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    Incentivos serão revistos depois que a crise passar, diz chefe do Tesouro

    VALDO CRUZ
    DE BRASÍLIA
    JULIANNA SOFIA
    DE COORDENADORA DE ECONOMIA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

    07/07/2016 02h00

    Alan Marques/Folhapress
    BRASÍLIA, DF, BRASIL, 05.07.2016. A secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, dá entrevista exclusiva para a Folha sobre a política econômica do governo Michel Temer.(FOTO Alan Marques/ Folhapress) PODER
    A secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, dá entrevista sobre a política econômica do governo Temer

    A secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, indicou que o governo vai esperar o país sair da crise para reavaliar subsídios e incentivos concedidos nos últimos anos para estimular a atividade econômica, como a desoneração da folha de pagamento de setores da indústria.

    Em entrevista à Folha, ela disse que a lista de incentivos a examinar é ampla e inclui benefícios tributários como a desoneração, que reduziu as receitas da Previdência Social. "Tem uma agenda extensa, que precisa ser percorrida, criando instrumentos para que a gente cumpra a medida de limitação de gastos."

    Aos 46 anos, a capixaba, que ganhou notoriedade ao promover um duro ajuste fiscal nas contas do Espírito Santo, rebate as críticas de que o governo do presidente interino, Michel Temer, tem adotado medidas de ampliação de gastos, apesar do discurso de austeridade fiscal.

    Para a secretária, é possível aprovar ainda neste ano uma reforma da Previdência no Congresso. Ela é contra estender a municípios endividados os benefícios concedidos aos Estados. Seria um "abraço de afogados", disse.

    *

    Folha - O governo vai rever as desonerações para reduzir o rombo nas contas públicas?

    Ana Paula Vescovi - A revisão de programas que estão assentados em desonerações virá à pauta de discussões, tempestivamente, na hora certa.

    Desoneração da folha?

    Falo de forma geral, de todos os programas que podem ser melhorados ou revistos.

    Qual outro além desse?

    A lista é ampla, vasta, isso tudo precisa passar por estudos. Inclui política de subsídios, subvenções... E que a gente faça isso muito assentado em processos de avaliação de impacto e de resultados que possam dar base concreta para revisão destes programas. Tem uma agenda extensa, que precisa ser percorrida, criando instrumentos para que a gente cumpra a medida de limitação de gastos.

    Na revisão da desoneração da folha, a tendência é haver resistência do empresariado.

    Quando falo desse processo de revisão dos programas, em termos gerais, de subsídios e subvenções, falo ao longo do tempo, nada que seja para amanhã. Quem sabe na saída da crise, quando tivermos condições de fazer uma revisão em bases mais sólidas. Tem de ser ao longo do tempo, não tem nada para ser firmado no próximo ano.

    Qual será a nova meta fiscal do governo?

    A expectativa é que tenhamos novamente um número que mereça confiança do mercado, crível, pé no chão. Um número que traga uma meta que seja cumprida. O grande esforço hoje é recuperar a confiança e a credibilidade do mercado na condução da política fiscal.

    O mercado gostaria de algo na casa dos R$ 150 bilhões.

    Temos uma construção que primeiro visa o longo prazo, o estrutural, uma proposta de teto de gastos públicos, que estabelece um crescimento real zero nos próximos anos.

    Para que cumpramos essa medida de contenção de gastos, vamos precisar de instrumentos. Então, discutimos a reforma da Previdência e outras que sejam necessárias. Temos que construir medidas adicionais complementares, medidas de receita.

    O Brasil precisa voltar a uma agenda muito firme no campo das parcerias públicas privadas, das concessões, das privatizações, das desmobilizações de ativos, com vistas a criar recursos, fontes para investimentos. Precisamos melhorar o ambiente de negócios. Isso passa por um fortalecimento das agências reguladoras, melhorar marcos regulatórios.

    Está em discussão acabar com o abono salarial, por exemplo?

    Existe uma avaliação sobre o programa, que precisa ser feita, e uma discussão que precisa ser trazida para a sociedade. Temos vários programas que foram sendo instituídos e ao longo do tempo foram se somando em camadas. Temos de voltar a focar na avaliação de impacto, para responder à seguinte pergunta: este programa atende a seu objetivo original? Essa é a base para discuti-los e sugerir aperfeiçoamento.

    A meta do governo é ter um deficit menor este ano do que no anterior. E em 2018 menor que em 2017.

    Precisamos construir o que chamamos de consolidação fiscal. Temos uma diretriz forte de ter a cada ano uma meta melhor. E sinalizar isso para a sociedade como um todo.

    E a Previdência, que hoje é uma das maiores despesas do governo. Acha possível aprovar uma reforma neste ano?

    Temos expectativa de que é bem viável aprovar ainda este ano. As discussões estão postas e precisam ser construídas de uma forma que nos leve a um bom processo no Congresso. Isso é bom para o Brasil. Alivia a trajetória das contas públicas, traz para o sistema de Previdência como um todo uma viabilidade maior, solvência financeira.

    Os prefeitos falam em seguir o caminho dos governadores e entrar no STF para forçar uma renegociação da dívida.

    Não temos mais espaço fiscal [para atendê-los]. A meta precisa ser cumprida e será cumprida. Os municípios foram atendidos previamente aos Estados. Foi a primeira rodada, quando houve a aprovação da lei complementar que renegociou todos os indexadores da dívida. Os maiores beneficiados foram os municípios. A redução do estoque da dívida deles foi de 65%. Precisamos evitar o abraço dos afogados e fechar esse ciclo de renegociações para voltar a crescer.

    O governo é criticado por falta de coerência entre o discurso e a prática na área fiscal.

    Esta leitura não pode ser feita. É um governo que se inicia de forma interina, ainda aguardando uma decisão constitucional de um processo que está em curso, mas com acordos que já vinham sendo firmados desde o início do ciclo de gestão.

    Temos o mesmo Congresso, os mesmos atores. Mudou o governo. Esses acordos [que deram aumentos ao funcionalismo] já vinham [sendo discutidos]. Se você olhar as pesquisas sobre reajustes [salariais] que estão sendo concedidos no setor privado, temos clareza de que o governo fechou um bom acordo.

    Qual seria a escada ideal para queda do deficit da União, forte, gradual, mais lenta?

    A escadinha ideal é aquela que é crível, responsável, que pode ser cumprida e trazer de volta o crescimento do país. Em breve teremos uma agenda mais positiva, todo esse esforço de construção de medidas estruturais, de longo prazo, tenho certeza de que isso será bem acolhido, vai trazer mais confiança. Independentemente do timing da aprovação da proposta de teto dos gastos no Congresso, já vamos fazer o Orçamento de 2017 baseado nele.

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    RAIO-X ANA PAULA VESCOVI, 46

    Nascimento
    Colatina (ES). Casada, tem dois filhos

    Formação
    Economista e mestre em economia e em administração

    Cargos
    De 1997 a 2007 trabalhou na Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda. Foi assessora econômica do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) de 2011 a 2014. Antes de ir para o Tesouro, era secretária de Fazenda do ES.

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