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    o impeachment

    Análise

    Demanda fraca no país não sugere recuperação nos próximos meses

    CARLOS KAWALL LEAL FERREIRA
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    29/02/2016 02h00

    Demanda fraca nos mercados externo e interno, desconfiança de consumidores e de investidores, alto nível de endividamento das famílias e das empresas, dúvidas sobre a situação fiscal do país, incertezas no cenário político, erros na condução da política econômica...

    São muitas as razões que levam especialistas a acreditar que a crise pode se aprofundar ainda mais antes de a economia iniciar uma retomada, não vislumbrada para os próximos meses. Para Fernando Rugitsky, por exemplo, economistas e governo cavam ativamente o fundo do poço .

    Leia, abaixo, a análise de Carlos Kawall Leal Ferreira, economista-chefe do Banco Safra e professor da EESP/FGV, foi secretário do Tesouro Nacional e diretor do BNDES.

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    Diante da contundente queda do nível da atividade econômica, uma pergunta frequente tem surgido: chegamos ao fundo do poço?

    Apesar da desvalorização cambial, a contração da demanda doméstica não sugere uma recuperação econômica nos próximos meses, dado o nível muito deprimido da confiança de empresários e de consumidores.

    De modo a aferir o quão próximos estaríamos do "fundo do poço", a equipe de economistas do Banco Safra construiu um índice de atividade a partir de uma gama de indicadores antecedentes e coincidentes de atividade econômica, como demanda por energia elétrica, produção de veículos, fluxo de veículos em estradas pedagiadas, indicadores de consumo, crédito, confiança e também ligados ao setor de serviços.

    Em uma primeira análise, saltou aos olhos o grau de deterioração da atividade econômica observada até o fim do ano passado: estávamos quase três desvios-padrão abaixo da média histórica, pior do que vivemos em 2008-2009. Porém, a boa notícia é que se constatou também que a velocidade da queda parece estar diminuindo, sinalizando uma queda do PIB neste ano em torno de 3%.

    Contudo, há uma característica da crise atual que difere daquelas que vivemos desde os anos 1990.

    Desde a criação do Plano Real, observou-se uma paulatina expansão da relação crédito/PIB. As crises econômicas vividas em 1998/99 ou 2002/03 não ocorreram em contexto de elevado endividamento de empresas e famílias, o qual se situava em torno de 25% a 28% do PIB. Desde então, a relação crédito/PIB praticamente duplicou, atingindo 54% do PIB.

    Para 2016, a expansão dos ativos dos bancos, segundo o Banco Central, pode situar-se em 5%, patamar abaixo da taxa de inflação esperada e muito abaixo da taxa de juros média que corrige o estoque de ativos de crédito (29,8% ao ano ao final de 2015, segundo o BC), resultando em uma forte contração do crédito. Ou seja, a desalavancagem das empresas e das famílias dificultaria a recuperação da economia.

    Para avaliar essa questão, criamos um indicador de condições financeiras (curva de juros, índice Ibovespa, câmbio, concessões de crédito e os desembolsos do BNDES).

    Esse indicador tem mostrado grande retração desde o final de 2014, situando-se aproximadamente três desvios-padrão abaixo da sua média histórica. Considerando esse indicador, reduzimos nossa estimativa para o desempenho do PIB de 2016 de -2,9% para -3,8%.

    É importante também notar que as dúvidas ainda presentes no cenário com relação à situação fiscal, em um contexto de incerteza política, têm contribuído para manter deprimida a confiança empresarial e dos consumidores, mantendo a economia em trajetória de desaceleração.

    É mister enfrentar o inadiável conjunto de reformas constitucionais que garantam a sustentabilidade fiscal e que permitam o aumento do produto potencial da economia. Medidas de estímulo fiscal, monetário ou creditício serão inócuas sem o ajuste estrutural.

    CARLOS KAWALL LEAL FERREIRA, economista-chefe do Banco Safra e professor da EESP/FGV, foi secretário do Tesouro Nacional e diretor do BNDES.

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