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    Gente que fez sucesso depois dos 50 conta o que aprendeu antes de subir

    EMMA JACOBS
    DO "FINANCIAL TIMES"

    18/09/2015 12h36

    Aos 66 anos, Jeremy Corbyn foi apontado para a liderança do Partido Trabalhista do Reino Unido, no final de semana passado, depois de uma ascensão relativamente tardia, para suceder Ed Miliband, homem mais de duas décadas mais jovem.

    A indicação dele contraria a trajetória piramidal que é mais comum em uma carreira: educação e em seguida um primeiro passo na profissão, seguido por novos passos e novos degraus galgados até que chegue o pico e em seguida a aposentadoria.

    Reuters
    Jeremy Corbyn, the new leader of Britain's opposition Labour Party takes part in his first Prime Minister's Questions in the House of Commons in Westminster, London, September 16, 2015. The new leader of Britain's opposition Labour Party, veteran leftist Corbyn, confronted Prime Minister David Cameron in parliament for the first time on Wednesday and said the house's raucous weekly question-and-answer session should be less theatrical and more about hearing ordinary people's voices. REUTER/Parliament TV/Handout via ReutersATTENTION EDITORS - THIS IMAGE HAS BEEN PROVIDED BY A THIRD PARTY. IT IS DISTRIBUTED, EXACTLY AS RECEIVED BY REUTERS, AS A SERVICE TO CLIENTS. EDITORIAL USE ONLY. NOT FOR SALE FOR MARKETING OR ADVERTISING CAMPAIGNS. ORG XMIT: LON104
    Jeremy Corbin, que chegou aos 66 ao posto de líder da oposição no Reino Unido

    Os percalços da vida, claro, significam que esse modelo representa um ideal, e não uma realidade, para muitos, especialmente aqueles —-acima de tudo as mulheres, no caso— que se afastam um pouco da profissão para cuidar de filhos pequenos ou pais envelhecidos.

    Os "wunderkinds" tão elogiados nas listas de pessoas que fazem sucesso antes dos 30 são celebrados por seu vigor e criatividade. Mas para muitos homens e mulheres, o sucesso só surgiu depois dos 50, 60 ou até 70 anos.

    Raymond Chandler só publicou seu primeiro romance, "O Sono Eterno", aos 51 anos; Mary Wesley estreou aos 71 com "The Camomile Lawn". O ator Bill Nighy não se tornou famoso junto ao público até depois dos 50 anos, depois de estrelar como um roqueiro decadente em "Simplesmente Amor", de Richard Curtis.

    FIA
    Literatura: o escritor Raymond Chadler, posa para retrato, em foto dos anos 1940. *** Raymond Chandler (1888-1959) romancier americain, photo par John Engstead, annees 40 --- Raymond Chandler (1888-1959) American novelist , photo by John Engstead, 40's .Credit Rue des Archive / FIA *** Local Caption *** Raymond Chandler (1888-1959) American novelist , photo by John Engstead, 40's ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    O escritor Raymond Chadler, que publicou seu primeiro romance aos 51

    Malcolm Gladwell escreveu, em um artigo para a revista "New Yorker" sobre pessoas criativas que conquistam sucesso já tarde em suas vidas, que elas muitas vezes são descritas como pessoas que começaram tarde, ou como "artistas que foram descobertos com atraso —o mundo demorou a reconhecer seus talentos, e só... Florescer tarde seria simplesmente um caso de gênio não reconhecido pelo mercado".

    Mas o sucesso tardio pode simplesmente ter acontecido porque as pessoas inicialmente não eram tão boas quanto vieram a se tornar, ele sugere mais adiante.

    O avanço da expectativa de vida sugere que as pessoas agora trabalham por mais tempo. Talvez venhamos a ver outras carreiras nas quais o sucesso vem tarde? Conversei com três pessoas que conquistaram sucesso —um termo subjetivo— relativamente tarde em suas carreiras.

    Frederic J. Brown/AFP
    ORG XMIT: MA066 Nominee for Best Performance by an Actor in a Mini-series or Motion Picture Made for Television Bill Nighy poses on the red carpet for the 69th annual Golden Globe Awards at the Beverly Hilton Hotel in Beverly Hills, California, January 15, 2012. AFP PHOTO / Frederic J. BROWN
    O ator Bill Nighty, que só foi revelado ao público depois dos 50 anos

    Margaret Hodge

    A parlamentar trabalhista que representa os distritos de Barking e Dagenham foi eleita para o Parlamento aos 50 anos. Antes disso, passou pela consultoria e auditoria PwC, foi vereadora e, posteriormente, presidiu o Legislativo municipal de Islington.

    Antes de chegar a Westminster [a sede do Parlamento britânico], diz, seu foco era criar quatro filhos e ao mesmo tempo "manter um pé no mercado de trabalho".

