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    'Não somos próximos a partido nenhum', afirma dono da JBS

    RENATA AGOSTINI
    ENVIADA ESPECIAL A PARIS

    19/10/2016 02h00

    Fabio Braga - 17.JUL.15/Folhapress
    SAO PAULO, SP, BRASIL, 17-07-2015: O presidente da JBS, Wesley Batista, 45, durante entrevista exclusiva para a Folha de S.Paulo. (Foto: Fabio Braga/Folhapress, MERCADO)***EXCLUSIVO***.
    O presidente da JBS, Wesley Batista

    É meio-dia em Paris e o empresário Wesley Batista, presidente da JBS, interrompe o vaivém no estande da empresa para almoçar. Beberica uma caipirinha ("com vodca, por favor") e belisca uma picanha brasileira enquanto emenda um assunto no outro.

    Fala sobre economia ("o fundo do poço já passou"), a ex-presidente Dilma Rousseff ("estava ficando insustentável") e o governo Michel Temer ("se fizer as reformas, será um legado extraordinário").

    Batista, 46, está à vontade. Uma das maiores empresas de alimentos do mundo, com R$ 160 bilhões de faturamento e fábricas em 18 países, a JBS é destaque na principal feira da indústria, que ocorre a cada dois anos na França.

    O desassossego aparece ao ser questionado sobre sua proximidade com o PT. "É uma lenda urbana ridícula", diz. Nesta entrevista, ele argumenta que sua empresa se relaciona com todos os partidos.

    "Não fomos e não somos muito próximos a partido nenhum", diz. Em 2014, a JBS doou R$ 400 milhões a campanhas eleitorais. O PT foi o mais beneficiado, com R$ 122 milhões. Mas houve transferências para outras 23 siglas, incluindo PSDB e PMDB, cada um com R$ 60 milhões.

    O empresário diz ter sido surpreendido pela Operação Greenfield, que investiga investimentos feitos por fundos de pensão em empresas como a Eldorado Celulose, que a família Batista controla. Segundo ele, é um "negócio honesto, que gera riqueza".

    *

    RETOMADA

    O fundo do poço já passou. O segundo trimestre [deste ano] foi o fundo. Estamos começando a sentir uma retomada, em que pese que ela ainda vá ser lenta. Não é nada que você fale "uau". O ser humano vive de expectativa. É uma onda. E do mesmo jeito que contamina do lado negativo, contamina do positivo. Com o ganho de confiança é que você começa a criar uma dinâmica positiva. Acho que estamos nessa.

    RECESSÃO

    No nosso setor, sentimos menos. Mesmo indo para classes sociais de menor renda, a alimentação demora mais a cair. Começamos a sentir as pessoas trocando produtos mais caros por mais baratos no final do ano passado e no começo desse ano. Começamos [agora] a ver a venda melhorar um pouco. Mas, de novo, não é nada expressivo.

    GOVERNO TEMER

    A direção é positiva. Está com a agenda correta. Se o governo não tirar o foco e seguir no caminho que está indo, estamos otimistas. Dificuldade para fazer reforma sempre existiu em qualquer lugar do mundo. Se o governo Temer conseguir as reformas que estão na agenda, vai ser um legado extraordinário que ele deixará como governante e como governo. Ele não vai ver nada do resultado disso, mas o país vai ver.

    EXECUÇÃO

    Não dá para fazer tudo ao mesmo tempo. Isso é uma realidade. Se o governo Temer em 2017 e em 2018 conseguir o ajuste fiscal, as reformas previdenciária, trabalhista e mais alguma coisa de tributária, será um grande avanço. Acho que dá. Até a primeira metade de 2017, previdenciária. Na segunda, a trabalhista. E ainda sobra 2018 para fazer alguma coisa tributária. O que o governo está falando e se propondo a fazer não é novidade nenhuma. Agora, entre falar e fazer tem diferença gigantesca. O governo que está aí acredito que vai fazer isso. Essa é a grande diferença.

    INDÚSTRIA DA RECLAMAÇÃO

    O Brasil não pode mais conviver com uma instabilidade trabalhista como a que vive. Nos EUA, temos cinco pessoas no departamento jurídico e 35 processos. No Brasil, cem pessoas no jurídico e o número de processos não vou nem falar. Milhares. Não tem contrapartida negativa para quem faz uma reclamação. O incentivo é desigual. Criou-se uma indústria da reclamação trabalhista. E da insegurança. Temos fábrica em cidade que não há transporte coletivo. Você faz, como beneficio, um ônibus que roda a cidade pegando as pessoas. Aí temos centenas de ações trabalhistas. O cara aciona porque a hora [de trabalho] conta quando ele entrou no ônibus. Falta clareza na lei.

    GOVERNO DILMA

    Chegou num ponto que estava ficando insustentável. O governo, para fazer uma agenda dessa [de reformas], tem que ter base política forte, tem que ter confiança da sociedade, da economia. Do jeito que estava indo, acho que era impossível fazer.

