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    Salário tem reajuste abaixo da inflação em 14,6% dos acordos no semestre

    ANDRÉ CABETTE FÁBIO
    DE SÃO PAULO

    27/08/2015 10h41

    A piora do mercado de trabalho e as altas dos preços fizeram com que 14,6% das negociações salariais resultassem em ajustes abaixo da inflação no primeiro semestre de 2015.

    Ou seja, em 3 de cada 20 acordos com os patrões os trabalhadores tiveram poder de compra reduzido, o pior resultado desde que se passou a acompanhar o atual grupo de negociações estudado pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), em 2008. Se considerados todos os estudos, é o pior resultado desde 2004.

    No mesmo período de 2014, o equivalente a 2,6% dos acordos ficaram abaixo da inflação, segundo a instituição. O ajuste real (acima da inflação) médio, de 0,51%, também foi o menor desde 2004.

    Os resultados das negociações salariais foram especialmente ruins para os trabalhadores da indústria (leia mais abaixo).

    A proporção de ajustes acompanhando a inflação também teve queda. Com isso, o número de acordos que acabaram em aumento real (acima da inflação) caiu para 68,5% do total. Eram 92,7% no mesmo período de 2014.

    Apesar do crescimento, a proporção de negociações mal sucedidas —do ponto de vista dos trabalhadores— ainda não bate a observada em outros períodos recentes que viveram o combo de desemprego e inflação em alta e economia em retração.

    Em 1999, 50,32% das negociações resultaram em aumentos que não conseguiram repor a inflação, que fechou o ano em 8,43% segundo o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), e em 2003, 58,2%, quando a inflação fechou em 10,38%.

    A comparação não é, no entanto, perfeita, pois grupos diferentes eram levados em consideração.

    CAUSAS

    Segundo Newton Rosa, economista-chefe da SulAmérica Investimentos, a queda da renda média, que foi de R$ 2.293 em janeiro deste ano para R$ 2.148 em junho em seis regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE, tem feito mais trabalhadores procurarem o mercado de trabalho para engrossar a renda da família.

    Eles têm se deparado, no entanto, com um mercado que cortou meio milhão de vagas formais de janeiro a julho, o que contribuiu para que o desemprego atingisse 7,5% nas capitais pesquisadas.

    "Essa parcela desempregada ou com risco de perder o emprego enfraquece o poder de barganha dos trabalhadores."

    Aumento real médio dos sálarios - Em %

    Outro fator que tem pesado é a inflação em alta, afirma José Silvestre, coordenador de relações sindicais do Dieese.

    Para acompanhar a alta geral dos preços, os salários precisariam, em janeiro, de um aumento de, no mínimo 6,2%, de acordo com o INPC em 12 meses, usado como base da pesquisa. Com a alta da inflação, no entanto, esse aumento teria que ser, em junho, de ao menos 8,8%.

    Quanto maior a inflação, mais acirrada é a briga para conseguir um aumento que a supere. "Um dos principais componentes do custo das empresas é o salário, que tende a ter cortes na crise. Tem datas-base em julho e agosto que vão ter um INPC de mais de 9%", diz Silvestre.

    Segundo o estudo, a disparada da inflação dificultou a negociação de reajustes com ganhos reais, o que pode ser constatado ao se comparar os resultados de janeiro (92% de aumentos acima da inflação) e maio (50%).

    No primeiro semestre, a pesquisa do Dieese analisou 302 negociações trabalhistas. Até o final do ano, esse número deve chegar a 700.

    É na segunda metade do ano que são concedidos os ajustes na maior parte das negociações de categorias conhecidas por serem organizadas e combativas, como metalúrgicos, bancários e trabalhadores da indústria do petróleo.

    Normalmente, eles tendem a conseguir acordos melhores mas, segundo Silvestre, o mau momento da economia deve fazer com que o ano feche com resultados tão ruins quanto os do primeiro semestre.

    Reajustes dos salários - Em comparação com o INPC-IBGE, em %

    No primeiro semestre também subiu o número de casos em que os funcionários saíram das negociações com ajuste igual à inflação: 16,9% do total, um outro recorde da série a partir de 2008. No primeiro semestre de 2014, apenas 4,6% dos casos tinham ajustes acompanhando o índice.

    SETORES

    Setor da economia que mais fechou vagas de janeiro a julho, a indústria também ofereceu os piores acordos de ajuste salarial no primeiro semestre.

    Se no mesmo período de 2014 o desfecho de 90,6% das negociações era aumento acima da inflação, em 2015 essa proporção caiu para 60,9%.

    Em nenhum ano da série a partir de 2008 esse resultado havia ficado abaixo de 80%. Dessa forma, 20,3% dos ajustes ficaram abaixo da inflação, e 18,8% acompanharam o índice. No mesmo período de 2014, a proporção em ambos os casos era de 4,7%.

    Para Rosa, da SulAmérica, os salários do setor estavam artificialmente inflados pelo aquecimento do mercado de trabalho influenciado pelo setor de serviços, gerando ajustes acima da inflação mesmo em nichos em crise, como o automotivo.

    Em sua visão, a tendência agora é de um ajuste geral, com ênfase para a indústria.

    Reajustes salariais no 1º semestre de 2015 - Porcentagem dos reajustes que ficaram abaixo do INPC, por setor

    A queda do poder de compra não ocorreu, no entanto, de forma homogênea no setor. Apenas 47,1% dos acordos na área de vestuário ocorreram acima da inflação, enquanto os metalúrgicos tiveram aumento real em 83,3% dos casos.

    O segundo pior desempenho foi do setor de serviços, que teve uma média de aumento real de 0,78%. Em 73,6% dos casos, os acordos ficaram acima do INPC, o menor resultado desde 2013 (76%). Em 2014, essa proporção era de 94,6%.

    Assim, 11,6% dos ajustes ficaram abaixo do índice, ante apenas 0,8% em 2014. 14,7% dos acordos acompanharam a inflação ante 4,7% em 2014.

    Com ajustes reais médios de 0,63%, o setor de comércio conseguiu garantir acordos acima da inflação em 75,6% dos casos. Trata-se, no entanto, de uma forte queda ante o índice de 93,3% observado no primeiro semestre de 2014.

    Até 2013, o setor vinha obtendo aumentos em quase 100% dos casos. Em 2015, 6,7% dos acordos ficaram abaixo da inflação, e 17,8% se equipararam ao INPC.

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