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    Herdeiro de uma das maiores criações de gado do país investe em boate e grife

    CHICO FELITTI
    COLUNISTA DA FOLHA

    06/03/2016 02h00

    Isadora Brant/Folhapress
    Dono da casa noturna D.Edge, Renato Ratier fundou grife com seu sobrenome e já participou da SPFW

    Década de 1990. Dois dos principais criadores de gado de Mato Grosso do Sul conversam. "Como está seu filho?", pergunta o primeiro. "Bem. Está cuidando da boiada e fazendo saia também", responde o outro.

    Quem narra a cena é Renato Ratier, o próprio moleque que fazia saia e outras roupas num galpão agrícola, hoje um homem de 44 anos, 1,95 m de altura e braços largos cobertos por tatuagens.

    Herdeiro de uma das famílias com maior plantel bovino do país, Ratier mantém um pé na terra —só em seu nome tem 19 mil hectares, no valor de algumas centenas de milhões de reais. Mas gasta a maior parte das suas sinapses e de seus investimentos com negócios bem mais citadinos.

    Fundou em 2015 uma grife que leva seu sobrenome. Gastou R$ 1,5 milhão para criar a identidade da Ratier, com peças em preto, branco, cinza, inexistência de estampas e couro em abundância. Abriu nos Jardins, em São Paulo, a primeira butique da marca e foi exibi-la na mais recente SPFW, em outubro do ano passado.

    VISIBILIDADE

    Num momento em que muitos estilistas desistem de mostrar coleções semestralmente e o evento minguou em investimento, ele entrou. "Eu preciso da visibilidade que o desfile dá. Mas uma visibilidade controlada", diz, sentado numa mesa do restaurante Bossa, na alameda Lorena, que também abriu no ano passado em São Paulo.

    O negócio da moda já se pagou? "Nada. É investir e acreditar."

    Ele então aponta para a vitrine da butique, onde a marca está escrita de maneira quase ilegível. "Eu não quero nada chamativo. Tudo meu é a longo prazo."

    Faz três anos que trabalha em outro projeto, que tem previsão de abertura neste semestre: um prédio de cinco andares, com boate, uma segunda loja e sucursal do seu restaurante, no Porto Maravilha, ex-região degradada no centro do Rio de Janeiro que passa por um processo de investimento cavalar.

    Ratier afirma ter investido R$ 10 milhões na construção, de frente para a baía da Guanabara. "Minha família, que não mora perto do mar, apoiou."

    CAUBÓI VEGETARIANO

    Há também algo do DNA familiar em seus produtos. Abajures de crânio de boi são vendidos por R$ 4.000 na sua loja. Não se sabe por quanto tempo estarão lá.

    "Já pensei muito sobre isso, não sei. Eu me questiono sobre a taxidermia. Eu achava legal, mas já estou questionando ter de matar um animal."

    A consciência ecológica o motivou a contratar uma consultoria para fazer o estudo da cadeia de produção de todos os negócios e propor soluções ecológicas. Por exemplo: a D.Edge, casa noturna que mantém desde 2003 no bairro da Barra Funda (zona oeste paulistana) e já ganhou prêmio de uma das melhores do mundo, deve ter seu lixo plástico reciclado em tecidos.

    Desde dezembro de 2015, organiza eventos para vender a maioria das peças dos seus três guarda-roupas e levantar dinheiro para obras assistenciais.

    Os questionamentos afetaram também sua cadeia alimentar. Depois de ter conversado muito com a modelo e ativista vegetariana Ellen Jabour no Rock in Rio de Las Vegas, ele passou mais de um mês sem comer carne. Escorregou num ato falho gastronômico e voltou a ser carnívoro. "É o tipo de coisa em que penso muito."

    No dia da entrevista, entretanto, sua cabeça estava em outro lugar. O filho adolescente embarcara para a Califórnia, mesmo Estado onde ele morou, no dia anterior.

    Foi nos Estados Unidos que Renato cursou design de interiores —"a área em que mais me encontrei"— depois de uns semestres de zootecnia, de administração e de direito no Brasil.

    "Eu não sabia se ia voltar, mas com 20 anos estava de volta, cuidando de fazendas."

    O filho disse que quer trabalhar com o pai nos outros negócios, quando voltar. "Eu disse: 'Venha. Mas venha preparado'."

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