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    Brasil vive momento perfeito para arriscar mais, diz publicitário

    FILIPE OLIVEIRA
    DE SÃO PAULO

    03/10/2015 02h00

    Divulgação
    Tor Myhren, publicitário presidente da Grey NY
    Tor Myhren, presidente da agência de publicidade Grey em Nova York

    A melhor forma de lidar com a crise é arriscando.

    Tor Myhren, 43, publicitário e dono dessa opinião, baseia-se em sua própria experiência para dizer isso. Durante a crise financeira que começou em 2008, obteve um dos grandes sucessos da carreira ao criar o bebê da corretora de investimentos e-Trade, que apareceu durante cinco anos em anúncios on-line.

    Myhren, que é o diretor criativo global da agência de publicidade Grey e presidente da unidade da empresa em Nova York, foi presidente do júri para a categoria filme no festival de publicidade de Cannes neste ano.

    Também já foi considerado uma das pessoas mais criativas dos negócios pela revista norte-americana "Fast Company". Em visita ao Brasil, ele conversou com a Folha sobre criatividade, crise e publicidade digital.

    *

    Folha - O Brasil vive uma crise econômica e política. A criatividade serve para este momento ou é melhor a segurança de ideias conhecidas?

    Tor Myhren - Não importa em que setor você está, a criação de ideias originais é o que move os negócios hoje.

    É a habilidade mais procurada pelos CEOs de empresas, devido à velocidade com a qual o mundo está mudando.

    Penso que a criatividade pode resolver qualquer problema. Mesmo os mais graves do mundo vão ser resolvidos, no final, pelo pensamento criativo e pelas boas ideias.

    Por isso ela pode ser aplicada em momentos de bagunça como o que o país vive agora. É o momento perfeito. Sempre que as pessoas estão em dificuldades, estão com a mente mais aberta.

    Quando as pessoas estão encurraladas, fazem coisas que, de outra forma, não fariam. E isso significa empurrar os limites para um pouco mais longe. No mundo das ideias, as melhores coisas aparecem quando você assume riscos. Quando tudo vai bem, você fica preguiçoso. Não tem nada contra o que lutar. A melhor arte aparece em tempos duros.

    Um de seus maiores sucessos, a campanha do bebê da e-Trade, surgiu durante a última crise dos EUA. Como foi?

    Era um tempo em que toda empresa do setor financeiro dos EUA estava ficando séria, a comunicação deles era muito carrancuda. Diziam: "Você precisa ficar atento ao seu dinheiro, pois estamos em tempos difíceis".

    Fizemos exatamente o contrário, com um vídeo de um bebê usando linguagem da rua, meio amalucado. E funcionou incrivelmente bem. Ficou no ar por cinco anos nos EUA, algo muito raro.

    Se você está em dificuldade financeira, a última coisa que vai querer ouvir é mais uma empresa dizendo quão difícil está a vida.

    Como diferenciar uma ideia genial de uma imensa bobagem?

    É muito difícil. Não acho que ninguém saiba. É comum você não ter a menor ideia de qual será o resultado.

    Então não há receita para o sucesso?

    Realmente não. Mas o que todos querem agora, em nosso setor, é ter um vídeo viral, que consiga milhões de cliques. Uma coisa que aprendemos é que não há fórmula para isso. Você pode colocar uma celebridade para ter mais visualizações. Não garante que as pessoas vão gostar mais, mas vão acessar por causa da celebridade. Não que eu concorde com essa teoria.

    Humor tende a funcionar, se conseguir fazer, pois é o gênero mais difícil na área criativa. Há milhões de formas de criar um viral, mas, no fim, ninguém sabe qual funciona.

    Criar um viral deve ser um objetivo para as empresas?

    Eu gosto da tendência de clientes dizendo "quero um filme que apareça no YouTube e ganhe muita atenção".

    Isso deixa nosso trabalho mais divertido. Porque eles estão, na verdade, pedindo uma peça publicitária que todos queiram assistir.

    É mais legal do que o pedido de uma propaganda de 15 segundos enfatizando aquele benefício do produto. Não que não funcione, mas prefiro dessa nova forma;

    O que uma empresa pode fazer internamente para ampliar sua criatividade?

    Acredito que a arquitetura, como espaços abertos, faz uma grande diferença no modo como as ideias fluem na empresa.

    Mas o processo criativo começa na cultura da empresa. A mais importante é permitir aos profissionais assumir riscos.

    Demitir alguém por algo novo que deu errado, que é o que muitas companhias fazem, leva a empresa a parar de crescer. Pensam que estão fazendo o mais seguro, mas é muito arriscado, na verdade.

    Qual o papel das mídias tradicionais e da internet hoje?

    Todos sabemos que jornais e revistas são menos relevantes enquanto objetos físicos. As pessoas vão ler boa parte das notícias on-line.

    Acredito que essa tendência de tudo migrar para a internet vai se intensificar, inclusive na televisão.

    Mas esse é apenas o formato. Nosso trabalho ainda é contar história sobre marcas que as pessoas queiram ouvir, o que você pode fazer em qualquer meio.

    A internet muda alguma coisa na publicidade?

    Na televisão, você é capturado pela propaganda. Na internet, você assiste o que quiser, o que é ótimo para nosso setor, pois nos obriga a fazer conteúdo que as pessoas desejem ver.

    Para o setor criativo de nossa indústria é muito excitante. Você não pode mais fazer porcaria e esperar ter atenção.

    No Brasil, algumas empresas vêm colocando a crise em destaque em suas campanhas. Como avalia a estratégia?

    Acho que, desde que seja interessante, provocativo e tenha uma história atraente, provavelmente está bem.

    Um dos destaques do último festival de Cannes foram as propagandas que falavam mais de responsabilidade social do que produto. Como avalia a tendência?

    As marcas guiadas por um propósito fazem parte de uma grande tendência.

    Não acredito que isso vai acabar logo.

    As marcas agora têm algo a dizer a respeito do mundo. E estão participando dos problemas do mundo por causa da internet.

    A internet fez todas as companhias transparentes. As pessoas podem saber o que a empresa realmente é.

    O que acho ótimo dessa transparência que a internet criou é que, se as empresas querem ser atraentes para os jovens, têm de ter uma causa.

    -

    • RAIO-X TOR MYREN, 43

    Atuação:

    Diretor global de criação e presidente em Nova York da agência de publicidade Grey

    Principais campanhas:

    Bebê que anuncia site para investimentos E-Trade

    Distribuição de carros surpresa para plateia durante programa da Oprah Winfrey (2004)

    Campanha "Cable Effects" para a DirecTV (2012), com ataques cômicos à TV a cabo

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