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    Cifras & Letras

    Crítica

    Livro investiga motivos do atraso no desenvolvimento brasileiro

    ÉRICA FRAGA
    DE SÃO PAULO

    07/01/2017 02h00

    Apu Gomes - 18.ago.2011/Folhapress
    Alunos têm aula de português em sala de aula lotada, na zona sul de São Paulo em 2011
    Alunos têm aula de português em sala de aula lotada, na zona sul de São Paulo em 2011

    Por que o Brasil não se tornou um país desenvolvido como tantas nações, inclusive outras ex-colônias mundo afora?

    O economista Alexandre Rands Barros, sócio da consultoria Datamétrica e presidente do jornal "Diário de Pernambuco", tenta responder a essa pergunta no livro "Roots of Brazilian Relative Economic Backwardness".

    A investigação é baseada na construção de séries históricas inéditas e em bastante matemática. Seu ponto inicial é a comparação da evolução de indicadores brasileiros com os de países que conseguiram se desenvolver.

    A lista inclui outras ex-colônias, como Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, e nações do sul e do norte da Europa.

    Em 1820, a renda per capita brasileira era superior à da Austrália, da Nova Zelândia e da Grécia, diz o autor. No caso de Noruega, Finlândia e Canadá, o indicador –considerado uma importante medida de bem-estar– não era muito superior ao brasileiro.

    Foi ao longo do século 19 e das primeiras décadas do 20 que os demais países deixaram o Brasil para trás.

    A narrativa evolui para o que pode ter provocado o atraso e a conclusão do autor é que ele se explica pela lenta acumulação de capital humano, que abrange tanto habilidades cognitivas como traços da personalidade dos trabalhadores.

    Segundo os cálculos de Rands, a disponibilidade de capital humano e físico (como máquinas e equipamentos) responde por cerca de 90% das diferenças de renda per capita entre os países analisados. E, entre os dois fatores, o capital humano tem o papel mais relevante.

    O economista, doutor pela Universidade de Illinois (EUA), explica que a migração internacional de pessoas é mais lenta que a de máquinas, equipamentos e tecnologia. Esses últimos fatores, diz, normalmente são alocados de acordo com a disponibilidade da força de trabalho mais qualificada nos países.

    Por isso, a escolaridade e a qualidade da educação dos trabalhadores de uma nação são tão cruciais para seu desenvolvimento.

    A partir desse diagnóstico, o ensaio busca explicar as razões iniciais para o baixo estoque de capital humano no Brasil em relação aos países hoje avançados.

    O economista destaca que nações como Estados Unidos, Austrália e Canadá –outras ex-colônias– receberam um fluxo muito mais significativo de europeus qualificados do que as da América Latina.

    A partir dessa constatação, o livro discute o que impediu a reversão do quadro inicial de atraso no Brasil.

    TEORIAS

    O autor apresenta as principais teorias que se propuseram a explicar as causas do desenvolvimento econômico.

    Os estruturalistas ressaltavam a importância da indústria para o crescimento sustentado, afirmando que países exportadores de commodities são alvos de crises cíclicas que freiam seu avanço.

    Para Rands, a falha dessa corrente é evidenciada pelo fato de que o Brasil teve progresso industrial importante na segunda metade do século 20 sem que sua renda per capita convergisse para o nível de países desenvolvidos, embora tenha crescido.

    Há outra vertente teórica que afirma que são as instituições de um país –as regras do jogo vigentes na sociedade– que determinam seu potencial de crescimento.

    Embora reconheça que países avançados têm instituições que funcionam bem e apoiam seu crescimento, o autor conclui que elas não são o vetor fundamental do desenvolvimento, mas consequência do resultado de conflitos sociais.

    Esses choques entre interesses de diferentes grupos –identificados por outra vertente chamada teoria da dependência– seriam, na verdade, os grandes responsáveis pelo crescimento ou pelo atraso econômico, diz Rands.

    Para os teóricos da dependência, os governos locais e as elites dos países produtores de commodities se beneficiam dessa especialização, por isso não buscam alterar as forças que equilibram a economia.

    Rands vai além ao acrescentar que a questão é que são esses conflitos que permitem ou bloqueiam a adoção de políticas propulsoras da acumulação de fatores pró-crescimento, como o capital humano.

    Os capítulos finais do livro buscam demonstrar como os conflitos entre grupos de interesse não foram, na maior parte da história do Brasil, favoráveis aos investimentos públicos em educação.

    IMIGRANTES

    Esse equilíbrio começou a mudar, aponta Rands, com a chegada de imigrantes, em especial a partir do século 20.

    Ele demonstra como esse movimento foi acompanhado de um aumento relevante nas matrículas do ensino básico, mas ressalta que o movimento não foi suficiente para gerar o avanço educacional necessário para um aumento significativo da renda.

    A conclusão é que o desenvolvimento ainda está ao alcance do Brasil, mas não ocorrerá sem políticas que impulsionem de maneira mais significativa a escolaridade e a qualidade da educação.

    A questão que permanece é como alterar o balanço dos conflitos de interesse presentes na sociedade brasileira que impede o avanço na adoção dessas políticas.

    Roots of Brazilian Relative Economic Backwardness
    QUANTO: R$ 118 (LIVRO DIGITAL; 280 PÁGS.)
    AUTOR: ALEXANDRE RANDS
    EDITORA: ACADEMIC PRESS

    Edição impressa
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