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    Livro destaca empreendedorismo da tradicional família Guinle

    LUÍS EBLAK
    DO RIO

    25/07/2015 02h00

    PDOC/FGV
    Getulio Vargas e e Carlos Guinle (a esq.) durante inauguração da estrada Itaipava-Petrópolis, em 1937
    Getulio Vargas e e Carlos Guinle (a esq.) durante inauguração da estrada Itaipava-Petrópolis, em 1937

    Deve-se muito a Jorginho Guinle, "talvez o playboy mais famoso do Brasil", a imagem de glamour e vida boêmia atrelada à tradicional família carioca no século 20.

    Em "Os Guinle - A História de uma Dinastia", porém, o escritor Clóvis Bulcão tem um objetivo claro: mostrar também que o empreendedorismo da família teve papel importante no desenvolvimento econômico do país.

    Não à toa. Os Guinle deixaram de ser simples comerciantes em fins do século 19 quando o patriarca Eduardo Palassim Guinle e o sócio Cândido Gafrée venceram licitação para a construção do porto de Santos. O país já vivia o auge do café, principal produto brasileiro que necessitava de um porto à altura para as exportações.

    A empreitada dá origem à multiplicação das riquezas da família, principalmente depois que os Guinle conseguem prorrogar o prazo de concessão de 39 para 92 anos.

    Com o porto, a família pôde criar um império, em diferentes segmentos. "Levaram energia elétrica aos principais Estados do Brasil. Tiveram atuação decisiva na construção da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional). Foram pioneiros na descoberta de petróleo e participaram ainda do projeto do maior aeroporto do Brasil, o de Cumbica", escreve Bulcão.

    Não parou aí é cada filho teve uma função diferente. O primogênito –Eduardo, como o pai– foi o "braço elétrico" dos Guinle. Também aproveitou a modernização urbanística da então capital federal, nos primeiros anos da Velha República, e anteviu o grande potencial imobiliário da cidade.

    Guilherme fundou o banco Boavista e Octávio criou o famoso hotel Copacabana Palace, até hoje um dos símbolos mundiais do Rio acostumado a receber celebridades.

    Mas, se por um lado, os Guinle souberam ganhar dinheiro além da conta, por outro, muitos de seus membros não só ostentaram essa riqueza como tinham o hábito de gastar fortunas sem limites.

    O próprio Jorginho representa bem essa gastança. Segundo Bulcão, o playboy não trabalhava e recebia do pai, Carlos, uma "mesada" equivalente a US$ 45 mil. Nos cálculos do autor, Jorginho –morto em 2004– gastou US$ 20 milhões ao longo da vida. Tanto que chegou ao final dela morando de favor.

    Historiador, Bulcão mostra ainda na obra episódios negativos dos Guinle, como a prisão de Octávio, em 1914, nos EUA. Ele assinara um contrato pré-nupcial com uma mulher, tentou fugir do país e acabou preso.

    O livro poderia ser melhor, porém, em dois aspectos:

    1- Ele não detalha um capítulo importante da história do Rio. A modernização urbanística da cidade teve consequências sociais graves, resumidas por Bulcão em quatro linhas. Valeria ter recorrido a "Literatura Como Missão", de Nicolau Sevcenko, estudo relevante sobre o assunto que não foi sequer citado em "Os Guinle".

    2- As relações possivelmente escusas que os Guinle tiveram com o poder -sobretudo com Getulio Vargas– são mencionadas por Bulcão, mas poderiam ter sido mais discutidas.

    MÉNAGE À TROIS

    Bulcão pesquisou a família por cinco anos e entrevistou mais de 50 membros dos Guinle. Assim, o livro também aborda a vida pessoal de seus integrantes. E ela não foi nada convencional para os padrões da época.

    Afinal, foram três triângulos amorosos na família. No primeiro deles, apontado à época como ménage à trois, o patriarca dividiu a mulher com o sócio. Os três declararam inclusive morarem no mesmo endereço num dos documentos acessados por Bulcão.

    Especula-se que três dos seis filhos, no papel, de Eduardo, eram, na verdade, de Cândido Gafrée.

    Os outros triângulos envolveram os irmãos Eduardo e Guilherme, que disputaram o amor da prima, Branca -ela acabou casando com o primeiro-; e Arnaldo, que morou com duas mulheres em plena primeira metade do século 20.

    DERROCADA

    Todo o poder, a influência e a riqueza dos Guinle vão aos poucos acabando. A concessão do porto de Santos termina em 1980; o Copacabana Palace é vendido em 1989 e o banco Boavista, em 1997.

    Para Bulcão, pode-se falar em dois motivos para a derrocada da família. Primeiro, a transferência da capital federal para Brasília deixou os Guinle distantes do poder. Segundo, diz o autor, as novas gerações não souberam empreender -como seus antepassados- num novo cenário do Brasil, mais urbano e industrial. A dizer, não criaram oportunidades novas de negócios.

    Sobre essa falta de know-how, a descrição de um dos herdeiros nos anos 60 é sintomática: o rapaz "só aprendeu a amarrar os sapatos aos 15 anos. Até então, os empregados sempre fizeram o serviço para ele".

    Os Guinle - A História de uma Dinastia
    AUTOR Clóvis Bulcão
    EDITORA Intrínseca
    QUANTO R$ 39,90 (256 págs.)
    AVALIAÇÃO bom

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