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    Antigas de verdade, barbearias aproveitam a onda de salões retrô

    DIEGO IWATA LIMA
    DE SÃO PAULO

    22/05/2016 01h00

    A cadeira Ferrante e o globo para aquecer toalhas de rosto têm 72 anos de idade, dois a mais que João Correia, 70, barbeiro na rua Tavares Bastos, Vila Pompeia, zona oeste da capital.

    O nome Barbearia do João surgiu quando, um dia, perguntaram o que ele queria escrito numa leva de cartões de visitas que mandara confeccionar para o negócio.

    Correia só aceita dinheiro ou cheque. Não marca horário por telefone, não oferece nenhuma bebida. No máximo, acompanha o seu freguês até a lanchonete da esquina para um café rápido. E cada um paga o seu.

    Mas, há 53 anos, ele sempre tem clientes, que desembolsam, atualmente, R$ 50 pelo corte de cabelo e R$ 33 para ter a barba feita.

    E, de uns tempos para cá, além dos fregueses de longa data, seus contemporâneos, ele passou a atender um público bem mais jovem.

    "Eles vêm aqui para aparar e desenhar a barba", diz.

    Correia e outros barbeiros antigos da região investem pouco ou nada em marketing e decoração. Mas viram suas clientelas crescerem nos últimos três anos, no embalo do surgimento de várias barbearias no estilo vintage.

    "Acho que eles vêm aqui porque a gente é naturalmente retrô, né? Não forçamos nada", diz Izaias Reis, 52, que atua há 23 anos em um salão na rua Padre Chico, também na Vila Pompeia.
    Reis e Correia decidiram encarar a concorrência com os salões retrô, da vizinhança e de outros bairros, na base da inércia, apenas sendo eles mesmos. E dizem acreditar que a tática deu certo.

    "Um dos nossos atrativos é que conseguimos cobrar preços mais baixos", diz Reis.

    O corte de cabelo em seu salão custa R$ 40 e a barba, R$ 35. Em um dos salões mais modernos, os preços podem chegar a R$ 80 e 70, respectivamente.

    MEIO-TERMO

    João Mattos, 73, lembra dos anos 1980 e 1990 sem muita saudade. Foi a época em que os salões unissex ganharam o mercado. Ele acompanhou a tendência a contragosto.

    "Naquele tempo, chamar alguém de barbeiro era quase um xingamento. O negócio era ser cabeleireiro", diz.

    Graças à proliferação das barbearias modernas com ares antigos, ele vê hoje a volta da boa fama do ofício, que abraçou há 50 anos.

    Mattos decidiu repaginar levemente seu salão quando percebeu que o número de clientes que o procuravam para ter a barba feita ou aparada começou a crescer, sem que ele fizesse esforço.

    Há cerca de um ano, o rebatizado The Mattos ganhou grafites e quadros com alusão aos anos 1950 e 1960 nas paredes, que eram integralmente brancas.

    Ele também passou a oferecer conexão de internet wi-fi para os clientes e criou uma página no Facebook.

    A virada para a modernidade retrô foi consumada quando Rafael Prado, 25, foi trabalhar no salão.

    "Eu parei para cortar o cabelo, disse que era cabeleireiro e que queria trabalhar. O Mattos me ofereceu a vaga", conta Prado, especialista em barbas do salão.

    Com a chegada do funcionário e a mudança na decoração, o movimento aumentou, conta Mattos, que cobra os mesmos R$ 55 para cortar cabelo ou aparar barbas.

    ORIGENS

    Para Andrezza Torres, 39, coordenadora nacional de beleza e estética no Sebrae, o aumento de público nos salões antigos faz parte do movimento mais amplo de valorização desse tipo de serviço.

    "Quando uma parcela da população masculina mais jovem aumentou seu interesse por estética, fez com que outras faixas etárias também se interessassem. E as diferentes idades e perfis de público acabam beneficiando todos os tipos de salões", diz.

    Torres atribui a busca dos jovens pelos estabelecimentos mais tradicionais também ao interesse deles pela origem do que hoje é tendência.

    "Os millennials, nascidos entre 1980 e 2000, gostam de experimentar o antigo, conhecer o que inspirou as modas que eles vivenciam hoje. Para eles, ir a um salão antigo é também uma forma de adquirir conhecimento."

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