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    o brasil que dá certo - era digital

    Para professor da FGV, falta de capital causa atraso na inovação nacional

    MARCELO SOARES
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    26/05/2017 02h00

    Ao menos em produtos digitais para o consumidor final, o Brasil ainda fica devendo inovação, de acordo com Marcelo Coutinho, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas.

    Os principais casos de sucesso conhecidos ainda são exceções. Isso se deve ao grande gargalo que qualquer outro empreendedor enfrenta: falta capital. Segundo Coutinho, boa parte dos negócios digitais brasileiros faz apenas a adaptação local de negócios globais. A boa notícia, diz, é que universidades e mercado estão mais próximos.

    Mozart Gomes/CMSP
    Marcelo Coutinho, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da FGV
    Marcelo Coutinho, professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da FGV

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    Folha - Qual o cenário atual das empresas de tecnologia no país?
    Marcelo Coutinho - O Brasil é um país periférico na tecnologia e vai continuar assim por um bom tempo. A área de inovação digital sofre das mesmas dificuldades que o empreendedorismo em geral: o país é pouco amigo da inovação, desde a baixa disponibilidade de capital até a dificuldade de integrar a pesquisa acadêmica com as necessidades do mercado.
    O que tem aparecido de específico e que chama a atenção é principalmente o surgimento de empresas de inovação no setor financeiro. Isso não é surpresa, pois os bancos brasileiros estão na vanguarda da tecnologia desde que tiveram de lidar com a inflação altíssima dos anos 80. O grande burburinho acontece hoje na área de "fintech".
    Dada a forma de inserção do Brasil na economia mundial, é mais fácil que profissionais brasileiros ganhem importância global a partir de grandes empresas, como foi o caso do Hugo Barra [ex-vice-presidente do Android, no Google, e vice-presidente da Oculus, empresa de realidade virtual no Vale do Silício]. O sistema de inovação brasileiro não tem musculatura e disponibilidade de capital para crescer como se gostaria.

    Como estão as parcerias entre universidades e empresas para gerar inovação?
    O ambiente está mudando; já foi bem pior no Brasil. Havia desconfiança das universidades em relação às empresas e vice-versa. Esse panorama está se alterando, mas muitos pesquisadores de ponta acabam indo embora. Na Europa e no Vale do Silício, eles encontram ambientes muito mais propícios para desenvolvimento e inovação.
    Inovação não é algo que venha do zero, é um processo. É muito mais arriscado inovar do que continuar fazendo o que se faz, pois há baixa disponibilidade de capital. Então, o ambiente se caracteriza mais pelas exceções. Nossa tendência é de ter empresas de pequeno e médio porte que inovam para nacionalizar processos que já ocorrem lá fora. O sonho do inovador brasileiro é ser comprado por alguém no exterior. O paradigma no Brasil é o Buscapé [site de comparação de preços criado em 1999 e vendido para o grupo sul-africano Naspers dez anos depois].

    Entre as start-ups brasileiras, há alguma que se destaque?
    Temos o caso do 99 Táxis, aplicativo criado no Brasil e que conseguiu ir para fora. Fora isso, não há um aplicativo global surgido no Brasil. Isso não é ruim. Em vez de criar inovações disruptivas, os brasileiros geram inovações incrementais, que se encaixam em processos existentes.
    O "Wall Street Journal" diz que o Brasil é a capital de mídias sociais do universo. É natural que as empresas vejam isso como um diferencial, já que o sistema de inovação não é muito amigável. Esse uso intenso, que já está bem documentado, é uma vantagem competitiva e gera espaço para a criação de produtos.

    Que tipo de empresas digitais seus alunos buscam criar?
    Converso muito com alunos que buscam fazer algo na área de marketing. Há uns dois anos, as ideias sempre são de aplicativos para mobile, com o uso das redes sociais. Há outras ideias de aplicativos de serviços e algo para finanças. Alguns alunos já têm projetos andando, com dois ou três clientes, mas nenhum decolou até agora.

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