    O haitiano Saintil Denold, que trabalhava numa oficina de costura em SP, em condições degradantes

    Denold chegou ao Brasil, pelo Acre, porta de entrada dos haitianos ao país, após passar por Lima (Peru), na tentativa de fazer faculdade de administração.

    "Não tinha emprego nem estudo. Como tinha um amigo no Brasil, decidi vir para cá, após pesquisar que havia muito emprego na internet."

    Filho de professores no Haiti, ele diz ter contado com a ajuda dos pais para comprar "frango e mistura" aos colegas da oficina.

    A fiscalização diz que alimentos deteriorados foram achados no imóvel.

    O grupo trabalhava no andar térreo e dividia acomodações improvisadas no andar de cima do imóvel. O ambiente tinha paredes mofadas, colchões rasgados e botijões de gás armazenados de forma inadequada que ofereciam risco de explosão, segundo os fiscais.

    Na quinta (dia 21), a reportagem esteve no local, mas não pode visitar o alojamento. A oficina estava sendo desmontada. A dona da oficina trancava os alimentos em um local de acesso restrito, segundo relataram dois trabalhadores. Sacos de arroz, feijão, café e macarrão foram encontrados escondidos no interior de um sofá, segundo fotos feitas pela fiscalização.

    Denold recebeu a primeira parcela da rescisão a que tem direito, paga pela atacadista que subcontratou a oficina. "Estou pensando no que fazer. Talvez volte ao Haiti."

    RESGATE

    Pela primeira vez no setor têxtil, uma fiscalização do grupo de combate ao trabalho escravo de São Paulo encontrou um grupo de 12 haitianos trabalhando de forma degradante em uma oficina de costura que prestava serviço para um atacadista do Bom Retiro, região central da capital paulista.

    Em ações anteriores, os fiscais localizaram trabalhadores bolivianos exercendo essa função em pequenas confecções e oficinas que costuravam peças para abastecer grandes redes varejistas ou lojas de grifes famosas.

    Um casal boliviano foi contratado pela confecção para ensinar os haitianos a costurarem. Os dois também cumpriam jornadas que chegavam a 15 horas, consideradas exaustivas, e eram submetido às mesmas condições de trabalho do grupo que veio refugiado do Haiti.

    O Brasil passou a receber levas de imigrantes do Haiti após o terremoto que devastou o país. Geralmente eles entram pelo Acre, e de lá se dirigem a outras regiões do país, como São Paulo.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024