    IMPEACHMENT

    Não é uma discussão se tinha que trocar. O tema é se a troca tinha legitimidade ou base legal. Aí é um debate que eu não sei. Não dou opinião nenhuma nisso. É um tema de quem conhece a matéria jurídica. Fico vendo o povo falar e pouca gente tem o mínimo de fundamento para opinar de verdade. Acho que o impeachment foi péssimo. Qualquer processo como esse é ruim para qualquer país. Falar que foi bom? De jeito nenhum.

    PATO

    Não é a melhor coisa para um país quando o empresário começa a tomar lado. A Fiesp ter tomado lado não necessariamente representa o nosso lado. Acho que você elitiza a discussão quando indústria ou quando algum setor da sociedade toma lado. É ruim [quando Paulo Skaf, presidente da Fiesp, apoia o impeachment]. Não é coisa para entidade de classe. É coisa para entidade popular, para o cidadão. Tem sido muito ruim para o Brasil as entidades de classe politizadas. Para mim, tinha que ser proibido qualquer representante de entidade de classe ter partido, ser filiado a partido politico.

    RELAÇÃO COM O PT

    É a lenda urbana mais triste que tem no país. No Brasil, existe uma mania e uma cultura ruim de se atrelar progresso a alguma coisa. Nós temos dificuldade em admitir que você pode progredir ou ter sucesso sem ter sido ajudado por alguém. Não fomos e não somos muito próximos a partido nenhum. Nós carregamos um carma de fazer parte daqueles campeões nacionais eleitos pelo governo do PT. Quem se deu ao mínimo de trabalho de ir lá e analisar e estudar vai ver que isso é uma lenda urbana ridícula. O BNDES investiu na JBS, no Marfrig, no Bertin e no Independência. Que escolhido é esse que fomos? A gente fica triste com isso. Conhecemos todos os partidos. Não temos ligação aí. Primeiro, a JBS não tem um centavo de dívida com o BNDES. Já vi pessoas falando que a JBS recebe dinheiro a juros subsidiados. Segundo, a JBS fez o maior IPO [abertura de capital] da Bolsa brasileira até o ano de 2007 sem participação do BNDES. O banco foi importante? Claro que foi. Qualquer sócio que acredita em você de forma mais relevante é importante na sua vida. O BNDES tem um braço que se chama BNDESPar. Ele só existe para isso. Se a sociedade acha que isso não deve existir, é outra discussão. Nos fundos é a mesma coisa. Previ [fundo dos funcionários do BB], Petros [dos da Petrobras], Funcef [dos da Caixa] têm investimento em renda fixa e em renda variável. É assim no mundo inteiro.

    OPERAÇÃO GREENFIELD

    Não tem nada a ver com a JBS. É um negócio [Eldorado, empresa de celulose da holding J&F] que é um investimento de sucesso. Não é dinheiro que foi desviado para outra finalidade. Temos uma fábrica extraordinária, que o grupo investiu ao redor de R$ 10 bilhões. Investiu acreditando no país. Os fundos investiram e hoje tem um belo resultado. É lucrativo. Entrou num pacote de investimentos dos fundos em FIP e fomos no meio. É um negócio honesto, que gera riqueza. É difícil até de debater. Jamais passou pela cabeça nossa que algum dia um investimento como esse poderia ser questionado.

    CONDUÇÃO COERCITIVA

    Acho que quando você não deve não tem problema nenhum. É meio natural. Quando você deve alguma coisa, fica mais receoso. Lógico que não é um negócio agradável a empresa estar envolvida ou nós [ele e o irmão Joesley Batista, presidente da J&F] termos sido envolvidos. Fui lá, falei o que sabia, o que era a verdade. Para a empresa, é ruim. A impressão que fica é que você está errado. Você é meio condenado antes de se explicar.

    REESTRUTURAÇÃO

    A JBS é muito mais multinacional do que muitas multinacionais. Mas não conseguimos ser vistos pelos "stakeholders" como multinacional. Então pagamos custo de dinheiro não condizente com uma multinacional. Recentemente, surgiu o negócio da questão fiscal. Ah, a Irlanda foi decretada paraíso fiscal. Não tem nada a ver. É só olhar na organização. Estamos com nossa sede fiscal na Inglaterra. É uma empresa irlandesa com sede fiscal na Inglaterra e com ação em Nova York. Normal. Às vezes, tenho caixa sobrando na Austrália. E tenho uma subsidiária na Argentina que está perdendo dinheiro lá faz muito tempo. Essa estrutura é que melhor dá condição de fazer esse fluxo de capital se mover [pelos acordos entre os países]. O ICMS não tem nada a ver com isso, o Imposto de Renda não tem nada a ver. Do ponto de vista fiscal, não mudou nada.

    AQUISIÇÕES

    De agora até o fim de 2017, nosso foco não é aquisição. É consolidar tudo o que nós fizemos. Fizemos muitas aquisições nos últimos anos.

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