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    Para burlar fisco, brasileiros cogitam comprar diamantes e mudar de país

    JOANA CUNHA
    DE SÃO PAULO

    09/09/2016 02h00

    Divulgação
    Diamantes produzidos a partir de fios de cabelo
    Uma ideia seria tirar dinheiro do banco, comprar diamantes e tentar entrar discretamente no Brasil

    Brasileiros que mantiveram dinheiro ilegalmente no exterior nos últimos anos ainda procuram saídas para burlar a Receita Federal, apesar do programa de anistia lançado pelo governo no primeiro semestre.

    Porém, desde as mais trabalhosas, como mudar do Brasil, até as mais criativas, como comprar diamantes, as alternativas cogitadas não servem para tirar o dinheiro da ilegalidade, alertam advogados e o fisco.

    O programa permite a regularização de recursos de origem lícita que estejam no exterior, mas não tenham sido declarados à Receita, desde que seu dono pague 15% de imposto e 15% de multa. Assim, ele pode ser perdoado de crimes como evasão de divisas, lavagem de dinheiro e sonegação.

    Advogados relatam que alguns clientes os questionam na tentativa de fugir da declaração. "Doutor, e se eu tirar todo o dinheiro do banco e comprar diamantes?", perguntou recentemente um cliente ao advogado Fabrício Dantas, sócio do escritório Vinhas e Redenschi.

    A intenção seria colocar as pedras nos bolsos para entrar discretamente no Brasil sem ter de pagar tributo e multa.

    "Não existe solução mágica", afirma Dantas.

    Se for pega pela Receita ao desembarcar no país, a pessoa pode perder o bem. Ainda que escape sem declarar, quando esse diamante for vendido no futuro, pode ser considerado contrabando.

    E se eu comprasse diamantes? - Brasileiros com dinheiro ilegal buscam saídas para escapar do fisco

    NEGAÇÃO

    "As pessoas precisam sair da fase de negação", diz Dantas. O prazo para o fim das declarações, 31 de outubro, já é considerado apertado por especialistas devido à complexidade do procedimento.

    Seguindo o raciocínio de zerar a conta no exterior para não ter o que declarar, o advogado também ouviu de um cliente que tinha um saldo menor a sugestão de gastar tudo em bolsas e sapatos.

    Segundo ele, não adianta tentar driblar o fisco começando agora a comprar qualquer tipo de bem, porque a lei fixa como base de cálculo a data de 31/12/2014. E, ainda que o valor tenha sido consumido, ele pode ser autuado.

    A partir deste mês, o Brasil começa a fazer parte de uma rede internacional de troca de informações fiscais com mais de cem países. A convenção passará a ser aplicada em janeiro, mas o intercâmbio de dados pode alcançar períodos anteriores se houver entendimento entre os países, segundo a Receita.

    As ferramentas se sofisticarão com o tempo. Brasil e Suíça, por exemplo, se comprometem a realizar troca automática a partir de 2018.

    "Com o avanço desse intercâmbio sobre movimentações bancárias, estruturas que antes eram consideradas seguras, como "offshores" [empresas abertas em paraísos fiscais] e trusts [fundações que administram recursos de terceiros], hoje se tornaram primárias para investigações realizadas pelas autoridades. O mundo evoluiu", diz Dantas.

    DOMICÍLIO FISCAL

    Luiz Bichara, sócio do Bichara Advogados, conta que a pergunta mais comum que ouve dos seus clientes é se seria necessário fazer a declaração caso eles deixassem de morar no Brasil. No entanto, ele diz que a Receita tem demonstrado que vai recrudescer a fiscalização de quem deixar de ser residente.

    Ana Utumi, do TozziniFreire Advogados, também não recomenda. "Isso não resolve o passado. Ao deixar o Brasil, é preciso entregar a declaração de saída definitiva e só depois começa a contar a prescrição tributária. Para os crimes de evasão e lavagem, a prescrição é maior", diz.

    Na lista de subterfúgios para tentar continuar fraudando o fisco aparece também a doação. Ana Martins, do Tauil & Chequer Advogados, diz que um de seus clientes perguntou se poderia deixar de declarar caso doasse o dinheiro mantido no exterior ao filho que mora na Inglaterra.

    "Tem de declarar doação. Não adianta. Além dos acordos internacionais, a Receita pode ter acesso aos dados até por meios até inesperados, como delações ou a divulgação do Panamá Papers."

    Revelado em abril, o caso Panamá Papers foi o vazamento de milhões de documentos de um escritório de advocacia, mostrando como algumas das pessoas mais ricas do mundo usaram empresas "offshore" para evitar impostos e lavar dinheiro.

    Mais uma escapatória cogitada é mover os recursos para destinos no Oriente Médio ou na Ásia que ainda não tenham estruturas fortalecidas de troca internacional de informações fiscais, segundo Fabrício Dantas. O advogado ressalta os riscos da ação.

    "São estruturas sem segurança jurídica, democracias que não são sólidas. A fazer isso, é melhor rezar", alerta o especialista.

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