• Mercado

    Tuesday, 07-May-2024 01:47:34 -03

    Australiano reinventa coleta de mel e bate recorde de arrecadação

    CLAIRE MARTIN
    DO "NEW YORK TIMES"

    19/07/2015 02h00

    Cedar Anderson às vezes despeja um vidro inteiro de mel sobre sua comida. "Há pessoas que me chamam de ursinho Pooh", ele diz.

    Para alimentar seu hábito, Anderson, 35, cria abelhas no quintal de sua casa em Broken Head, uma aldeia na costa leste da Austrália, perto de Byron Bay, em Nova Gales do Sul. Ele vem de uma família que cria abelhas como hobby.

    Há 10 anos, ele ficou impaciente com os métodos tradicionais de extração de mel, que requerem muito trabalho braçal. Em um galpão em seu quintal, ele e seu pai Stuart inventaram um esquema alternativo chamado Flow Hive, e este ano começaram a vender o aparelho.

    As abelhas domesticadas vivem em colmeias artificiais - caixas contendo molduras de madeira e favos de mel. As abelhas enchem os favos e os selam com cera. Tradicionalmente, para verificar o progresso das abelhas, os apicultores vestem trajes protetores, usam fumaça para sedar as abelhas e removem as molduras. Quando chega a hora da coleta, eles removem os tampões de cera, colocam as molduras em um extrator e filtram a cera e as abelhas mortas.

    "Você fica todo suado. Levanta caixas pesadas. E se a colmeia é ranzinza, como muitas das minhas são, as abelhas o picam mesmo que você esteja com o traje protetor", disse Anderson.

    Outro notável risco: as abelhas "tentam subir pelas pernas" do traje, segundo Anderson.

    Para lidar com isso, ele e o pai encontraram outra forma de chegar ao mel, que segundo eles é muito mais fácil. As molduras em sua Flow Hive contêm células de favo feitas de plástico, além de cera, e elas se abrem quando o apicultor insere uma chave na lateral da colmeia.

    Fred McKie/The New York Times
    Jarro de mel coletado pelo sistema inventado pelo australiano Cedar Anderson
    Jarro de mel coletado pelo sistema inventado pelo australiano Cedar Anderson

    O mel é escoado por meio de um tubo curto, e a colmeia tem um painel de plástico transparente que permite que o apicultor acompanhe o nível de mel acumulado.

    "Você pode ver as línguas das abelhas depositando o mel", disse Anderson.

    As abelhas, ele acrescenta, não são afetadas quando os apicultores removem o mel. "Elas nem mesmo percebem, para começar", ele disse.

    Para iniciar a produção, os Anderson necessitavam pelo menos US$ 70 mil (R$ 220 mil). Em fevereiro, a companhia deles começou a oferecer colmeias e molduras para favos, sem abelhas, para pré-encomenda no site de crowdfunding Indiegogo. Uma colmeia com seis molduras custa US$ 600 (R$ 1.890).

    Apenas sete segundos depois que a campanha do Indiegogo começou, os Anderson atingiram sua meta de US$ 70 mil. Em um dia, eles tinham US$ 2,18 milhões (R$ 6,86 milhões) em pré-encomendas. E no final da campanha, tinham vendido US$ 12,2 milhões (R$ 38 milhões) em molduras e colmeias, o que estabeleceu um recorde de arrecadação para uma campanha do Indiegogo, disse Slava Rubin, presidente-executivo da Indiegogo.

    Plataformas de crowdfunding se tornaram uma meio de contornar os canais tradicionais de financiamento, mas as grandes histórias de sucesso tipicamente envolvem produtos tecnológicos, videogames e filmes. Já o Flow Hive não é um produto de alta tecnologia. Em lugar disso, é uma nova maneira de realizar uma tarefa antiga e laboriosa.

    Seth Godin, que escreveu livros sobre marketing e a difusão de ideias, disse em entrevista que os empreendedores que encontram sucesso com o crowdfunding em geral seguem um de dois padrões. "São pessoas que constroem uma tribo, e apelam a ela quando precisam fazer algo coletivo", ele disse.

    Fred McKie/The New York Times
    Cedar Anderson manuseia uma parte do Flow Hive, sistema de coleta de mel que criou
    Cedar Anderson manuseia uma parte do Flow Hive, sistema de coleta de mel que criou

    Outra abordagem é persuadir as massas de que uma inovação desmontará completamente o status quo - de que o produto produzirá um pouquinho de "magia", disse Godin. Os Anderson realizaram essa façanha ao convencer as pessoas de que seu produto era transformador, ele disse.

    "Isso lhes valeu o primeiro milhão de dólares", disse Godin. "E de lá, você consegue os outros US$ 11 milhões porque pessoas falam umas com as outras, e o projeto ganha credibilidade por ser tão grande".

    Cerca de 60% das pré-encomendas do Flow Hive vieram dos Estados Unidos, onde a tendência do faça você mesmo e a busca de sustentabilidade geraram legiões de criadores artesanais de galinhas, produtores domésticos de picles e fabricantes caseiros de cerveja. A campanha do Flow Hive no Indiegogo também atraiu compradores de outros 150 países e territórios, disse Rubin.

    "O mel é um conceito aceito por todos", ele disse. "É como se todo mundo entendesse a ideia de imediato".

    A invenção dos Anderson não foi recebida com apoio unânime."Estou preocupado por ela ser vendida a potenciais apicultores que na verdade não compreendem todos os problemas e dificuldades associados à apicultura", diz Rusty Burlew, diretora da Native Bee Conservancy, sediada no Estado de Washington, e apicultora amadora que cuida de uma dúzia de colmeias.

    Entre os obstáculos está a necessidade de verificar as colmeias em busca de insetos e vírus pelo menos duas vezes por mês, na primavera e outono - tarefa que requereria abrir a Flow Hive e remover as abelhas, ela disse.

    Burlew também questiona a necessidade de um método mais fácil de coletar o mel. Ela reconhece que criar abelhas pode ser laborioso, mas diz que todo o trabalho é realizado de uma vez, e rapidamente. "A maioria dos apicultores coleta mel um dia por ano", disse Burlew, acrescentando que a Flow Hive, que ela não usou, "resolve um problema que na verdade não existe".

    Michael Bush, autor de "Practical Beekeper", uma série de manuais de apicultura, inicialmente encarava a nova ideia com ceticismo. "Quando vi um vídeo pela primeira vez, achei que era impossível", ele comentou via e-mail. "Fiquei pensando se era um truque ou era real".

    Quando os Anderson lhe enviaram uma das colmeias e pediram que a testasse, sua opinião mudou. Bush constatou que o aparelho funcionava, mas ainda tem algumas críticas. Não é possível abrir e fechar a torneira quando o operador quiser, por exemplo. É preciso coletar todo o mel da colmeia de uma vez, ele comentou.

    E ele e Burlew consideram o aparelho caro demais. Bush apontou que converter suas 200 colmeias custaria US$ 82 mil (R$ 258 mil). Mas se o dinheiro não é objeção, ele não vê outro motivo para hesitar.

    "É o aparelho de apicultura mais bacana que já vi", afirmou.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    [an error occurred while processing this directive]

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024