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    Previdência

    60% da Câmara ignora e-mail sobre Previdência, indica teste da Folha

    ANA ESTELA DE SOUSA PINTO
    DE SÃO PAULO

    26/05/2017 14h54

    Reprodução
    Tela mostra controle do servidor indicando que as mensagens foram excluídas sem ser lidas
    Tela mostra controle do servidor indicando que mensagens enviadas a deputados foram excluídas sem ser lidas

    "Fale com o deputado", diz a página do site da Câmara que deveria facilitar o acesso dos eleitores aos deputados.

    A Folha tentou.

    Durante quatro semanas em que a reforma ainda estava tramitando no Congresso, em cinco tentativas, mandou e-mail para cada um dos 513 endereços eletrônicos fornecidos pela Câmara. O assunto dos e-mails era "mensagem de eleitor sobre a reforma da Previdência".

    Para evitar que fossem parados em programas antispam, os e-mails foram endereçados individualmente. A Câmara confirmou a entrega.

    Reprodução
    Página em que eleitor tem acesso, por e-mail, aos deputados
    Página em que eleitor tem acesso, por e-mail, aos deputados

    Mensagens também foram enviadas por meio de um servidor que permitiu monitorar a entrega. Todos chegaram.

    Só 16%, no entanto, receberam uma resposta. Quatro em cada dez não chegaram nem a ser vistos, e 17% dos gabinetes excluíram todas as cinco mensagens sem nem sequer lê-las.

    Com a deflagração da crise política após a divulgação da delação premiada da JBS, a tramitação da reforma foi interrompida.

    CANAL INEFICAZ

    O fracasso na tentativa de comunicação não indica necessariamente que os parlamentares estejam desatentos aos anseios da população. Mas mostra que a única via de acesso oficial disponível não leva ao destino desejado.

    Em parte, o problema é do próprio canal, mais suscetível ao uso de robôs que disparam centenas de milhares de mensagens idênticas.

    No total, a Câmara dos Deputados recebeu em fevereiro deste ano 1.481.292 mensagens encaminhadas aos e-mails públicos dos parlamentares (do tipo dep.nomedeputado@camara.leg.br). Desses, 40% foram bloqueados por suspeita de spam (mensagem não solicitada, como as disparadas pelos robôs) ou de conter vírus.

    fora do alvo - O destino das mensagens enviadas aos deputados pela Folha

    Segundo os administradores do sistema de e-mails da Câmara, entre 75% e 80% do que chega é descartado ou vai para a quarentena. Em fevereiro, foram liberadas 893.442 mensagens. As contas dos deputados enviaram 91.200 e-mails, pouco mais de 10% do volume recebido.

    ATAQUE DE ROBÔS

    O excesso de mensagens padrão é relatado por praticamente todos os gabinetes que responderam à Folha.

    Segundo eles, o volume cresce muito quando há votações de grande impacto social, como as reformas previdenciária e trabalhista.

    Como tais mensagens não requerem resposta, os assessores costumam só informar ao deputado a ocorrência e a dimensão das campanhas.

    antes tarde do que nunca - Maior parte das respostas veio na quinta tentativa

    Mesmo não sendo lidas nem respondidas, tais mensagens podem ter impacto.

    "Um e-mail não vai afetar a posição. Mas, se chegarem 2 milhões, ainda que parem no vácuo, cresce a chance de alguém perceber o movimento e alertar o deputado", diz a cientista política Andréa Freitas, coordenadora o Núcleo de Instituições Políticas e Eleições do Cebrap.

    Freitas, que pesquisa instituições políticas e padrões de interação entre o Executivo e o Legislativo, diz que o efeito da opinião pública sobre o representante político é diferente quando o tema em pauta tem repercussão.

    "Num projeto que afeta um conjunto pequeno de pessoas, o deputado decide praticamente sozinho, pensando no partido, no governo ou em outros atores relacionados com os recursos institucionais de que ele precisa para se manter na carreira."

    EM NOSSO NOME

    Lucio Bernardo Jr. - 24.mai.2017/Câmara dos Deputados/Divulgação
    Brasilia,DF,Brasil 24.05.2017 Tumulto no plenario da Camara durante sessao Foto: LUCIO BERNARDO JR/Agencia Camara ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Tumulto no plenário da Câmara após crise política gerada por delação da JBS

    Já os casos que mobilizam a sociedade exigem mais cuidado com a comunicação. Freitas ressalva que faz parte da democracia que os representantes tomem decisões em nosso nome. "Em tese, eles não têm que fazer o que o eleitor quer, mas o que fará mais bem ao país."

    Observação semelhante é feita pelo cientista político Fernando Limongi, professor da USP e também pesquisador do Cebrap. "Além disso, e-mail já caiu em desuso, e pode ser que os deputados usem outras redes sociais."

    Esses canais foram citados por vários dos gabinetes que responderam à Folha. Apesar da preferência, a Câmara não tem uma lista dos endereços dos parlamentares nas redes sociais, nem normas de como elas devem ser usadas para comunicação oficial.

    uns mais, uns menos - Respostas por partido

    Uma diferença importante entre a manifestação por e-mail ou por rede social é que no segundo caso tanto a demanda do eleitor quanto a eventual resposta são de conhecimento público.

    Mas as pesquisas são contraditórias sobre o impacto dessa comunicação sobre a atuação dos políticos, relata Freitas. "Ainda que a exposição seja maior, nas redes as pessoas costumam se relacionar com quem pensa parecido. Não há contraposição, só se prega aos convertidos."

    Limongi nota que em casos muito controversos a pressão da opinião pública pode dificultar que o deputado tome decisões cujo custo é alto no curto prazo -as chamadas trocas intertemporais, em que se impõe sacrifício no futuro imediato com a expectativa de um ganho recompensador no futuro mais longo.

    "Quanto mais perto a eleição, mais difícil de fazer esta troca", nota o pesquisador.

    "No limite, o eleitor sempre age depois, e pune ou recompensa o seu representante com base em um julgamento sobre seu desempenho."

    Confira aqui se seu representante respondeu à mensagem e como ele se relaciona com correspondências de eleitores.

    CANAL FECHADO - Gabinetes que não responderam às questões sobre comunicação com o eleitor

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