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    Limite para punição com multas para cartel divide Cade

    JÚLIO WIZIACK
    MARIANA CARNEIRO
    DE BRASÍLIA

    16/07/2017 02h00

    Alan Marques/Folhapress
    Sessão no plenário do Senado para eleger o colegiado responsável por analisar o processo de afastamento da presidente Dilma Rousseff
    Proposta de teto de multa gerou apoio a projeto mais duro para empresas

    No momento em que o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) se prepara para julgar cartéis da Lava Jato, um projeto de lei que prevê teto para as multas deflagrou um contra-ataque de conselheiros do órgão e membros da equipe econômica.

    O Cade negocia hoje cerca de 30 acordos de leniência com empresas que confessaram participação em esquemas de fraudes a licitações.

    O projeto de lei que tramita na Câmara estabelece que as multas para empresas que façam parte de cartéis não ultrapassem 20% do faturamento no ano anterior à abertura do processo pelo Cade.

    A criação de um teto para as punições provocou um racha entre os conselheiros do órgão e levou integrantes da equipe econômica a apoiarem um projeto de lei paralelo no Senado, considerado mais duro para as empresas.

    O debate surgiu de uma brecha na lei atual, que é considerada ambígua e tem levado o tribunal a definir multas com elevada dose de subjetividade, segundo conselheiros. Para eles, nem sempre a empresa acaba pagando uma multa equivalente ao ganho obtido com o cartel, o que estimula novas infrações.

    Um exemplo recente foi o cartel de distribuidoras de GLP (gás liquefeito de petróleo) no Pará, julgado em dezembro de 2016. O ganho das empresas calculado pelo relator no Cade foi de cerca de R$ 48 milhões, e o valor foi sugerido como multa. Porém, o conselho decidiu reduzi-la para cerca de R$ 38 milhões.

    "A ideia [com o projeto da Câmara] é dar mais segurança jurídica para as empresas e acabar com a dúvida de que as multas poderão superar 20% do faturamento", disse o consultor legislativo Cesar Mattos, ex-conselheiro do Cade.

    Mattos colaborou na elaboração do projeto de lei apresentado pelo deputado Carlos Bezerra (PMDB-MT).

    Os conselheiros do Cade Cristiane Alkmin e João Paulo de Resende são contra o projeto e apoiam alternativa em gestação no gabinete do senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), que também tem o apoio do Ministério da Fazenda e servirá de contra-ataque.

    O projeto deve prever multas com base na vantagem auferida pelas empresas durante toda a vigência do cartel -e não apenas no último ano.

    Os dois conselheiros defendem que a legislação atual determina que as multas não podem ser inferiores à vantagem auferida pelo infrator sob o risco de estimularem a prática dos cartéis.

    "Um ladrão que rouba um carro e é pego não pode ser punido simplesmente devolvendo o carro", diz Alkmin.

    Resende defende que o cálculo da vantagem auferida seja feito pelo Cade e sirva de base para a definição de multas, mas acha que é preciso estabelecer um teto.

    Do outro lado, três conselheiros dizem acreditar que a punição de até 20% já é alta o bastante para inibir a reincidência de infratores e que não é atribuição do Cade fazer esse tipo de cálculo.

    "Estatisticamente, está claro que as multas foram suficientes para inibir os cartéis", diz Alexandre Macedo.

    "Nunca tivemos notícia de reincidência, e isso é um bom termômetro", completa.

    Ex-presidente do Cade, Vinicius Carvalho afirma que a aplicação de multas baseada no benefício obtido pela empresa com cartel é a maneira mais adequada de punir, porém observa que há uma limitação até de pessoal para esse trabalho.

    "O debate sobre o cálculo dos danos causados por cartéis e a vantagem auferida é a nova fronteira a ser desbravada pela defesa da concorrência", afirma.

    *

    MAIORES MULTAS DO CADE
    Autuações dos cinco cartéis mais importantes somaram R$ 7 bilhões desde 2004

    Condenados
    CIMENTEIRAS
    Votorantim, Holcim, Intercement, Cimpor, Itabira Agro Industrial e Companhia de Cimento Itambé, seis executivos e três associações

    Valor
    R$ 3,1 bilhões

    Ano de condenação
    2014

    Caso
    Processo teve início em 2006 e se comprovou que as empresas dividiram mercado por região, fixaram e controlaram preços do cimento e do concreto

    Condenados
    GASES INDUSTRIAIS
    White Martins, AGA, Air Liquide Brasil, Air Products Brasil, Indústria Brasileira de Gases, Linde Gases e sete administradores

    Valor
    R$ 2,9 bilhões

    Ano de condenação
    2010

    Caso
    Começou a ser investigado em 2003 a partir de denúncias de que as empresas tentavam obter vantagens de hospitais e impedir a entrada de concorrentes

    Condenados
    CERVEJA
    Ambev

    Valor
    R$ 352,6 milhões

    Ano de condenação
    2004

    Caso
    Programa prejudicou a concorrência ao conceder descontos para estabelecimentos que adquirissem no mínimo 90% das cervejas da marca

    Condenados
    CARGAS AÉREAS
    ABSA Aerolinhas Brasileiras, Varig Logística, American Airlines, Alitalia Linee Aeree Italiane e sete pessoas

    Valor
    R$ 293 milhões

    Ano da condenação
    2013

    Caso
    Ao combinarem preços, empresas de transporte aéreo internacional de carga no país dominaram 60% do mercado entre 2003 e 2005

    Como é calculada a multa hoje?
    A lei estabelece que o valor deve ficar entre 0,1% e 20% do faturamento bruto da empresa no ano anterior à abertura do processo. Jamais pode ser inferior à vantagem auferida, quando ela puder ser calculada

    Como ficará com a mudança?
    As multas nunca serão maiores do que 20% do faturamento no ano anterior à abertura do processo. O histórico dos processos julgados mostrou que esse é o limite da vantagem auferida

    Fontes: Cade e Câmara dos Deputados

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