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    'Vitória histórica' de Temer traz 'novas esperanças' a investidores

    JOE LEAHY
    ANDRES SCHIPANI
    DO "FINANCIAL TIMES"

    03/08/2017 12h05

    A histórica vitória do presidente brasileiro Michel Temer no Congresso, na noite desta quarta-feira (2), contra uma tentativa de julgá-lo por corrupção, reanimará as esperanças dos investidores de que ele leve adiante um programa de reforma econômica que terminou paralisado, dizem analistas.

    Mas o líder de centro-direita que comanda a maior economia da América Latina, e foi gravado supostamente discutindo propinas com um empresário, continua sob sítio, alertaram os analistas, e o Ministério Público continua a considerar outros casos de corrupção contra ele.

    "Essa não foi uma vitória pessoal para qualquer pessoa, mas uma vitória da lei, da força de nossas instituições e de nossa constituição", disse Temer depois da votação.

    Temer se tornou o primeiro presidente brasileiro a enfrentar acusações criminais durante o exercício de seu mandato, depois de ter supostamente conversado sobre propinas com o empresário Joesley Batista, antigo presidente do conselho do grupo de processamento de carne JBS.

    O programa de reformas do presidente, que tem por objetivo conter o deficit orçamentário descontrolado do Brasil, parece estar nos trilhos. Ele inclui um plano nada popular para reformar o generoso sistema de aposentadoria brasileiro, que permite que trabalhadores se aposentem já a partir dos 50 e poucos anos.

    ACUSAÇÕES

    Mas Temer, um ardiloso articulador político que já presidiu três vezes a Câmara dos Deputados, foi apanhado de surpresa pelas acusações de propina surgidas na metade de maio.

    Ele foi indiciado pela procuradoria geral da república, junto ao Supremo Tribunal Federal, por corrupção associada ao caso JBS. A constituição brasileira dispõe que um presidente no exercício de seu cargo só pode ser julgado com a aprovação de dois terços dos 513 integrantes da Câmara dos Deputados.

    A sessão desta quarta foi marcada por disputas ocasionais entre legisladores adversários. A oposição também organizou protestos pedindo a derrubada de Temer. A votação foi concluída com 263 votos contrários e 227 votos favoráveis ao julgamento, e abstenção ou ausência da parte dos demais legisladores.

    O número de votos conquistados pelo presidente ficou perto das projeções mais otimistas dos analistas, o que indica que ele pode sobreviver a dois outros casos relacionados ao JBS que a procuradoria deve apresentar contra Temer nos próximos meses.

    Entre eles deve haver um indiciamento por "obstrução da Justiça", que acusará o presidente de ter conspirado para comprar o silêncio de Eduardo Cunha, antigo presidente da Câmara, que está preso, sobre transações corruptas envolvendo os dois. O outro indiciamento deve acusar Temer de liderar uma organização criminosa. Temer nega qualquer delito.

    Mas enfrentar essas acusações pode queimar seu capital político, já que ele precisa trocar cargos públicos, verbas e apoio a projetos de lei pelo apoio de seus aliados no governo de coalizão. Isso tornaria cada vez mais difícil para o presidente obter os votos necessários às suas reformas, alertaram os analistas.

    "Ele sai fortalecido dessa votação, sem dúvida", disse Ricardo Sennes, diretor da consultoria Prospectiva, em São Paulo. Mas o analista acrescentou que "isso não é garantia de que obterá resultado semelhante em novas votações, entre elas a da reforma das aposentadorias".

    DISCURSOS

    Como no impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, de esquerda, por violação das leis orçamentárias, um ano atrás – decisão que conduziu Temer ao poder –, cada legislador fez um discurso curto ao pronunciar seu voto, na longa sessão da quarta.

    Alguns, como Wladimir Costa, de um dos pequenos partidos da Câmara, se proclamaram aliados incondicionais de Temer. O legislador tirou foto antes da sessão com a palavra "Temer" aparentemente tatuada no ombro, ainda que alguns veículos da mídia brasileira tenham questionado se a tatuagem era real.

    "Temer é um homem ético, transparente, tem histórico e é bem preparado", gritou Costa em seu discurso.

    Outros legisladores, no entanto, usaram a votação para tentar ganhar pontos junto aos seus eleitores para a eleição do ano que vem, e se distanciaram do presidente, que é muito impopular.

    Apenas 5% das pessoas entrevistadas em uma pesquisa recente do CNI-Ibope consideraram o governo de Temer como bom ou ótimo. Outra pesquisa divulgada esta semana pela Agora! IDEIA mostra que 79% dos eleitores querem mudança na política tradicional – o que inclui os partidos e os políticos existentes –, na eleição do ano que vem.

    Diversos legisladores mencionaram a reforma das aposentadorias proposta por Temer como motivo para votar contra o presidente. Um legislador da Paraíba, um Estado pobre no nordeste do Brasil, votou em favor de que Temer fosse julgado criminalmente porque, segundo ele, o presidente não havia cumprido sua promessa de elevar os pagamentos de benefícios sociais às pessoas extremamente pobres de seu Estado.

    "Temer conseguirá fazer as coisas do dia a dia – o arroz com feijão –, e algumas microrreformas", disse André César, analista política da consultoria legislativa Hold, de Brasília. "Mas nada de muito ostensivo – a reforma da aposentadoria e a reforma tributária ficarão na gaveta".

    No entanto, os mercados continuam otimistas quanto à preservação da estabilidade econômica pelo presidente, e quanto a possíveis mudanças modestas no sistema de aposentadoria.

    "O mercado está apostando que a continuidade é garantia de que suas políticas serão mantidas. Vê um desenlace favorável, do ponto de vista econômico", disse Sennes, da Prospectiva.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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