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    Minha história: Congelamento de poupanças quase faliu empresária

    BÁRBARA LIBÓRIO
    DE SÃO PAULO

    21/09/2014 02h00

    Do confisco da poupança por Fernando Collor em 1990 à crise global de 2008, passando pela atual recessão técnica enfrentada pelo Brasil e pela bolha da internet que estourou em 2000, seis pequenos empresários de diversos setores contam como enfrentaram seus momentos mais difíceis, o que aprenderam e quais os seus maiores arrependimentos.

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    Iramaia Kotschedoff, 59, organizava viagens de empresários brasileiros para feiras na Alemanha. Quando Collor congelou as poupanças, seus clientes não tinham dinheiro nem para as passagens -mas ela tinha milhares de dólares em contratos fechados naquele país.

    Divulgação
    Iramaia Kotschedoff, 59, empresária que trabalhava com viagens, e seu marido, Manfred
    Iramaia Kotschedoff, 59, empresária que trabalhava com viagens, e seu marido, Manfred

    Em depoimento à Folha, ela conta sua história.

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    Em 1978, comecei a trabalhar como freelancer, divulgando feiras empresariais da Alemanha no Brasil. Depois, comecei a trabalhar na companhia aérea Lufthansa.

    Nesse meio tempo, conheci um alemão, me casei e me mudei para a Alemanha de vez. Foi quando surgiu a proposta de assessorar os clientes empresariais da Lufthansa que viajavam para o país.

    No começo, era só um hobby, mas crescemos tanto que, em 1989, me vi obrigada a criar uma empresa para fazer esse trabalho. Eu fazia questão de atender apenas empresários brasileiros. Na época, recusei a proposta da Lufthansa de continuar atendendo clientes do mundo todo.

    O trabalho consistia em fazer a intermediação entre os empresários e as casas de famílias em que eles se hospedariam durante os eventos. Era o que hoje chamamos de "bed and breakfast".

    Em 1990, estávamos organizando a chegada de executivos que viriam para a Drupa, principal feira da indústria da mídia impressa da Europa. As hospedagens foram reservadas com antecedência. Eram contratos de 165 mil marcos alemães (cerca de US$ 170 mil, em valores atuais).

    Quatro semanas antes do evento, o presidente Fernando Collor congelou as poupanças dos brasileiros. Os executivos começaram a me ligar desesperados. O dinheiro que tinha restado, diziam, não dava nem para a passagem.

    Entrei em contato com as famílias com as quais eu já tinha acordado, mas elas não deram folga. Mandei cópias dos jornais noticiando a situação no Brasil. Mas elas diziam que não tinham nada a ver com isso, que contrato assinado não tinha volta.

    A empresa ia falir. Passei noites sem dormir direito. Eu teria que vender meu apartamento e pedir ajuda ao meu marido. Nós nunca misturamos nossos negócios. Enquanto me cobravam o dinheiro, tentei encontrar uma maneira de mudar a situação.

    Liguei para a Lufthansa e anunciei: a partir daquele dia atenderia empresários de todo o mundo, e não apenas os brasileiros. Escrevi para as câmaras de comércio da Alemanha no mundo inteiro oferecendo hospedagens.
    Eu tinha reservas de casas que ficavam a 300 metros do local do evento. Na época, todos os hotéis já estavam lotados. Os executivos acharam que era um milagre. Revendi todas as hospedagens. Não tive prejuízo e fiquei conhecida internacionalmente.

    Lembrei de uma frase que li na primeira vez que vim à Alemanha: "É nas quedas que o rio fornece energia". Eu queria continuar no mercado e não podia sujar meu nome na Alemanha. Enfrentei.
    Na ocasião, também percebi o quanto meus contratos estavam defasados. Não havia uma cláusula que me protegesse caso precisasse desistir das reservas. Chamei advogados e mudamos isso. Hoje posso desistir até quatro semanas antes da data acordada.

    Até hoje atendo empresários de todo o mundo. Como hoje em dia, com a internet, a intermediação do "bed and breakfast" diminuiu, começamos a oferecer consultoria para executivos que querem abrir um negócio na Alemanha.

    Ter humildade foi essencial para superar aquela crise. Voltei atrás na decisão de atender apenas brasileiros e reconheci que o modelo de contrato antigo podia me prejudicar.

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    O QUE LEVOU À CRISE

    Ainda na luta contra a inflação, Collor e sua equipe diagnosticaram que um jeito de vencê-la seria reduzir a quantidade de dinheiro em circulação -quando mais moeda disponível, menos ela vale. O confisco das poupanças, porém, além de deixar milhões de brasileiros desesperados e de jogar o país na recessão, tinha várias brechas que o tornaram ineficaz

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