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    Vale é autuada por manter pessoas em condição análoga à de escravo

    JOÃO CARLOS MAGALHÃES
    DE BRASÍLIA

    16/03/2015 12h33

    A Vale, uma das maiores mineradoras do mundo, foi autuada pelo governo federal por reduzir pessoas à condição análoga à de escravo.

    A autuação, realizada após ação conjunta do Ministério do Trabalho, Ministério Público do Trabalho e Polícia Federal, ocorreu na primeira semana de fevereiro, em um centro de operação da empresa na região de Itabirito (MG). A empresa nega irregularidades (leia mais abaixo).

    Os fiscais concluíram que a multinacional era responsável pelas condições degradantes e pela jornada de trabalho exaustiva impostas a trabalhadores contratados por outra empresa para dirigir caminhões carregados com minério de ferro entre duas minas de minério de ferro da empresa.

    Para os fiscais, a Vale deveria ser responsabilizada pelas irregularidades pois os trabalhadores estavam envolvidos com a atividade-fim da mineradora, cuja terceirização é ilegal.

    A operação encontrou 411 motoristas da terceirizada. Destes, 309 foram consideradas como em situação análoga à escravidão. No total, foram lavrados 32 autos de infração, para dar conta de todos os problemas identificados.

    Segundo os fiscais, o banheiro usado por eles nunca havia sido limpo. "Não se conseguia respirar ali dentro. Era merda por todo o lugar", disse à Folha Marcelo Campos, auditor do Ministério do Trabalho que comandou a operação.

    Contribuíram para a qualificação das condições degradantes a falta de água potável e de locais para tomar banho – devido à natureza do trabalho, os motoristas tinham de voltar para casa imundos.

    Além disso, explicou Campos, a empresa terceirizada havia incentivado os motoristas a trabalhar mais em troca de prêmios, como moto, aparelhos de televisão, e extras financeiros.

    Os motoristas passaram então a cumprir maiores jornadas de trabalho, consideradas excessivas pelos fiscais. Já a promessa de recompensas não foi cumprida, aferiu a fiscalização.

    Segundo o artigo 149 do Código Penal, o trabalho escravo pode ser caracterizado tanto pela jornada exaustiva quanto pela existência de condições degradantes de trabalho.

    Agora, a Vale poderá recorrer por duas vezes junto ao Ministério do Trabalho para alterar as conclusões dos auditores. Depois, ainda poderá entrar com ação na Justiça.

    OUTRO LADO

    Em nota, a Vale negou "qualquer irregularidade" nas operações em Itabirito e afirma que tantos os seus contratados quanto seus terceirizados têm "condições adequadas" de trabalho.

    "A Vale nega que haja qualquer irregularidade relacionada a condições de trabalho na mina do Pico [na região de Itabirito]", diz a nota.

    "É importante ressaltar que as instalações da Vale têm condições adequadas de segurança e conforto para seus trabalhadores, sejam próprios ou terceirizados. A Vale repudia toda e qualquer atividade que envolva condições inadequadas de trabalho e reitera o seu compromisso com o cumprimento das normas e leis vigentes de saúde e segurança do trabalhador."

    Segundo a narrativa da empresa, "no fim do mês de janeiro, alguns empregados da Ouro Verde [nome da empresa terceirizada] praticaram atos de vandalismo no local, com depredação do canteiro de obras, ameaça à segurança de gestores e tentativa de incêndio de alguns veículos".

    Após esses eventos, diz a nota, "o canteiro foi inspecionado pelo Ministério do Trabalho, que identificou a necessidade de adequações relacionadas à legislação de saúde e segurança".

    "Todas as medidas determinadas pela fiscalização foram implantadas. Três dias depois, o Ministério do Trabalho retornou ao canteiro de obras, constatou que todas as ações tinham sido executadas e, por isto, liberou novamente a área para operação."

    Nesta terça (17), a Ouro Verde enviou nota à reportagem em que afirma que "já regularizou todas as inconformidades registradas pela fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego na Mina do Pico, em Minas Gerais".

    A empresa diz ainda que todas as solicitações foram atendidas "no prazo de 48 horas, com o reinício regular das operações no local".

    A companhia afirma ainda que "o controle das horas trabalhadas ficou comprometido por problemas no relógio ponto, que foi ajustado e a situação regularizada". E destaca que "sobre as condições de limpeza no local, a situação também foi solucionada com a contratação de pessoal para a serventia".

    Na nota, a Ouro Verde também "lamenta que os problemas pontuais na operação tenham gerado atos de vandalismo por parte de alguns colaboradores, com prejuízos materiais no canteiro de obras e ameaças à integridade física dos gestores locais".

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