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    Análise: Com uma palavra, Levy muda enfoque fiscal

    GUSTAVO PATU
    DE BRASÍLIA

    28/11/2014 02h00

    No que pode dar a impressão de ser apenas um detalhe técnico, o futuro ministro Joaquim Levy indicou a mais importante mudança de orientação da política fiscal.

    Segundo foi anunciado, as metas fixadas para o saldo das contas do governo, de agora em diante, levarão em conta o objetivo de conter o avanço da dívida pública -e a novidade está na próxima palavra- bruta.

    Desde 1999, quando foi iniciada a política de metas para a poupança de União, Estados e municípios, o indicador adotado era o controle da dívida pública líquida.

    A simples troca de adjetivos significa o sepultamento de boa parte das manobras criadas pela administração petista para expandir gastos driblando a contabilidade.

    Basta notar que, ao longo do primeiro mandato de Dilma Rousseff, a despeito da deterioração contínua dos resultados do Tesouro Nacional, a dívida líquida caiu do equivalente a 39,2% do PIB (Produto Interno Bruto, a renda do país) para 35,9%.

    No mesmo período, do início de 2011 até setembro deste ano, a dívida bruta saltou de 53,4% para 61,7% do PIB.

    Não por acaso, a dívida líquida -cujo cálculo desconta os valores que o governo tem a receber, como as reservas em dólar aplicadas pelo Banco Central no exterior- perdeu credibilidade nos mercados doméstico e internacional como termômetro da solidez fiscal brasileira.

    Editoria de Arte/Folhapress

    SEM TRANSPARÊNCIA

    As peculiaridades da apuração da dívida líquida deram à administração petista a oportunidade de criar despesas, sem transparência orçamentária, em operações com bancos públicos, em especial o BNDES.

    Desde 2009, o Tesouro se endivida no mercado para injetar dinheiro em seu banco de fomento, que utiliza os recursos para financiar empresas a taxas favorecidas.

    Os títulos federais emitidos nessas transações não são contabilizados na dívida líquida, porque o BNDES, teoricamente, pagará de volta o dinheiro recebido -a dívida do banco com o Tesouro já soma nada menos que R$ 455 bilhões, ou 9% do PIB.

    Sem a interrupção desse programa de estímulo aos investimentos, as metas de poupança anunciadas por Levy, de 1,2% a 2% do PIB, serão insuficientes para deter a escalada da dívida bruta.

    MITOS DE DILMA

    Além de frear o intervencionismo estatal, o uso da dívida bruta como referência tem o potencial de derrubar mitos propagados por Dilma na campanha reeleitoral.

    "O Brasil tem uma das menores dívidas líquidas sobre Produto Interno Bruto do mundo", disse a presidente em setembro, quando, ainda candidata, negava a necessidade de um "choque fiscal" no próximo ano.

    Nas estatísticas do FMI (Fundo Monetário Internacional) atualizadas no mês passado, apenas 99 países apresentam dados sobre dívida líquida, um conceito pouco utilizado na finança global.

    O Brasil ocupa uma posição intermediária no grupo.

    Para a dívida bruta, há informações sobre 181 países. A brasileira está abaixo do padrão dos países ricos, que dispõem de mais crédito, mas é a maior entre os principais países emergentes.

    O cálculo da dívida bruta é motivo de divergência entre o país e o Fundo -que inclui na conta títulos utilizados pelo Banco Central na política monetária (para o controle do volume de dinheiro na economia), elevando o montante a 65% do PIB.

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