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    Análise: Crise atual exige tratamentos incomuns

    MARTIN WOLF
    DO "FINANCIAL TIMES"

    27/11/2014 02h00

    As principais economias de alta renda –EUA, zona do euro, Japão e Reino Unido– vêm sofrendo de "síndrome de deficiência crônica de demanda". Seus setores privados não estão gastando o bastante para deixar a produção perto de seu potencial, ao menos não sem o incentivo de políticas monetárias ultra-agressivas, grandes deficits fiscais, ou as duas coisas.

    A síndrome da deficiência de demanda aflige o Japão desde o começo dos anos 1990, e as demais economias pelo menos desde 2008. O que se pode fazer sobre isso? A resposta: é preciso compreender a enfermidade.

    Crises são infartos do sistema financeiro. O papel do médico econômico é manter o paciente vivo: prevenir o colapso do sistema financeiro e sustentar a demanda.

    Um ataque cardíaco não é hora de se preocupar com o estilo de vida do paciente. O necessário é mantê-lo vivo.

    E crises financeiras têm efeitos duradouros, por causa do dano ao setor financeiro em si, da perda de confiança no futuro e do fato de que isso torna a dívida acumulada no período que antecedeu a crise insustentável.

    O que acontece, então, é uma "recessão de balanço" -os endividados se concentram em pagar suas dívidas.

    Existem, porém, possibilidades ainda mais perturbadoras do que sobrecargas de dívidas. Em meu livro, "The Shifts and the Shocks", sugiro que algumas das mudanças na economia mundial criaram uma demanda cronicamente fraca, na ausência de booms de crédito.

    Entre essas mudanças estão o excesso de poupança nos emergentes; e mudanças na distribuição de renda, envelhecimento e um declínio secular na propensão a investir, nos países de alta renda.

    Por trás das mudanças estão a globalização, a inovação tecnológica e o papel crescente do setor financeiro.

    Não basta limpar os estragos causados pelo colapso do boom de crédito. As autoridades econômicas precisam eliminar a dependência da demanda quanto a um nível insustentável de crédito.

    Existem três grandes alternativas: conviver com a fraqueza crônica na demanda; conduzir políticas agressivas de promoção de demanda por prazo indefinido (como fez o Japão); ou resolver os problemas estruturais subjacentes da demanda.

    Para além dos males pós-crise e da demanda persistentemente fraca, temos a possibilidade de oferta estruturalmente fraca. A solução é encorajar o trabalho, investimento e inovação.

    Mas políticas concebidas para promover a oferta não devem simultaneamente enfraquecer a demanda.

    A crise deixou um legado tétrico. A zona do euro trabalhou pior para enfrentá-la do que, digamos, os EUA.

    Mas as origens da crise estão em fraquezas estruturais de longo prazo.

    A política econômica precisa tratar dessas falhas, também, se não quer que a saída seja o começo da jornada para a próxima crise.

    É provável que as respostas sejam heterodoxas. Mas as condições econômicas atuais também o são.

    Doenças raras precisam de tratamentos incomuns. É preciso encontrá-los.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    MARTIN WOLF é comentarista-chefe de economia no "Financial Times"

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