• Mercado

    Saturday, 27-Apr-2024 22:28:14 -03

    Onda politicamente correta matou a liberdade criativa, diz Olivetto

    MARIANA BARBOSA
    DE SÃO PAULO

    17/09/2014 02h00

    Algumas campanhas publicitárias lendárias, como a da menina de 12 anos que veste seu primeiro sutiã - "o que não se esquece"-, hoje seriam inimagináveis, avalia o criador do filme, o publicitário Washington Olivetto.

    "Seria impensável mostrar esse filme com a Patrícia Luchesi, um comercial com música clássica e uma menina descobrindo o gesto de ser mulher", disse Olivetto, 62, na última segunda (15) no Arena do Marketing, evento organizado pela Folha em parceria com a ESPM.

    Para o publicitário, o pensamento politicamente correto "acabou com a alegria da liberdade criativa.

    "Você tem de um lado o cara politicamente correto, que é cerceador e bem educadinho. E do outro o incorreto, que é mal educado e pseudo-divertido. Temos que buscar o que é politicamente saudável, que respeita a inteligência, mas com irreverência e bom humor. Há coisas que não são ofensivas, mas fazem pensar."

    Para Olivetto, o humor brasileiro vive "uma crise de vulgaridade". "É um humor que tenta gargalhar, mas não sabe fazer sorrir."

    Raquel Cunha/Folhapress
    O publicitário Washington Olivetto durante o Arena do Marketing, na ESPM, em SP
    O publicitário Washington Olivetto durante o Arena do Marketing, na ESPM, em SP

    Emmanuel Publio Dias, professor da ESPM que também participou do bate-papo mediado pela jornalista da Folha Anna Virginia Balloussier, lembrou de outro clássico de Olivetto que hoje seria alvo de ataques politicamente corretos: os amortecedores Cofap, com cães da raça Dachhund. "Este seria barrado pelas associações de protetores de animais."

    Os dois comerciais e outros de Olivetto, como a série da Bombril com o ator Carlos Moreno, traduzem o que o publicitário diz ter sido sua ambição maior quando escolheu virar publicitário, nos anos 70: fazer uma publicidade que cai no gosto popular e que se propaga pelo velho boca a boca. "Eu queria entrar para o imaginário popular e, com isso, transformar o consumidor em mídia. Hoje isso é óbvio, mas na época foi intuitivo. Porque esse negócio de rede social já existia, mas sem a tecnologia. As vovozinhas conversando na rua formavam uma rede social."

    Um dos publicitários mais premiados do país e do mundo, com mais de 50 leões no Festival de Publicidade de Cannes, Olivetto fez uma crítica ao atual momento da área - na sua visão, prejudicada pelo excesso de possibilidades de formatos.

    "As possibilidades de formas aumentaram muito, mas as formas estão sendo usadas para esconder a falta de conteúdo. A tecnologia permite fazer qualquer coisa, mas o fundamental é o conteúdo. As pessoas precisam saber escrever melhor", disse o publicitário, que contou ter aprendido a ler muito cedo.

    Falando para uma plateia formada principalmente por estudantes de publicidade, Olivetto comentou ainda sobre a rotina de trabalho nas agências. "Prefiro quem trabalha com tesão do que com tensão. Mas a cultura da tensão se instaurou."

    Para ele, apesar de hoje haver "mais gente comendo pizza no trabalho na sexta-feira à noite", isso não resultou em uma publicidade melhor.

    Ao contrário.

    "Isso é em todas as empresas, não só na publicidade. Há uma cultura de que o profissional não pode ter vida pessoal. Conviver com pessoas de outras áreas e se realimentar com a vida são fundamentais."

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024