    Experiência é importante e costuma ser subestimada, ela afirma. "Fico zangada com o culto à juventude. A urgência da carreira".

    O conselho dela é que "não importa muito se você enrolar por alguns anos. E isso é ainda mais importante agora que a vida profissional está se alongando". Mulheres jovens a repreendem quanto as aconselha a terem filhos. "É tão importante e uma alegria tão grande. Mas é claro que não é isso que elas desejam ouvir."

    A ideia de que ela "floresceu tarde" é recebida com risadas. Mas Hodge admite que conquistou a atenção do público ao encarar o Partido Nacional Britânico para manter seu posto no Parlamento, em 2006, e mais tarde, já depois dos 60 anos, se tornou conhecida em todo o país como presidente do Comitê de Contas Públicas do Parlamento, de 2010 até deixar o posto, este ano.

    Nessa posição, ela ganhou reputação por interrogar empresas como o Google, Amazon e Starbucks por seus arranjos tributários. (Ainda que críticos a tenham acusado de fazê-lo apenas para chamar a atenção da mídia.)

    Agora, aos 71 anos, ela sente que novas oportunidades se abriram para ela —está escrevendo um livro, foi indicada como professora visitante do King's College, em Londres, e está presidindo um comitê pluripartidário sobre "responsabilidade nos impostos".

    Houve momentos, ela admite, em que se sentiu frustrada por ver a ascensão de colegas homens nas fileiras do governo. "É claro que houve momentos em que questionei por que David Blunkett estava no governo e não eu".

    Agora que está mais velha, ela diz que o preconceito é profundo: "Mulheres de mais de 50 anos são feias e velhas". A eleição de Corbyn a anima? "Não, ele é um homem branco de classe média, e essa cultura domina a política do Reino Unido desde sempre".

    Charles Bradley

    Algumas semanas atrás, o cantor de soul Bradley, 66, cantou no festival Coachella, na Califórnia. A despeito de ter se apresentado em pequenas casas de espetáculos a vida toda, algumas vezes como imitador de James Brown, ele foi morador de rua por algum tempo e trabalhou como lavador de louça para se sustentar.

    Em 2011, por fim lançou um álbum pela gravadora Daptone Records. Que a história de sua carreira pareça um pouco um conto de fadas se tornou parte de seu marketing. Um longa-metragem sobre sua vida,. "The Soul of America", lançado em 2012, ajudou a divulgar sua história e seu talento.

    Mas em seus momentos mais sombrios, Bradley conta ter caído em depressão. "Eu me sentia frustrado. Jamais conseguia uma chance honesta. Sentia que não havia muito mais que eu pudesse fazer. Só restava esperar a morte. Queria abandonar a música (...) eu rezava muito, e chorava". Foi sua fé que o levou a persistir.

    Bradley conta que suas experiências deram mais profundidade à sua música. "Você precisa viver a coisa, precisa se machucar". Para os cantores que conquistam fama e fortuna muito jovens, muitas vezes há um preço a pagar, ele diz. "Muitos deles venderam seu espírito".

    O sucesso tardio significa que "posso perceber a falsidade das pessoas que só querem me conhecer agora". Embora esteja muito mais confortável em termos materiais, ele continua a morar na casa que foi de sua mãe, em Brooklyn.

    Bradley questiona o conceito de sucesso. "Quero um ambiente confortável e ter dinheiro para comprar as coisas de que preciso. Sou famoso? Continuo na luta... tentando manter meu espírito elevado".

    Rob Knighton

    Cinco anos atrás, o instalador de carpetes estava tomando sol no parque London Fields, na zona leste da capital britânica, quando um olheiro de uma agência de modelos o viu. Knight tinha 50 anos. Agora, ele apareceu em campanhas ao lado de David Beckham para a cadeia de moda H&M e trabalhou como ator no filme independente "Everyone's Going to Die".

    Foi uma mudança de carreira que Knight, 55, jamais havia imaginado. "Mas curti poder fazer um trabalho mais fácil", ele diz. Instalar carpetes era fisicamente cansativo. "Fico surpreso por ter aguentado tanto tempo. Vivia machucado e dolorido".

    No começo, trabalhar como modelo o preocupava - ele achava que era uma profissão mais adequada para homens mais jovens e mais musculosos.

    "Quando percebi que eram as rugas que eles queriam, relaxei". Sua renda excede os ganhos do trabalho com carpetes, e o trabalho é mais glamouroso, mas ele não lamenta ter demorado a mudar a carreira.

    "Conheço o valor do dinheiro. Fui apresentado a jovens modelos que nem imaginam a sorte que têm. Sinto-me afortunado". Ele não tem arrependimentos. "O trabalho me faz feliz. Mas eu também era feliz como instalador de carpetes".


    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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