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    Efeito Eletrobras levou governo a tirar 'no susto' privatizações da gaveta, diz ex-chefe do BC

    DANIELLE BRANT
    ENVIADA ESPECIAL A CAMPOS DO JORDÃO*

    25/08/2017 10h57 - Atualizado às 13h13

    Leonardo Benassatto - 16.ago.2017/Reuters
    Brazil's President Michel Temer reacts as he makes a presentation to investors at Santander bank in Sao Paulo, Brazil, August 16, 2017. REUTERS/Leonardo Benassatto ORG XMIT: SAO201
    Presidente Michel Temer

    A reação positiva do mercado à proposta de privatização da Eletrobras levou o governo a anunciar um pacote de concessões, mas boa parte da lista deve ser encarada mais uma declaração de intenção do que como um fato concreto, afirmou nesta sexta (25) o economista Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central.

    Franco participou de painel sobre a economia brasileira no 8º Congresso Internacional de Mercados Financeiro e de Capitais, ao lado de Afonso Bevilaqua e Eduardo Loyo, ex-diretores do BC.

    "O governo levou um susto, no meu modo de ver, com esse anúncio da Eletrobras, com essa repercussão extraordinária", disse. "Com isso, tirou da gaveta um lote grande de outras coisas que me dá, sim, a sensação de que não vai ter tempo de fazer e é mais um anúncio, propriamente mais uma declaração de intenção do que a realidade da coisa em si."

    Na terça-feira (22), um dia após a proposta ser revelada, as ações ordinárias da Eletrobras subiram 49,3%. Os papéis preferenciais avançaram 32%.

    Na quarta (23), o governo incluiu o aeroporto de Congonhas, a Casa da Moeda e uma usina da mineira Cemig na lista de concessões.

    Para Franco, o governo deve aproveitar a oportunidade. "A gente sabe como acontecem essas coisas no setor público. Tem a oportunidade, tem a circunstância e a gente não pode perder. Não podemos perder uma boa crise. Temos que fazer, senão daqui a pouco mudam de ideia", afirmou.

    O economista disse ainda que é preciso agradecer à ex-presidente Dilma Rousseff por a Eletrobras ter chegado ao "terreno das empresas privatizáveis."

    "E foi com alegria que o mercado recebeu essa notícia, com uma pequena dose de vingança até, pela sucessão de erros cometidos por ela [Dilma] que levou a Eletrobras a essa solução inevitável", disse.

    Em 2012, a ex-presidente publicou uma medida provisória que dava às empresas do setor energético a possibilidade de renovar por 30 anos as concessões que venceriam nos anos seguintes, mas com condições piores.

    As concessionárias receberiam remuneração apenas por sua operação e manutenção, o que reduziu receitas e tarifas de energia.

    Ricardo Borges - 20.abr.2016/Folhapress
    Rio de Janeiro, RJ,BRASIL, 20/04/2016; Entrevista com o economista Gustavo Franco. (Foto: Ricardo Borges/Folhapress. ) *** EXCLUSIVO FOLHA***
    Economista Gustavo Franco considera que anúncio do governo é uma declaração de intenção

    DESAFIO FISCAL

    Para os economistas, um adiamento da reforma da Previdência ou a rejeição das medidas seria um "desastre", nas palavras de Eduardo Loyo, atual economista-chefe do BTG Pactual.

    "Muitos de nós estamos de tal forma conscientes do desastre que seria prosseguir com uma trajetória que nós nunca tratamos esses problemas que nos afligem hoje", afirma.

    "Isso leva a uma sensação de que problemas serão endereçados e resolvidos. Mas essa resolução pode vir num formato muito doloroso se não se tem antecipadamente a clarividência de resolver de maneira sistemática e organizada antes que o caldo entorne", complementou.

    Para Afonso Bevilaqua, um eventual atraso na reforma da Previdência é uma "coisa a se lamentar".

    "Essa percepção de que a reforma da Previdência pode sempre ficar para o próximo governo é, sem dúvida, o que nos levou à situação em que estamos hoje", afirmou.

    Segundo ele, se a reforma fosse deixada para 2019, esse atraso de dois anos significaria que governo deixaria de economizar entre 3% e 4% do PIB (Produto Interno Bruto) nos primeiros dez anos de vigência do teto de gastos.

    Na visão de Loyo, uma reforma "desidratada" é melhor do que manter o sistema previdenciário como é hoje.

    "Se a simplificação significa tratar de forma correta um subconjunto dos aspectos que precisam ser endereçados na reforma e esperar para que se complementem os outros aspectos num segundo momento, eu acho melhor do que simplesmente não fazer coisa alguma", afirmou.

    Mas se fosse aprovada uma reforma "malfeita" e insuficiente para resolver o problema, então seria um exercício de "autoengano". "Estaríamos nos comprometendo a refazer a reforma da Previdência muito em breve. É melhor não fazer."

    Para Franco, o governo usou mal seu capital político para passar a reforma.

    "Acho que o governo utilizou mal a energia política que tinha para escolher o que fazer", disse ."Em retrospecto, acho que foi um erro a emenda do teto, acho que deveríamos ter começado pela Previdência num formato menos ambicioso também, para que uma vitória pudesse trazer a outra."

    Franco avalia que nem mesmo a reforma da Previdência em seu desenho integral seria a grande reforma que resolveria os problemas do país. "A reforma da Previdência vai ser algo que vamos revisitar a cada dois ou três anos e fazer um teco-teco novo nesse assunto".

    HISTÓRICO

    Na quarta-feira (23), o conselho do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) aprovou a venda de estatais e de projetos controlados pela União, como a Eletrobras, a Casa da Moeda e o aeroporto de Congonhas.

    A previsão é que o aeroporto mais lucrativo da Infraero deve trazer R$ 5,6 bilhões em outorga —pagamentos que os concessionários devem fazer ao governo para explorar os serviços. Até hoje, as concessões do PPI renderam R$ 6 bilhões em outorgas.

    A intenção do governo é vender os aeroportos da Infraero em três blocos. Cada um deles terá um aeroporto lucrativo. Congonhas será vendido separadamente, e o pagamento será feito de uma vez e à vista.

    Será vendida também a participação de 49% da Infraero em Brasília, Confins, Galeão e Guarulhos, devido às dificuldades da estatal, que não consegue investir nem pagar sua parte nas outorgas. A expectativa é que o pacote aeroportuário movimente R$ 12 bilhões em outorgas.

    No caso da Eletrobras, a ideia é fazer uma emissão de ações da estatal. A União, que hoje tem 41% do capital total, não faria novos investimentos para ter sua participação minimizada. No entanto, ela ficará com uma única ação com poder de veto sobre assuntos estratégicos. Estima-se que esse negócio movimentará R$ 13 bilhões.

    O governo decidiu ainda desestatizar a Casa da Moeda, mas formato do negócio ainda será definido. Pode ser que seja vendida somente 51%. O mais provável é que a União se retire completamente.

    *A jornalista viajou a convite da B3

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