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    Mais mulheres se destacam como criadoras de empresas

    SARAH MISHKIN
    DO "FINANCIAL TIMES"

    10/10/2014 02h00

    Michelle Lam foi executiva de capital para empreendimentos e vice-presidente de finanças de uma empresa de dados adquirida pela Securities and Exchange Commission (SEC), a agência que regulamenta o mercado de valores mobiliários dos Estados Unidos.

    Agora, criou uma start-up, que opera de um escritório em um bairro da moda em San Francisco e cujas paredes exibem amostras da lingerie sensual mas sensata –principalmente sutiãs– que a empresa, True & Co, cria e vende on-line.

    Lam lançou a True & Co em 2012, depois de uma expedição frustrante de compras. Percebeu que poderia usar sua experiência de gestão e análise de dados, e suas percepções sobre os problemas que as mulheres encontram ao fazer compras, para criar uma empresa.

    Reprodução
    Michelle Lam (dir.), co-fundadora da True & Co
    Michelle Lam (dir.), da start-up True & Co; mais mulheres se destacam como criadoras de empresas

    Analisando dados sobre a porcentagem de produtos devolvidos e as reações dos consumidores, e usando essas informações para alterar designs e lançar produtos rapidamente, ela diz que a True & Co é capaz de produzir roupas mais adaptadas às usuárias.

    As mulheres criadoras de start-ups continuam a ser minoria, mas Lam, que foi a primeira mulher a se tornar sócia executiva na Bain Capital Ventures, é parte do crescente número de empreendedoras do Vale do Silício que se dedicam ao comércio eletrônico.

    "Estamos em um momento da história no qual existem mulheres experientes e com a formação que o setor de capital para empreendimentos procura –e o poder de observação sobre como ocupar um espaço que caracteriza um bom empreendedor", diz Anna Zornosa, fundadora da Ruby Ribbon, uma companhia de comércio eletrônico de roupas.

    INVESTIDORES

    Catorze por cento do capital para empreendimentos concedido este ano nos Estados Unidos foi destinado a empresas fundadas ou co-fundadas por mulheres, mas a proporção é mais alta no ramo do comércio eletrônico, e continua a crescer rapidamente, de acordo com a PitchBook, uma companhia que pesquisa o mercado de capital para empreendimentos e capital privado.

    Entre as empresas de comércio eletrônico, quase 40% das start-ups que obtiveram apoio do setor de capital para empreendimentos foram fundadas ou co-fundadas por mulheres, de acordo com a PitchBook. Isso se compara a menos de 20% em 2009.

    Muitos investidores encontram dificuldade para operar do modo certo no comércio eletrônico. As start-ups do segmento precisam dominar não só a tecnologia mas a logística, o que inclui cadeias de suprimento multinacionais, gestão de estoques e marketing junto aos consumidores.

    Mas o comércio eletrônico é atraente para alguns empreendedores e investidores exatamente por que as dificuldades significam menor concorrência e mais espaço para expansão.

    A despeito dos esforços da Amazon, eBay e outros, menos de 10% do comércio de varejo dos Estados Unidos acontecem on-line. Isso faz com que empreendedores corram para tentar descobrir como vender on-line o tipo de bem que as pessoas até agora preferem primordialmente comprar off-line.

    Entre as categorias mais persistentemente difíceis estão a beleza e moda feminina, exatamente os segmentos em que muitas das mulheres criadoras de empresas optaram por operar.

    Verificar se uma roupa serve, a qualidade do produto e sua cor exata são fatores muito importantes, mas que é difícil realizar virtualmente. Muitas dessas novas empresas estão tentando desenvolver modelos de negócios que possam convencer as compradoras a se sentirem mais confortáveis em adquirir esse tipo de produto on-line, uma área na qual as mulheres fundadoras, muitas das quais não são engenheiras, estão tentando inovar.

    "Não quero parecer petulante, mas os grupos de capital para empreendimentos em geral querem bancar fundadores que conheçam alguma coisa sobre o produto", diz Amy Errett, que trabalhou no ramo de capital para empreendimentos e agora fundou uma companhia que vende tintura para cabelo.

    Errett diz que sua inspiração para a Madison Reed, a companhia que ela criou, veio do corredor de produtos de tintura de uma drogaria, quando ela percebeu o quanto o design dos produtos era ruim.

    A companhia dela está experimentando com o uso da tecnologia para a venda de tinturas de cabelo de uso doméstico. A start-up, que obteve US$ 12 milhões em capital do setor de capital para empreendimentos este ano, vende principalmente para mulheres que desejam ocultar cabelos grisalhos. Errett, que já passou dos 50 anos, usa cabelos loiros bem curtos acompanhados por óculos coloridos e de armações grossas.

    Já que cores muitas vezes não são exibidas de modo correto na tela e as mulheres ocasionalmente se sentem inseguras sobre como usar a tintura, a companhia criou uma central telefônica na qual cabeleireiros oferecem conselhos sobre cores e aplicação, e está experimentando recursos para seu app que permitiriam que uma usuária gravasse um vídeo mostrando a cor de seu cabelo a fim de obter conselhos sobre que tintura escolher.

