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    Governo absorve 72% do crédito do país e desidrata setor produtivo

    MARIANA CARNEIRO
    DE SÃO PAULO

    03/04/2016 02h00 Erramos: esse conteúdo foi alterado

    Sete em cada dez operações de crédito feitas no país em 2015 foram usadas para financiar o governo e as estatais.

    O Estado absorveu 72% das operações de dívida —que incluem empréstimos a pessoas físicas, empresas e o lançamento de títulos públicos e privados no mercado, segundo levantamento do economista Carlos Rocca, do Centro de Estudos do Instituto Ibmec.

    Isso representa R$ 597 bilhões, de um total de R$ 829 bilhões que girou neste mercado apenas no ano passado.

    Foi o maior percentual de apropriação estatal do fluxo de dívidas da economia brasileira em dez anos. O estudo apresenta dados desde 2005.

    Rocca atribui esse desequilíbrio ao elevado deficit no Orçamento, estimado em 10% do PIB. Endividado, o governo sugou recursos que deveriam irrigar o setor produtivo. "Quando o setor público disputa com o privado essa poupança, oferece juro mais alto em seus títulos, o que mata a demanda por crédito das empresas, que não conseguem acompanhar o aumento do custo do financiamento."

    Em resumo: o Estado, endividado, tem de cobrar juros altos para se financiar. Para o setor privado competir por esse dinheiro, precisa oferecer taxas ainda mais elevadas ao lançar um título, por exemplo, o que acaba sendo proibitivo.

    Do total de dívidas em circulação (R$ 7,6 trilhões), metade está com União, Estados, municípios e estatais.

    Essa é uma outra maneira de olhar a piora recente das contas públicas. Entre 2014 e 2015, a dívida bruta saltou de 57% para 66% do PIB.

    "Quando o governo tem deficit, precisa se financiar, e há três opções: aumentar impostos, imprimir moeda ou elevar a dívida."

    CALOTE

    A prevalência do setor público também é resultado da menor predisposição dos bancos em ceder novos empréstimos a empresas e consumidores em meio à recessão, temendo o calote.

    "Dívida pública recorde não reflete só um lado, do governo, que precisa e quer se endividar, mas preferência extrema do setor privado por liquidez", diz José Roberto Afonso, do Ibre/FGV, referindo-se à garantia de retorno, a qualquer tempo, das operações com títulos do governo.

    Segundo Rocca, o endividamento do governo via emissão de títulos cresceu 19,8% em 2015. E as operações de curtíssimo prazo do BC, as compromissadas, 12,9%.

    Segundo a consultoria Austin Asis, as aplicações em títulos de 115 instituições financeiras chegaram a R$ 2,7 bilhões no fim de 2015, quase 40% do ativo total delas.

    O ESTADO QUER CRÉDITO

    OFERTA

    A voracidade estatal na demanda por financiamento foi acompanhada por um avanço público também do lado da oferta de crédito. Os bancos estatais, que em 2007 concediam um terço do volume emprestado, passaram a responder por 56% em 2015.

    O principal motor desse aumento foram as linhas de crédito que ou obedecem a regras do governo ou são subsidiadas pelo Tesouro, o chamado crédito direcionado.

    São os empréstimos para casa própria, os do BNDES e os voltados ao setor rural.

    Em 2007, esse crédito respondia por um terço do saldo de empréstimos na economia, segundo dados do BC. Em 2015, a cifra saltou a 49%.

    Segundo Carlos Rocca, do Centro de Estudos do Instituto Ibmec, se o papel estatal na oferta de crédito se somar ao apetite público por financiamento, chega-se à conclusão de que o Estado "comandava" quase três quartos do estoque de dívida em 2015. Em 2007, o percentual era de 56%.

    "A alocação de recursos pelo setor público está em discussão neste momento no país, como os recursos destinados ao BNDES. Ao mesmo tempo em que a participação do banco aumentou, o investimento caiu. A recente intervenção do governo não tem sido exatamente um brilho", diz Rocca.

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