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    Análise

    Justiça tem de ser coesa e ir além de 'castiguinhos digitais'

    PATRICIA PECK PINHEIRO
    DE ESPECIAL PARA A FOLHA

    03/05/2016 02h00

    Yasuyoshi Chiba/AFP
    Justiça determina bloqueio do WhatsApp
    Justiça determina bloqueio do WhatsApp

    Temos assistido a um verdadeiro duelo entre empresas privadas de tecnologia e as autoridades públicas, não só no Brasil como em outros países.

    Entre as polêmicas, estão os episódios envolvendo a solicitação da Justiça dos EUA para que a Apple quebrasse a criptografia do iPhone e os casos do Judiciário nacional suspendendo o WhatsApp devido à falta de colaboração no fornecimento de provas.

    E no meio dessa medição de forças fica o usuário, à mercê dos resultados que possam advir da dificuldade de harmonizar o diálogo entre a segurança pública e a liberdade individual.

    Independentemente da lei à qual estejamos submetidos, é imprescindível que se encontrem medidas razoáveis que sejam menos prejudiciais ao usuário. No entanto, sob o mesmo manto da proteção da privacidade não se pode apoiar nem esconder a atuação de quadrilhas de crime organizado, que vão do tráfico de entorpecentes à pedofilia.

    Parece uma equação difícil de encontrar o equilíbrio se não envolver solução mais participativa de todos os entes: Estado, empresas de tecnologia, operadoras de telefonia e sociedade civil (representante dos usuários).

    A discussão da CPI dos Crimes Cibernéticos trouxe justamente uma recomendação importante: a necessidade de criação de Varas Especializadas, pois os assuntos são extremamente técnicos e exigem atualização e capacitação dos operadores do direito.

    Uma simples investigação de um caso que envolva uma conduta delituosa em que as evidências ficaram documentadas via diálogos, vídeos, áudios ou fotos que foram trocadas por WhatsApp já exige que a autoridade possa compreender peculiaridades relacionadas, por exemplo, ao tipo de dispositivo, qual sistema operacional, onde estavam as informações (localmente ou em algum backup na nuvem) e se estava habilitada geolocalização.

    E, para cada uma dessas possibilidades, há uma medida legal a ser tomada, uma ordem judicial a ser disparada, com celeridade.

    Considerando a proximidade da Olimpíada e o estado de alerta de segurança que vivemos, há necessidade de coordenar um plano de ação estratégico, em que cada parte possa colaborar no que lhe diz respeito, dentro da lei, para que possamos pegar os criminosos sem prejudicar o usuário. E isso deve ser implementado com uma visão macro, e não no caso a caso isolado.

    O WhatsApp já recebeu aplicação de multa, já foi suspenso mais de uma vez, já teve seu executivo preso no país, o que mais vem por aí? Pela previsão da Lei do Marco Civil da Internet, só falta aplicar a punição de suspensão definitiva dos serviços, mas será que esse é o caminho sustentável?

    O Judiciário precisa agir como um corpo coeso, ir além de medidas paliativas, de "castiguinhos digitais", que acabam por gerar danos colaterais. Por mais que o fim seja justo, se o meio estiver sendo desproporcional e gerando um grande prejuízo à coletividade, há algo de errado.

    Temos de buscar uma fórmula para que possa ser aplicar a lei alcançando o seu fim maior, que é o bem-estar social geral, equilibrando a solução do caso concreto (isolado), que cada vez mais vai exigir que as empresas apresentem provas digitais para o Judiciário e que este esteja capacitado para lidar com esses novos cenários tecnológicos mais complexos, mas buscando a melhoria geral de garantir uma internet livre.

    Nada mais é que uma internet de qualidade, com conectividade e segurança, em que não haja uma surpresa a cada momento, que gera insegurança social e jurídica.

    A ideia é prezar por serviços e modelos que garan- tam estabilidade, e não deixar que haja a incerteza de que a qualquer momento se possa ficar sem um serviço digital, ou sem a internet, seja por vontade de uma empresa privada ou por uma ordem judicial.

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