    DIFICULDADES

    Ainda que o investimento em companhias estabelecidas por mulheres tenha crescido, levantar fundos junto aos investidores, em sua maioria homens, especialmente para marcas dirigidas primordialmente às consumidoras, tem suas frustrações. Na pior das hipóteses, as empreendedoras podem enfrentar assédio ou propostas inapropriadas.

    O mais comum, porém, é que o percalço seja o de que os investidores homens "sentem não ter valor a adicionar ao negócio porque não têm conhecimento sobre aquela área como consumidores", diz Doreen Bloch, fundadora da Poshly, uma companhia de análise de dados de consumo cuja especialidade são os cosméticos.

    Errett disse que alguns dos investidores a quem apresentou sua ideia confessaram tanto que tingiam o cabelo quanto que não sabiam de que maneira mulheres de meia-idade usam tintura de cabelo.

    Ex-executiva sênior da E! Trade, uma corretora on-line de valores, e ex-sócia executiva da Maveron, uma companhia de capital para empreendimentos, Errett se viu forçada a explicar a colegas e amigos céticos por que ela havia optado por operar em um nicho de mercado que eles viam como humilde, com muito menos perspectivas de crescimento do que outros setores que estão decolando no Vale do Silício. "Todo mundo parecia achar absurda a ideia de trabalhar com tintura de cabelo", conta Errett, recordando o desdém de seus contatos.

    Jane Park, fundadora da Julep, que produz e vende esmalte de unhas, diz que alguns investidores não compreendem a coisa ao perguntar com que velocidade as mulheres usam um vidro de esmalte, e qual seria, assim, o ritmo de substituição.

    "Não é como pasta de dente", Park, ex-executiva da Starbucks e do Boston Consulting Group, explicava a eles. "É um produto de moda".

    Ela tinha de se estender nas suas explicações sobre os motivos para que o setor de beleza fosse um bom destino para o capital de empreendimento, no comércio eletrônico.

    "Em minha opinião, os temores que eles demonstravam eram desnecessários", afirma. "Eu dizia que a oportunidade era grande, a margem generosa, e que existem oportunidades interessantes para agir on-line –bastaria uma hora de pesquisa para compreender o ponto".

    Em abril, a Julep anunciou capitalização de US$ 30 milhões por investidores como a Andreessen Horowitz, do Vale do Silício. Parte do motivo para o crescimento no número de empresas criadas por mulheres, diz Zornosa, é que existem mais mulheres com experiência no setor de tecnologia, agora –ainda que esse número ainda seja baixo, especialmente nas áreas técnica e de engenharia.

    A companhia de comércio on-line de roupas que ela criou equipa as vendedoras com apps e as treina em redes sociais, para que possam atingir mais clientes potenciais. No caso, ela está combinando sua experiência em marketing digital e no Yahoo com as técnicas desenvolvidas ao longo das décadas por empresas de venda direta como a Avon.

    Na True & Co, Lam diz que ter experiência no ramo da tecnologia permitiu que ela conquistasse investidores céticos ou desconhecedores do produto.

    Desde o lançamento da companhia, em 2012, ela arrecadou mais de US$ 6 milhões em capital junto ao setor de capital para empreendimentos. Os anos que ela passou nos setores de finanças e tecnologia significam, diz Lam, que "posso entrar em uma sala em que 10 homens estejam me esperando e responder a 20 perguntas diferentes sobre os motivos para sutiãs sejam um bom negócio".

    TOLERÂNCIA ZERO

    À medida que as mulheres com ambições no ramo da tecnologia começam a procurar investidores com mais frequência, descobrem que alguns deles estão agindo menos que profissionalmente.

    Na Y Combinator, uma das mais prestigiosas incubadoras de start-ups do Vale do Silício, uma dos sócias da incubadora, durante a preparação para um grande evento no mês passado, postou no blog da organização sobre a etiqueta dos investidores. "Gostaria de deixar o seguinte muito claro: a Y Combinator tem tolerância zero quanto a comportamento sexual ou romântico inapropriado da parte dos investidores para com os fundadores", escreveu Jessica Livinsgton.

    A declaração pode parecer extraordinária –mas não para diversas mulheres do setor, algumas das quais começaram a se pronunciar sobre assédio.

    O tópico das propostas indesejáveis dos investidores vem sendo ferozmente debatido no Vale do Silício. Algumas mulheres fundadoras de empresas publicaram depoimentos anônimos detalhados nas revistas "Forbes" e "Wired", relatando como foram alvo de cantadas.

    Uma funcionária de uma start-up expôs nominalmente um investidor e frequente mentor em uma incubadora de start-ups, que enviou um e-mail a ela convidando-a dormir com ele, depois que se encontraram em um evento social. O investidor primeiro alegou que sua conta de e-mail havia sido hackeada, e depois pediu desculpas. Muitas das incubadoras de tecnologia com as quais ele trabalhava romperam publicamente relações com ele.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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