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    Brasil não entrar em mega-acordo será chance perdida, diz especialista

    ISABEL FLECK
    DE SÃO PAULO

    11/06/2016 02h00

    Danilo Verpa 02.06.2016/Folhapress
    O professor da Universidade de Georgetown Michael Gadbaw, em São Paulo, SP
    O professor da Universidade de Georgetown Michael Gadbaw, em São Paulo, SP

    Para o especialista em regulação de mercados globais da Universidade Georgetown Michael Gadbaw, a crise enfrentada hoje pelo Brasil se assemelha ao cenário dos EUA após a renúncia de Richard Nixon, em 1974.

    "O comércio, as negociações internacionais nos ajudaram a achar um caminho para sair da nossa crise política", disse Gadbaw, 68, durante visita a São Paulo, sugerindo que esse pode ser um caminho para o Brasil.

    O país deveria, inclusive, aproveitar o momento, segundo o especialista, para avaliar suas opções diante de mega-acordos como a Parceria Transpacífico (TPP, na sigla em inglês). Para ele, não participar de alguma forma do tratado seria uma "oportunidade perdida".

    Folha - O sr. veio ao Brasil em um momento de crise. O que esperava encontrar e qual sua avaliação do atual cenário?

    Michael Gadbaw - Eu tinha o receio de que essa não era uma boa hora para vir ao Brasil e falar de mercado. Mas o que me surpreendeu é o quanto o Brasil de 2016 se parece os EUA em 1975, quando nós é que estávamos em crise: o presidente [Richard] Nixon havia sofrido um processo de impeachment [ele depois renunciou], tínhamos escândalos políticos, tínhamos turbulência cambial. E o comércio, as negociações internacionais nos ajudaram a achar um caminho para sair da nossa crise política, mantendo o foco em como poderíamos nos relacionar com outros países. Isso [a crise] pode ser um catalisador, uma oportunidade para mudar e nos tornar mais competitivos.

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    Essa fórmula serviria para o Brasil?

    O que ouço por aqui é que as pessoas querem que essa crise seja, como foi nos EUA em 75, uma oportunidade para rever como governamos e lidamos com nossos problemas domésticos, econômicos e políticos. Acho que é útil para o Brasil olhar a nossa experiência como um caminho possível –não posso dizer se é o melhor caminho, isso são os brasileiros que vão julgar.

    O governo de Michel Temer não deixa clara sua intenção em relação a mega-acordos como a TPP. Quais os riscos que um país como o Brasil corre ao se integrar à TPP?

    Se o Brasil entrar ou não, será afetado pela TPP, porque já está comercializando e investindo nos países da TPP. A questão é como gerenciar esses efeitos. Se você olha o volume de comércio em bens e serviços, o Brasil não tem uma grande participação nesses mercados como deveria tendo em vista o tamanho de sua economia. Então o Brasil está aproveitando menos do que poderia os benefícios de uma maior integração.

    Se o Brasil permanecer de fora desses mega-acordos, há um risco de isolamento?

    Não é isolamento, é oportunidade perdida. O grande efeito da TPP é que haverá criação de comércio entre seus países e em países que estão integrados ao tratado, como a Europa. E, se você não faz parte, não fará parte da criação desse comércio. Além disso, o Brasil já vende para alguns desses mercados, no qual outro membro da TPP deverá ter agora melhor acesso.

    O novo chanceler brasileiro, José Serra, disse que o Brasil não restringirá sua ação aos esforços multilaterais no âmbito da OMC e investirá em comércio bilateral. Relações multi, pluri e bilaterais são compatíveis?

    Sim. Acho, por exemplo, que temos que trazer a TPP para dentro da OMC. É preciso encontrar uma forma que a TPP fortaleça a OMC, e não a enfraqueça, e que aponte um caminho para a integração global, o que não é fácil.

    Qual é o futuro da OMC?

    A OMC é muito importante, tem claramente um futuro em manter o sistema e manter os compromissos dos países. O Roberto Azevêdo [diretor-geral do organismo] está muito empenhado em fazer a OMC significativa, mas também acho que os Brics têm responsabilidade de mostrarem liderança na OMC.

    Como o sr. vê os esforços para um acordo de livre comércio entre UE e Mercosul?

    É totalmente natural que os países queiram trabalhar com seus vizinhos quando se fala de liberalização do comércio, porque são os parceiros mais óbvios. Entendo esse impulso [do Brasil com o Mercosul]. Mas a questão é: está sendo feito progresso suficiente? O Brasil poderia ter mais resposta se olhasse para partes do mundo mais dinâmicas e de maior crescimento? Gostaria de ver o Brasil encontrar a vontade política e os recursos para se envolver mais com os EUA, a Europa, outros países da TPP, porque há oportunidades ali das quais poderia se beneficiar.

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    RAIO-X MICHAEL GADBAW

    CARGO
    Leciona regulação global na Universidade Georgetown

    FORMAÇÃO
    Estudou na Universidade Fordham e tem mestrado pela Fletcher School of Law and Diplomacy

    CARREIRA
    Trabalhou nos anos 70 no Tesouro americano. Foi vice-presidente da General Electric de 1990 a 2008

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