• Mercado

    Thursday, 28-Mar-2024 07:21:50 -03

    Programas sociais têm de sair do 'piloto automático', afirma ministro

    VALDO CRUZ
    DE BRASÍLIA
    JULIANNA SOFIA
    COORDENADORA DE ECONOMIA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

    01/02/2016 03h00

    O novo ministro do Planejamento, Valdir Simão, afirma que o governo quer acabar com o "piloto automático" dos programas federais, inclusive os da área social, para "descontinuar" os que não têm mais sentido e reforçar os mais eficazes.

    Para isso, revelou que fará uma avaliação de vários deles, citando Farmácia Popular, Garantia Safra, UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) e construção de creches no Pró-Infância.

    A medida faz parte da reforma do Estado que o ministro elabora, com quatro pilares: desburocratização, reorganização administrativa, fortalecimento da gestão e do controle e gestão da qualidade do gasto público.

    "Temos de verificar a qualidade dos programas. E para que esta avaliação? Para aperfeiçoar e fazer o orçamento seguinte do programa refletir as suas necessidades. Não podemos ficar ligados no piloto automático e simplesmente colar a gestão orçamentária", afirmou.

    Pedro Ladeira/Folhapress
    O ministro do Planejamento, Valdir Simão, em entrevista em seu gabinete, em Brasília
    O ministro do Planejamento, Valdir Simão, em entrevista em seu gabinete, em Brasília

    *

    Folha - O governo fechou 2015 com um déficit de R$ 115 bilhões, o maior desde sempre. Onde o governo fracassou?
    Valdir Simão - Tivemos dificuldades, em especial nos últimos dois anos: preço das commodities em queda, trazendo um desaquecimento da atividade econômica, que teve impacto nas receitas. O Orçamento é muito engessado, apenas 8,5% podem ser contingenciados, uma margem muito difícil. Temos um desafio grande neste ano, temos de ter como referência a meta aprovada no Congresso, de um superavit de 0,5% do PIB.

    Como cumprir esta meta, o mercado não acredita?
    Para 2016, algumas medidas são centrais para atingirmos o resultado, aprovar a CPMF e a DRU [Desvinculação de Receitas da União], mas também medidas do lado da despesa e da organização do Estado. A questão da reforma da Previdência tem de ser discutida.

    A Previdência é importante para o longo prazo. Mas, para a meta de 0,5%, o que fazer?
    Estamos discutindo uma série de medidas, fazendo um trabalho de revisão de parâmetros para contratação na administração pública, para focar mais em produtividade e menos em quantidade dos serviços. Esta é uma dimensão importante, porque nossos parâmetros ainda não são bons. É possível fazer melhor com menos.

    Este é um discurso que muitos já fizeram, sem resultado. O que leva o sr. a acreditar que será diferente?
    O gestor público tem de colocar produtividade no seu processo de decisão. Para isto, estamos discutindo no âmbito da reforma do Estado quatro pilares. Primeiro, a desburocratização, identificando onde estão os gargalos e eliminando-os, o que contribui para a melhoria do bem-estar, reduz custo para o Estado e acaba com controles desnecessários e melhora o ambiente de negócios.

    O que de fato pode melhorar?
    Por exemplo, todos os órgãos têm de ter prazos de atendimento. Não é possível uma empresa um cidadão fazer uma requisição ao Estado, e ele não ter prazo máximo para atender. Essa tem de ser uma regra, todos os processos que não tiverem prazo máximo passarão a ter.

    Qual é o outro pilar da reforma do Estado?
    A reorganização administrativa do Estado. Estamos cortando cargos, o Estado tem aproximadamente 22 mil cargos comissionados.

    Mas isso foi prometido e até agora não cumprido.
    Estamos buscando acelerar este processo. Ainda não foram cortados, mas serão.

    Os parâmetros de gastos são ruins, como o sr. disse. O que fazer para melhorar?
    Aí entra o terceiro pilar da reforma do Estado, atacar a qualidade do gasto. Temos hoje um conjunto de políticas que são implementadas, mas a avaliação da qualidade, da efetividade destas políticas ainda não é boa. Eu preciso sistematicamente, ano a ano, avaliar se determinado programa social, se determinado investimento deve ou não continuar.

    O que deve ser descontinuado?
    É preciso verificar se o programa está se propondo aquilo para o que foi idealizado, do ponto de vista fiscal e de investimento, se na sua formatação existem vulnerabilidades que possam permitir desvios. Posso falar aqui quais programas eu pretendo avaliar, sem trazer um prejulgamento se ele é adequado ou não. O Garantia Safra, que é uma bolsa paga ao agricultor por causa da escassez de chuva, é um exemplo. Estamos avaliando a Farmácia Popular, o funcionamento das UPAs [Unidades de Pronto Atendimento], do ponto de vista qualitativo, se estão atendendo as expectativas. E para que essa avaliação? Para aperfeiçoar e fazer o orçamento seguinte do programa refletir as suas necessidades. Não podemos ficar ligados no piloto automático e simplesmente colar a gestão orçamentária.

    Como o sr. avalia a qualidade?
    O Bolsa Família, que é um programa de sucesso, ninguém tem dúvida do seu impacto social, da sua efetividade e importância. Mas sempre há a possibilidade de aperfeiçoamento. Então, esta é uma rotina que o Ministério do Planejamento tem de desenvolver, garantir que o programa primeiro tenha sido bem formatado e todas as suas vulnerabilidades e riscos sejam mapeados, segundo avaliar sua efetividade. Quando eu criei o Bolsa Família tinha o objetivo de redução da pobreza. Ele está contribuindo para isto? Está. Ele tem de continuar? Tem de continuar. Isto fortalece o programa para o gestão do ciclo orçamentário. E, é claro, quando se identificar que há programas que já cumpriram seu papel, têm de ser descontinuados.

    Tem algum caso identificado?
    Estamos começando a avaliação, o que eu falar é especulação. [Estamos avaliando] o Pro-Infância, na construção de creches. Estamos fazendo uma avaliação dos cartões de pagamento da defesa civil. Aí é muito na questão do controle, revisão das condições, do que da questão da efetividade do programa.

    Qual é o quarto pilar?
    Fortalecimento da gestão e do controle. Tínhamos fragilidades na gestão porque não incorporamos ainda a gestão de risco como uma rotina. Precisamos adotar na administração pública programas de "compliance" como estão sendo adotados no setor privado. Códigos de conduta, revisão do processo decisório para que ele seja equilibrado, não concentrar decisão nas mãos de poucas pessoas, fazer um trabalho de formação e capacitação das pessoas com base nesse código de conduta. Ter canais de denúncias, apurar efetivamente as denúncias, punir as pessoas adequadamente.

    Esta reforma, num momento de investigação sobre irregularidades na Petrobras, tem como alvo evitar a corrupção?
    Ela contribui, mas não posso distinguir o controle voltado para o "compliance", para a integridade, do controle voltado para resultado. Por exemplo, a relação com fornecedores: como devo receber, alguém deve estar junto? Como deve ser a política de recebimento de presentes ou de oferta de patrocínio? Isso tem de estar claro para todos. Vamos eliminar a corrupção? Não. Nenhum programa se propõe a isso. Ele se propõe a evitar que ela aconteça, mas, se acontecer, possa ser identificada. E, identificada, que o agente possa ser punido.

    Edição impressa
    [an error occurred while processing this directive]

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024