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    Passageiros optam por avião, e trem noturno fica mais raro na Europa

    DO "GUARDIAN", EM BERLIM

    13/09/2014 02h00

    Para seus fãs, os trens noturnos resumem o que o projeto de integração europeia tem de melhor. São eficientes em termos de uso do tempo, ambientalmente sustentáveis e irresistivelmente românticos: você adormece em um país e acorda em outro, e existe sempre a possibilidade de fazer amigos no caminho.

    Em público, ao menos, os políticos e as ferrovias europeias concordam: em dezembro de 2009, muitos deles embarcaram cerimoniosamente em um "Expresso do Clima" equipado para uma viagem especial de Bruxelas à conferência de cúpula da ONU sobre o clima, em Copenhagen.

    Mas passados cinco anos, os trens-leito estão sendo silenciosamente tirados de serviço em todo o continente, em um momento no qual outros países do planeta estão modernizando seus serviços ferroviários.

    A Deutsche Bahn, que opera o sistema ferroviário alemão, confirmou este mês que seus trens-leito da City Night Line, percorrendo a rota do Expresso do Clima, teriam suas operações suspensas a partir de 1º de novembro, enquanto o trem noturno que conecta Paris a Berlim, Hamburgo e Munique suspenderá suas operações a partir de dezembro.

    Krisztian Bocsi/Bloomberg
    Estação ferroviária em Hamburgo, Alemanha; empresas tiram trem noturno de operação
    Estação ferroviária em Hamburgo, Alemanha; empresas tiram trem noturno de operação

    O trem noturno que conecta Amsterdã a Praga e Varsóvia terá seu percurso reduzido, de Colônia a Varsóvia e Praga.

    O Elipsos, o trem leito que ligava Paris a Barcelona e Madri –lançado em 1969 com tecnologias então inovadoras que permitiam que os mesmos vagões percorressem vias férreas de bitola diferente– foi desativado em
    dezembro.

    A Thello, uma joint venture entre a Trenitalia e a Transdev, de Paris, desativou em dezembro seu trem leito entre Roma e Paris, as duas capitais mais românticas da Europa.

    AVIAÇÃO

    Os passageiros da rota agora precisam fazer pelo menos uma baldeação no caminho, em geral em Turim ou Milão. Os serviços de Berlim a Varsóvia e Kiev, bem como o trem semanal Sibirjak, que ligava a Alemanha à Sibéria, também foram desativados recentemente.

    "A União Europeia professa estar investindo em serviços ferroviários", diz Mark Smith, responsável pelo Man on Seat 61, um blog premiado sobre ferrovias. "Mas na realidade, parece estar transferindo o tráfego às companhias de aviação".

    Os serviços ferroviários alemães invocam uma queda no número de passageiros, causada pela ascensão das companhias de aviação de baixo preço, como principal motivo para o cancelamento de serviços.

    Um porta-voz da Die Bahn disse que o número de passageiros nos trens leito da empresa caiu em 25% nos últimos cinco anos, e que suas três linhas noturnas menos lucrativas acumularam 12 milhões de euros de prejuízo no período.

    Julio Gomez-Pomar, presidente da estatal ferroviária espanhola Renfe, que opera trens de passageiros e carga, disse que alguns dos serviços noturnos de sua empresa foram cortados porque estavam circulando com vagões vazios.

    Um porta-voz da Trenitalia, que nos últimos anos reduziu o número de trens-leito entre o norte e o sul da Itália, afirmou que "nos últimos 10 anos aconteceu uma redução no número de trens noturnos, tanto em termos de recursos públicos reservados à sua operação quanto por conta da queda gradual em seu uso, que sofreu grande declínio relacionado ao surgimento de voos de baixo custo, concorrência de trens convencionais e o lançamento de redes ferroviárias de alta velocidade".

    Os trens leito são certamente mais caros de operar do que os trens diurnos. Para começar, acomodam menos passageiros: um vagão-leito típico transporta 36 pessoas, ante 70 em um vagão convencional.

    Além disso, desde 2000 os serviços ferroviários precisam pagar taxas de acesso a sistemas ferroviários, quando cruzam fronteiras, e há trabalho administrativo e negociações adicionais necessários para determinar o custo exato.

    SERVIÇOS

    Na Alemanha, as companhias ferroviárias se queixam, além disso, de que precisam arcar com impostos ambientais e com o imposto sobre valor adicionado que incide sobre as passagens, e do qual as companhias de aviação estão isentas.

    No entanto, ativistas, muitos dos quais usam os trens-leito porque preferem não voar, por motivos ambientais ou de saúde, alegam que as queixas das operadoras de ferrovias sobre a queda no número de passageiros na verdade são consequência de suas atitudes quanto a esses serviços.

    Porque as companhias deixaram por anos de investir em vagões mais confortáveis, as viagens em trens-leito perderam seus atrativos, para muitas pessoas. Quando o trem-leito de Paris a Berlim foi lançado, em 2000, tinha um carro restaurante e um chef de cozinha à bordo. Hoje em dia, os passageiros só podem comprar refeições aquecidas em micro-ondas, que precisam comer em seus lugares.

    Enquanto passagens aéreas baratas podem ser compradas com meses de antecedência, os horários dos trens noturnos muitas vezes são alterados com pouco aviso, devido a trabalhos de manutenção repentinos.

    DIURNOS

    A Loco2, uma agência britânica de reserva de passagens ferroviárias para toda a Europa, diz que existe considerável demanda por trens-leito, mas que a Deutsche Bahn só lhe permite vender passagens para os serviços diurnos.

    "Não existe base para o argumento de que os trens-leito, em si, estão defasados", diz o blogueiro John Worth, criador de uma petição pela preservação do trem leito para Copenhagen. O Reino Unido anunciou melhorias em seu serviço Caledonian (o trem-leito para a Escócia) e no Londres-Penzance (rota noturna para a costa sudoeste da Inglaterra), enquanto China e Rússia investem em novos vagões para serviços noturnos, ele aponta.

    "As ferrovias continuam a ser o modo mais ambientalmente sustentável e mais confortável de viajar pela Europa. Você não deve esperar que as pessoas passem seu dia em um trem - mas pode esperar que queiram passar uma noite", disse ele.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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